sexta-feira, maio 06, 2011

RUY CASTRO - Cavalo na cozinha


Cavalo na cozinha
RUY CASTRO
FOLHA DE SÃO PAULO - 06/05/11

RIO DE JANEIRO - Foi por essa época do ano, em 1967. Meu primeiro chefe de reportagem, Marinus Castro (sem parentesco), saía do "Correio da Manhã" à noitinha e, no caminho para casa, no Leme, sempre fazia uma escala técnica no botequim. Mas, aquela noite, fugiu à rotina. Subiu direto para seu apartamento -um 7º andar, de fundos-, entrou e foi à cozinha. Lá chegando, encontrou um cavalo.
Mas cavalos não sobem ao 7º andar. Marinus saiu, fechou a porta e foi ao botequim. Retemperou-se com alguns conhaques e voltou ao apartamento. Desta vez, encontrou o cavalo na sala. Aí, não hesitou. Desceu e avisou ao porteiro: havia um cavalo no seu apartamento. O porteiro, que bem o conhecia, não acreditou. Em vez de chamar os bombeiros, subiu com ele para provar-lhe que não havia cavalo nenhum, era só uma alucinação. Quando entraram, o cavalo já estava no quarto.
Marinus era bom sujeito, gordinho, com um bigode estilo valete de espadas. Eu gostava dele, principalmente depois que, entre todos os repórteres do "Correio da Manhã", me mandou ao Galeão para entrevistar a estrela Kim Novak, de visita ao Rio. Tomava as suas, mas, no caso do cavalo, era inocente. O cavalo era cidadão do morro Chapéu Mangueira. Deslizara pela encosta e caíra na área de serviço de Marinus. O prédio chegara muito perto do morro.
Outro dia, uma cobra de três metros irrompeu num apartamento na Lagoa. Há duas semanas, uma vaca adentrou um hotel em Florianópolis (SC). No ano passado, uma onça refugiou-se numa garagem em São Tomás de Aquino (MG). E, ontem, um jovem morreu afogado depois de levar uma descarga de 600 volts de um peixe-elétrico num balneário em Moju, no Pará. Essas coisas vivem acontecendo.
Não são os animais que nos invadem. Nós é que os estamos expulsando de seu mundo.

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