quinta-feira, março 31, 2011

NINA HORTA

Meu caso com os bolos 
NINA HORTA

FOLHA DE SÃO PAULO - 3103/11

O MEU último caso são os bolos de casamento. Quantas vezes já aconselhei a noivas indecisas que se esquecessem do bolo, ninguém comia mesmo... Hoje, teria dificuldade em dizer isso. E como fica o ritual, a tradição, a beleza, o momento?
E o que me motivou mesmo foi um site que minha cunhada mandou, de artistas plásticos boleiros. Daí ao pâtissier prendado foi um pulo.
E tenho três endereços de sites de bolos que por hoje chegam: tinyurl.com/4d5eaex (exige login no Facebook); tinyurl.com/4ltzxd7; tinyurl.com/6bzm9wq.
Comecei com o artista Will Cotton, americano fascinado por bolos como símbolo de beleza ou como comida mesmo. "Comida, comida, pode dar prazer, mas a diferença extraordinária do bolo é que ele só existe por prazer, não há uma só razão nutritiva para precisar comê-lo." Will Cotton faz e fala essas coisas com um sentido de transgressão, de gula. Nem toca no excesso de calorias, o motivo é tentação, mesmo e excesso.
Foi visitar o Ladurée, em Paris, para tentar fazer a pirâmide de macarons que eles exibem nas vitrines com frequência. Ficou como menino em loja de brinquedos. O chef Philippe Andrieu até comentou uns segredos da receita deles que Will Cotton desconhecia. Os macarons do Ladurée são assados em temperatura muito baixa e por mais tempo. E ele aquece o açúcar antes de juntá-lo às claras.
Will Cotton tinha entrado nessa empreitada porque queria construir em doces uma casa na floresta, de massa de bolo. Ele próprio fez 600 macarons que serviram para florir as árvores, ergueu as paredes com waffles. E o ponto mais importante era o centro do bolo, um lago de creme pâtissier bem mole com "îles flottantes" boiando nele (ovos nevados).
Foi em 96 que ele começou sua pintura inspirada em doces, balas, sorvetes e suspiros. Criou um universo de "João e Maria" e de "Alice no País das Maravilhas". As mulheres são sensuais, deitadas languidamente, esparramadas em nuvens de algodão doce. Muita inspiração, muita utopia na terra do leite e do mel.
O danado cobra (e vende) quadros de US$ 50 mil a US$ 250 mil, tudo feito de sorvetes e doces se derretendo, pirulitos se dobrando ao calor, gelatinas escorrendo sobre um branco leitoso de claras batidas em neve. Fotos de mulheres negras cobertas de suspiro com um "background" de bolas de sorvete. Cotton mora num tempo de infância melada, da tentação do consumo de doces, de um desejo do país de Cocanha.
Franco Mandinio Ruiz inventou os Couture Cakes -13 pinturas em tela que contam a história dos noivos. Mas, são telas em formato de bolo pirâmide, começando com as rodelas maiores e acabando com as menores, em camadas. Na verdade, cada fatia horizontal de tela é uma pintura sobre algum acontecimento na vida do casal. Depois do casamento, os noivos dependuram na parede, com certeza.
Adoraria falar de nossas boleiras mais famosas, mas são tantas e tão boas! Algumas estão lançando livros, outras fazendo blogs, outras inventando nos seus laboratórios e dando aula. Mas, não cabem em crônica, só em primeira página. Prometo que um dia vou exaltar todas, artistas escondidas atrás da glace fria e branca.

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