domingo, março 20, 2011

ELIO GASPARI

De eisenhower@edu para obama@gov
ELIO GASPARI
FOLHA DE SÃO PAULO - 20/03/11

Na campanha de 2008 o senhor dizia que "nós podemos", mas eu lhe pergunto: podemos o quê?


SENHOR PRESIDENTE,
Outro dia acompanhei o Juscelino Kubitschek numa caminhada pela avenida Rio Branco. Ela passa ao lado do Teatro Municipal, onde o senhor discursará, depois de desistir de um comício blindado. Há 50 anos eu e JK fizemos esse percurso num carro aberto, sob uma chuva de papéis, confetes e serpentinas. Disseram que a cidade antecipara o Carnaval. Nas calçadas, o povo acenava com bandeirinhas de "We Like Ike". (Esse apelido pegou. Até o Stálin me chama de Ike.)
Dói ver as restrições a que submetem o senhor, Michelle, Malia e Sasha. Nos oito anos que fiquei na Casa Branca, de 1953 a 1961, nunca passei por coisa parecida. Na minha passagem pelo Rio só me assustei quando um sujeito fardado veio na minha direção com uma enorme espada. Era um general, saudando-me. Os estudantes estenderam uma bandeira no seu prédio dizendo que "We Like Fidel". Eu lhes fiz um aceno. Espero que o senhor Castro não apareça por aqui tão cedo porque não o tolero e pretendo evitá-lo. Até com o Mao Tse-tung convivo bem, apesar de sua presença ser desconfortável, pois não toma banho nem escova os dentes. Faço-lhe uma confidência: ele e o general De Gaulle ficaram muito amigos e estão escrevendo um livro a quatro mãos.
Soube que há gente comparando seu novo estilo na Presidência com o meu. Eu cheguei à Casa Branca como general, depois de comandar os exércitos aliados na maior guerra da história. Sim, nós vencemos. O senhor chegou com uma currículo de coronel, dizendo que "sim, nós podemos". Eu acabei com uma guerra que ninguém poderia vencer, na Coreia. O senhor herdou duas, ambas sem vitória possível. Eu teria acabado com elas no primeiro ano de mandato. Podemos o quê? Quero propor-lhe um cenário de crise.
Imagine-se no auge da campanha de 1956, sabendo que a Inglaterra, França e Israel atacaram o Egito para tomar-lhe o controle do canal de Suez. Dois dias antes da eleição, tanques da União Soviética invadem a Hungria, depõem o governo, cujo primeiro-ministro será enforcado, e matam 2.500 pessoas. Eu tivera um infarto, operara o intestino e o secretário de Estado acabou no hospital, com um câncer no estômago.
O que fiz? Nada. Condenei as duas invasões.
Às vezes, fazer nada, ou o mínimo, parece difícil, impossível mesmo. A oposição democrata achava que podíamos entrar em pelo menos uma dessas brigas. Havia até um professor, Henry Kissinger, acreditando que seria possível usar armas atômicas em guerras limitadas. Disso eu entendo, era maluquice. Nós ganharíamos a Terceira Guerra evitando-a. Diante do terror nuclear, no qual se estimava que morreriam 65% dos americanos, eles supunham que poderiam começar um conflito no estilo doce e suave do que houve entre 1939 a 1945. Guerra é o inferno, não é um brinquedo, como os videogames dos meus bisnetos.
Uma coisa é fazer o mínimo quando a valentia pode levar a um desastre, bem outra é não usar a força quando ela é o meio adequado de dissuasão. Um ano depois de não fazer nada na Europa e no Egito, eu mandei a 101ª Divisão de Paraquedistas para Little Rock, onde o governador se recusava a cumprir uma decisão da Corte Suprema que mandava acabar com a segregação racial nas escolas. Tem gente que acha que esse tipo de passo foi dado pelo meu sucessor, John Kennedy. Paciência.
Presidente Obama, acredite: o mais difícil é descobrir quando nós não podemos. Só não digo que esse foi o erro de seu antecessor porque o 11º mandamento determina que um republicano não fala mal de outro.
Finalmente, um pedido. Kubitschek contou-me que um brasileiro interessado em obter um visto para visitar os Estados Unidos precisa esperar 105 dias para a entrevista no nosso consulado do Rio. Em Brasília são 134 dias e em São Paulo, 107. Acabe com essa incompetência estrutural. Não devemos esconder inépcia atrás da máscara da arrogância. Isso, nós podemos.
Mamie recomenda-se a Michelle e despeço-me, como seu obediente soldado.


FOGO PAULISTA

O ministro da Educação, Fernando Haddad, está debaixo de chumbo. Os tiros vêm da Casa Civil.


TOCA MAIS, ARRUDA

Estava escrito nas estrelas que um dia José Roberto Arruda, ex-governador de Brasília e grão mensaleiro do DEM, daria nomes e números aos bois. Ele fez isso dentro da lógica petista segundo a qual coletar e embolsar dinheiro a pretexto de campanhas eleitorais não é crime. Apresentou-se como um irradiador de recursos para o DEM, o PSDB e até o PT.
Segundo ele, "dancei a música que tocava no baile", pois "fazia tudo de coração, com a melhor das intenções".
Se a Polícia Federal e o Ministério Público puxarem todos os fios da meada, Arruda poderá vir a prestar o maior serviço de sua carreira política. É só falar mais.
QUEM É KASSAB?
Gilberto Kassab começou a sua carreira política no malufismo e chegou ao secretariado do inesquecível prefeito Celso Pitta. Passou pelo PL, mudou-se para o PFL e, graças a uma aliança com o PSDB, aninhou-se na Prefeitura de São Paulo.
Com a decadência do seu partido, negociou uma aproximação com o PT, ameaçou filiar-se ao PMDB e flertou com o PSB. Agora, informa que poderá criar um novo partido, o PSD.
Ganha uma viagem de ida a Trípoli quem for capaz de repetir uma ideia política defendida por Kassab. Ganha uma viagem de volta quem for capaz de dizer o que significará esse partido.
Numa época em que a caciquia política nacional defende uma reforma política para fortalecer os partidos, Kassab simboliza a sinceridade dessas opiniões.


VIVA O AMARELINHO

Para a coleção de frases do ano, de Eduardo Paes ao repórter Ancelmo Goes, depois de saber que o companheiro Obama cancelara o showmício da Cinelândia:
"Pelo menos não entro para a história como o prefeito que fechou o Amarelinho."
E o Amarelinho entra para a história como o bar que nem o presidente dos Estados Unidos conseguiu fechar.


EREMILDO, O IDIOTA

Eremildo é um idiota e resolveu fazer um servicinho extra para que o presidente da Claro, doutor Carlos Zenteno, possa avaliar o desempenho de sua empresa.
Ele tomou um caso de cobrança indevida da operadora contra uma vítima que acabara de contratar o plano mais barato disponível, de R$ 92,90, e ao fim do mês recebeu uma conta de R$ 322,86. Coisas da vida, erros acontecem.
O idiota resolveu anotar tudo o que lhe aconteceu a partir daí. Teve que tratar pessoalmente do caso em duas ocasiões, dar 14 telefonemas e mandar cinco e-mails. Em troca, recebeu uma nova cobrança, de mais R$ 776,28. O aparelho (que o imbecil não sabe usar) foi bloqueado.
Eremildo consumiu sete horas de trabalho ao longo de 29 dias para se livrar da faca da Claro. Cretino profissional, ele vive com salário de R$ 5.000. Isso resulta em R$ 31,25 a hora. Portanto, perdeu R$ 218. Como devia apenas R$ 166,33, ao longo de um mês gastou mais em tempo trabalhando para escapar da Claro do que usando os seus serviços.
Apesar de tudo, Eremildo está feliz. Para ele é um prazer registrar que a empresa do homem mais rico do mundo esteve a fim de meter a mão no seu bolso.

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