domingo, abril 10, 2011

MAC MARGOLIS - Entre EUA e China, salvam-se os colombianos


Entre EUA e China, salvam-se os colombianos
MAC MARGOLIS

O ESTADO DE SÃO PAULO - 10/04/11

Em sua visita à América Latina no mês passado, Barack Obama conseguiu a proeza de agradar a mouros e cristãos com um banquete recheado de charme e um pouco mais. Sim, frustrou quem imaginava um empenho maior da Casa Branca em desmontar as barreiras americanas ao etanol brasileiro e em defender um assento permanente para o Brasil no Conselho de Segurança da ONU. No entanto, se "80% do sucesso é apenas aparecer", como diz Woody Allen, a breve passagem de Obama por estas latitudes foi um estrondo.
A diplomacia americana, às vezes, escreve certa por linhas tortas. Hoje, quem comemora a "parceria entre iguais" não é o Brasil nem o Chile, mas um país que Obama sequer visitou: a Colômbia. Na quinta-feira, os dois países assinaram um acordo que pode destravar o Tratado de Livre Comércio bilateral. Se tudo der certo, será um marco nas relações Norte-Sul.
O tratado é antigo. Foi aprovado em 2006, mas os democratas implicaram com o pacto por causa de dois argumentos: o primeiro, que a abertura favoreceria indústrias predadoras, fechando postos de trabalho americanos, é fajuto. Cerca de 80% dos produtos colombianos, do café às camélias, já têm tarifas mínimas nos EUA graças ao sistema de preferências comerciais negociado nos anos 90.
Quem ganharia mais com o tratado, pasmem, seriam os exportadores americanos, que por falta de sintonia diplomática sofrem sobretaxas penosas em produtos como computadores, máquinas e serviços. Mas, para os democratas, qualquer arranjo de livre comércio é mais um prego no caixão do doentio sindicalismo "made in USA".
O segundo argumento, que um acordo seria um passe livre para matar líderes sindicais colombianos, é discutível. Há algum tempo, ser líder sindical na Colômbia era correr risco de vida. Como também o era ser camponês, comerciante, professor ou político. No entanto, isso está mudando. Graças à agressiva política de segurança nos último anos, a violência despencou no país, inclusive contra trabalhadores sindicalizados.
Mas por que o interesse repentino de Washington na causa colombiana? A explicação vem da extrema direita e do Extremo Oriente. Com a derrota dos aliados nas eleições parlamentares, Obama perdeu o controle do Congresso para o Partido Republicano, historicamente simpático à abertura comercial. Assim, o fracasso eleitoral virou oportunidade comercial.
Ajudou também o empurrão da China. Enquanto os EUA se distraíam com guerras e a crise econômica em casa, as relações com os vizinhos mais próximos ficaram à deriva. Vantagem para Pequim, que aproveitou a lacuna e mergulhou na região para garantir acesso ao petróleo, aos minérios e à infraestrutura. A América Latina está aprendendo a falar mandarim.
A presença chinesa pode não provocar nenhum tremor geopolítico ou desequilíbrio militar. A Casa Branca, contudo, está desacostumada a ter rivais no seu "quintal". Como diz Eric Farnsworth, ex-conselheiro comercial do governo Bill Clinton, "nada motiva mais Washington do que a concorrência."

É CORRESPONDENTE DA "NEWSWEEK" E COLUNISTA DO "ESTADO"

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