quarta-feira, março 17, 2010

ALEXANDRE SCHWARTSMAN


Os brutos também mostram
Folha de S. Paulo - 17/03/2010

Se quisermos continuar a expansão fiscal, seria adequado que nossas estatísticas mostrassem isso

DESDE QUE passou a compilar sistematicamente suas estatísticas fiscais, o Brasil adotou o conceito de dívida líquida do setor público (DLSP), deduzindo certos ativos da dívida bruta. Havia e ainda há (até certo ponto) motivos para esse tipo de procedimento, mas desenvolvimentos recentes geram dúvidas acerca da relevância da DLSP como medida de endividamento do governo.
Note-se que o próprio conceito da DLSP é intimamente ligado ao desempenho fiscal. Caso o governo incorra em deficit, terá que se endividar; no caso contrário diminui seu endividamento, isto é, o deficit fiscal nada mais é do que a variação do endividamento entre dois momentos. Assim, se no começo do ano a dívida for R$ 100 e, no final do período, atingir R$ 120, o deficit público naquele ano terá sido de R$ 20 (é algo mais complicado que isso, mas podemos ignorar os detalhes).
É possível, então, medir a pressão do governo sobre a demanda por meio da variação da sua dívida, mas essa definição implica questões importantes. Imagine, por exemplo, que o governo decida adquirir reservas sem aumentar impostos ou cortar gastos, ou seja, mantendo a política fiscal inalterada. A contrapartida da compra (esterilizada) de moeda forte é um aumento da dívida interna, mas, pelo menos numa primeira aproximação, não deveria haver nenhum impacto significativo dessa política sobre a demanda.
Se isso for verdade, não deveríamos tomar o aumento da dívida resultante da compra de divisas como expansão fiscal. Isso parece incoerente com a discussão acima, mas pode ser facilmente reconciliado se definirmos a dívida deduzida das reservas como a medida relevante de política fiscal. Nesse caso, o aumento da dívida interna é compensado pela elevação das reservas, mantendo a dívida líquida constante (no momento da aquisição das reservas), refletindo a estabilidade da política fiscal e, portanto, da demanda.
Ocorre que, no caso do Brasil, outros ativos, além de reservas internacionais, podem ser abatidos da dívida bruta para cálculo da dívida líquida, em particular os créditos concedidos pelo Tesouro Nacional ao BNDES e o recursos do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), a principal fonte de dinheiro para aquela instituição. A bem da verdade, diga-se, esses montantes mantiveram-se relativamente estáveis por um longo período até o final de 2008, quando, em nome da política anticíclica, os créditos do governo ao BNDES (e demais instituições financeiras oficiais) aumentaram o equivalente a 5,5% do PIB, implicando descolamento mais expressivo entre dívida bruta e líquida.
Embora essa política tenha um efeito expansivo considerável sobre a demanda, assemelhando-se em muito à política fiscal, as estatísticas não a capturam. A DLSP considera, por um lado, a expansão do endividamento do Tesouro Nacional, e, pelo outro, um aumento dos ativos governamentais, sem efeito (imediato) sobre o seu saldo.
Essa peculiaridade das contas fiscais brasileiras permite, assim, que a expansão (quase) fiscal não seja registrada, limitando severamente a relevância do conceito de dívida líquida. Ainda acredito que reservas internacionais (ativos de elevada liquidez) possam ser deduzidas da dívida bruta, o que nos deixaria com uma dívida líquida corrigida da ordem de 50% do PIB. As demais deduções, porém, não parecem mais fazer sentido econômico. Se quisermos continuar a expansão fiscal, seria adequado que nossas estatísticas mostrassem isso. Não muda nossa perspectiva de solvência, mas reflete de forma mais acurada as pressões sobre a demanda.
ALEXANDRE SCHWARTSMAN , 47, é economista-chefe do Grupo Santander Brasil, doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley) e ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central.

ROBERTO DaMATTA


Cinismo & indignação
O Globo - 17/03/2010

Uma grande antropóloga inglesa, Mary Douglas, escreveu um livro capital, intitulado "Pureza e perigo". A tese é que, quanto mais puro e inocente, mais sujeito a despudores, pecado e sujeira. Há, como sugere Mary Douglas, uma complementaridade entre essas oposições de tal sorte que, quanto mais se salienta um lado, mais o seu contrário adquire força como pano de fundo ameaçador e potencialmente intrusivo. O povo escolhido é, como o cordeiro de Deus, o mais perseguido. O mais pobre é, como diz a demagogia nacional, o mais honesto: a única categoria que precisa de governo! Claro que temos que descontar os saques realizados pelos "pobres" na ocasião dos terremotos do Haiti e do Chile. Não foi a desigualdade que os promoveu, mas a legitimidade que acoberta o abandono da lei em contextos onde vigora o "salvese quem puder". Como não há mesmo igualdade, exceto perante a lei, e mesmo assim como forma ideal, todo sistema está sujeito a saque. Quem não se lembra dos "verões quentes" ocorridos em 1964, 65, 66, 67 e 68 em, respectivamente, Nova York, Los Angeles, Cleveland, Newark e Detroit? Do mesmo modo e pela mesma lógica relacional ou hierárquica, o mais brilhante e generoso é o que mais provoca inveja. O defeito de ter sucesso no Brasil, denunciado por Tom Jobim, é fácil de ser sociologicamente resolvido.

Numa sociedade onde tudo tem dono e basta ser filho desta ou daquela família para ter sucesso, os bens já estão divididos.

O sucesso que machuca é o êxito inesperado, como o dos jogadores de futebol e o de alguns artistas e intelectuais enviesados que não fazem parte de certas turmas, partidos e patotas.

Se você acha que estou exagerando, leia a história do bíblico José, traído pelos irmãos e vendido a um mercador. Não foi por acaso que ele se transformou num grande decifrador de sonhos, pois quem tem seus sonhos esmagados pelo ressentimento e pela arrogância dos que estão na sala do lado torna-se um especialista em ilusões.

No Brasil, há um elo nítido entre cinismo e canalhice. O larápio dos bens públicos, o bandido que usa o cargo oficial em benefício próprio e o ocupa para realizar falcatruas; o salteador inominável que, em nome do povo e da igualdade, guarda dinheiro na cueca e na meia, arma esquemas para comprar adversários, diz que não sabia e se escuda no processo eleitoral, difamando-o de modo vil, sente-se ultrajado quando o pegam com a mão na massa. Mesmo quando um filme estampa sua atuação como chefe de uma quadrilha de altos funcionários que, na realidade, são meros larápios dos bens públicos.

Não é difícil responder por que o Brasil tem sido vítima desta praga. É que o país tem sido uma grande feitoria. O governo geral e a vinda dos Bragança para esse lado do mundo foram uma conveniência.

Os portugueses jamais governaram, como revela, entre outros, o maldito Eça de Queiroz, igualitariamente.

Para o estilo aristocrático e despótico de governo, o governante (e as autoridades em geral) não são sujeitos da lei. Quem faz e vigia o cumprimento das normas não precisa segui-las, diz um axioma do nosso sistema de poder.

Daí o elo espúrio. Ser puro é perigoso e a canalhice não produz vergonha, mas indignação! No Brasil, os roubos mais ofensivos são percebidos pelos seus praticantes como ofensas e calúnias porque é uma obrigação não escrita roubar o erário e usá-lo a seu bel-prazer. Trata-se de um prêmio pela vitória eleitoral que trouxe ao eleito o Estado como um presente. O ladrão de galinha chora e pede desculpas, mas o ladrão dos recursos que foi encarregado de gerenciar; esse canalha sente-se ofendido e, imitando as grandes figuras políticas do nosso tempo e o próprio Jesus Cristo, diz que perdoa as nossas suspeitas porque nós, os seus financiadores, não sabemos o que estamos fazendo! Chegam a rezar agradecendo a Deus pela propina.

A indignação dos ladrões públicos decorre da surpresa de descobrir-se como sujeito da lei e da impessoalidade.

O famoso "eu não sabia" é revelador da estupefação dos poderosos quando os jornais denunciam que numa democracia a impessoalidade é uma decorrência da igualdade de todos perante as regras que não excluem - como ocorre em Cuba e no Irã - ninguém. Dessa impessoalidade como princípio, decorre a própria dinâmica dos regimes democráticos, como mostrou, faz tempo, Tocqueville.

A indignação dos canalhas e dos que usam e abusam do poder é a contrapartida dialética deste Brasil atual, onde vale tudo e a velha malandragem ultrapassa todos os limites.

Ser puro é perigoso. E ser corrupto e bandido? É ser inocente? Será possível que só existam inocentes no cenário das falcatruas nacionais? Fico entre o comovido e o derrotado com essa reação indignada dos canalhas que, em seguida, adoecem.

Que sociedade curiosa. Eis um sistema no qual o honesto é o merda e o ladrão em nome do povo sente-se - por mais que roube - injuriado e ofendido! Será porque ele tira o de todos que, até hoje, não é de ninguém? Será porque ele tem a licença eleitoral de ser o dono desta coisa chamada Brasil que permanece sendo uma grande feitoria? Temo que sim!

ONDE ESTÃO OS FILHOS DAS PUTAS?

FLÁVIA OLIVEIRA - NEGÓCIOS e Cia


Benefício verde voltará

O GLOBO - 17/03/10
O IPI reduzido dos automóveis chega ao fim este mês, mas pode voltarnum futuro não muito distante, numa alíquota que vai diferenciarveículos a gasolina dos modelos flex fuel, movidos também a etanol. Porora, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, evita falar no benefício. Éque o governo quer pôr fim ao arcabouço de medidas de estímulo àeconomia durante a crise, para não ajudar a alimentar preocupações coma inflação.

Mas já sinalizou ao colega do Meio Ambiente, CarlosMinc, que está disposto a estabelecer a alíquotas menores para oscarros bicombustíveis, em ação voltada à sustentabilidade. Conversamossobre o Plano de Mudanças Climáticas, que prevê a desoneração deprodutos que reduzam a emissão de CO2. Guido prometeu restabelecer, embreve, alíquota diferente de IPI para automóveis flex, diz Minc.

Ofim do benefício do IPI deve fazer a indústria automobilística baternovo recorde mensal em março. Até anteontem, 138.968 carros foramemplacados no país. A média por dia útil está em 12.633. Significa que,se o número se repetir, o total de licenciamentos pode passar de 290mil veículos. Como sabemos que a 2aquinzena é mais movimentada, émuito provável que o recorde de setembro último (308.718) seja batido.O próprio fim do IPI estimula esse movimento, diz uma fonte do setor.
Alto padrão em Sauípe

A Odebrecht Realizações Imobiliárias (OR) lança o Quintas PrivateResidences, na Costa dos Coqueiros (BA). Com valor de vendas de R$ 100milhões, prevê 50 casas de alto padrão: 300 m², quatro suítes, deck,piscina, espaço gourmet e serviços de resort. Dez já estão prontas.

Odiretor comercial da OR, Franklin Mira, conta que a empresa adotarápela primeira vez o modelo de propriedade fracionada. Cada unidadepoderá ter até oito proprietários, que terão cotas e utilizarão a casaem sistema de rodízio.

Segundo Mira, isso facilitará acomercialização das casas de veraneio. Os proprietários serão filiadosao The Registry Collection, clube de luxo internacional.

Oprojeto é o 3º da OR no litoral norte baiano, onde já tem o Quintas eo Casas de Sauípe. Turísticos, eles fogem do foco da empresa, que sãoprojetos residenciais e comerciais. A OR ainda tem 1.300 hectares naregião, cujo destino definirá na revisão do plano estratégico em 2010.Mira não revela números, mas afirma que o valor de vendas do Nordesteem 2010 se equipara ao de São Paulo, maior mercado.
Projeto GLP

TERMINA em agosto a 1ª fase da obra do Terminal Aquaviário da IlhaComprida (Taic) e sua interligação com o da Ilha Redonda, na Baía deGuanabara (à direita, o complexo). Nesta 6ª, começa a instalação de 90roletes bidirecionais entregues pela Liderroll à Petrobras. Elessuportarão cinco linhas de dutos construídas sobre a ponte que ligaráos terminais (à esquerda). O Taic armazenará e escoará, por navios, oGLP produzido no Terminal de Cabiúnas e na Reduc.

A obra, de R$ 1 bi, termina em janeiro de 2012.
Sem competição 
O leilão de Belo Monte, tudoindica, terá na disputa apenas consórcios privados, sem estatais.Comenta-se que, salvo decisão política contrária, a Eletrobrás vai seassociar diretamente ao grupo vencedor. Quer evitar duelo entrecontroladas. Eletronorte é a provável parceira.
Mais barato
A Usiminas fechou com a NipponSteel Shipping. A brasileira trará da Austrália um navio capesize, degrande porte, com 160 mil toneladas de carvão, matéria prima usada nafabricação do aço. A economia com fretes e taxas será de US$ 1,5 milhão.
Outros seis acordos virão.
Crescendo 
A carioca First Class, de cama, mesae banho, abrirá oito novas lojas até o fim de abril. Este mês, virãoduas no Nordeste (Recife e Maceió), somando R$ 800 milhões eminvestimentos. A meta é sair de 47 para 60 filiais no país em 2010. Efaturar 30% mais.
MOÇA NA CAIXINHA
A VERSÃO em caixinha do LeiteMoça vai estrear nas prateleiras de Nordeste e Norte. A Nestlé apostana forte demanda pelo tipo de embalagem em condensados nas duasregiões. No Sul, o produto bateu em 30% as previsões de vendas daempresa.
Tiro no pé 
A inclusão dos softwares na lista desanções do Brasil aos EUA pode atingir empresas nacionais querepresentam americanas do setor no país.
A área soma de 25% a 30%de nosso faturamento, diz Marcelo Astrachan, da Cyberlynxx, de TI.Quanto maior a elevação tarifária, maiores os prejuízos.
Mudou de tom 
Teve gente no mercado que viumudança de postura da CVM na multa de R$ 500 mil imposta a FlávioFontana Mincaroni, por insider information em oferta da Sadia pelaPerdigão. O órgão regulador fora criticado pelas punições modestas.
Promoção 
O marketing promocional se recupera dacrise. Em 2009, movimentou R$ 29,2 bi no país, 8% acima de 2008, diz aAmpro, que representa o segmento. A previsão para 2010 é de alta de 10%.
Amanhã, o Brazil Promotion Road Show reunirá 800 profissionais no Rio.
Direito na Copa 
A FGV está lançando curso deDireito Administrativo Desportivo, de olho em contratos e projetos daCopa 2014 e dos Jogos 2016. O foco são regras de direito público erelações com esfera privada, diz Marcos Villela, coordenador do curso.
Justiça agrária 
O IAB-RJ enviou ao MEC e ao Ministério da Cultura proposta para fazer do Direito Agrário cadeira obrigatória nas universidades.
Ovos e presentes 
O varejo carioca prevê alta devendas de 9% na Páscoa, revela consulta do CDL-Rio a 500 lojistas. Alémdos ovos de chocolate, espera-se aumento na demanda por bichos depelúcia, roupas e acessórios relacionados à data. A Páscoa está setornando o segundo Dia dos Namorados, diz Aldo Gonçalves, do CDL-Rio.É crescente a diversificação dos presentes.
Coleta seletiva 
A Dell será parceira do CDI na Semana de Inclusão Digital, de 22 a 28 de março.
A empresa vai coletar computadores para reciclagem. É ação para reduzir o lixo eletrônico.
De novo 
Carlos Alberto Vieira, do Safra, foi reeleito presidente da Associação e do Sindicato dos Bancos do Rio.
Gota dágua 
CHICO GOTA será personagem-símbolodo programa de educação ambiental, que a Cedae lança 2ª que vem, DiaMundial da Água. O guri é velho conhecido dos fluminenses. Estreou comoícone da campanha A refinaria é nossa, pelas mãos de Wagner Victer,então secretário de Energia, hoje presidente da Cedae. O movimentopró-Comperj foi bem sucedido.
Chico bem que podia dar uma passada na passeata pró-royalties hoje...
LIVRE MERCADO

O LANÇAMENTO da campanha Contra a covardia Em defesa do Rio, dogoverno fluminense, teve audiência fora do país. Transmitida pelainternet, a entrevista coletiva teve 4% dos acessos vindos de EUA,Inglaterra, Espanha e Itália.

A AGÊNCIA Agnelo Pacheco, depublicidade, fechou 2009 com crescimento de 78%. Faturou R$ 240 milhõescom novas contas, como Duloren e Cuecas Duomo.

FERNANDO LUZIO,responsável pela reestruturação da Casa&Video, lança livro hoje emSP. Fazendo a estratégia acontecer é um guia de diagnósticos e açõesempresariais.

A THYSSENKRUPP dará bolsas aos quatro primeiros colocados nos vestibulares de Engenharia de Materiais e Metalúrgica da UFRJ.

A EQUIPE da coluna está com o Rio, em defesa dos royalties!

FERNANDO RODRIGUES


Regras inúteis


Folha de S. Paulo - 17/03/2010
 

BRASÍLIA - O governo soltou ontem uma versão atualizada de sua cartilha de conduta para funcionários públicos durante anos eleitorais. Na interpretação da Advocacia-Geral da União, a pré-candidata do PT, Dilma Rousseff, poderá comparecer a qualquer evento do governo depois de 3 de abril, pois não ocupará mais um cargo na administração pública.
Essa situação vigorará até o final de junho, quando Dilma for nomeada oficialmente candidata. Depois está proibida de comparecer a cerimônias oficiais. A regra vale para todos os políticos em condição correlata. José Serra também poderá participar de atos do governo de São Paulo quando não estiver mais à frente do Estado. Esse período de limbo legal de três meses é a nova anomalia criada pelo Congresso, na reforma eleitoral aprovada do ano passado.
Antes não era assim. Jackson Lago (PDT) perdeu a cadeira de governador do Maranhão porque durante a fase de pré-campanha apareceu em eventos públicos junto com o seu antecessor.
A mudança rotineira de regras é um câncer do sistema político brasileiro. Cada nova alteração só beneficia quem já está no poder. Vigora uma completa assimetria também quando se interpreta o que faz um candidato a presidente na comparação com um pobre diabo de um Estado mais longínquo.
Esse tipo de discussão é brasileira como a jabuticaba. Em alguns países desenvolvidos, como os EUA, trata-se de um não assunto. No Brasil, há uma obsessão com a presença do Estado. O governo é o nhonhô que dá votos. Os políticos vão alterando a lei a cada eleição para tentar tirar o melhor proveito. Leis são inúteis nessa área. O combustível dos desvios é a cultura política baseada na estadolatria.
Não há caso de brasileiro deixando de votar num candidato porque houve suspeita de uso da máquina pública. Se o eleitor não reprova os abusos, quem então o fará?

FERNANDO DE BARROS E SILVA


PT saudações


Folha de S. Paulo - 17/03/2010
 

  
SÃO PAULO - Nos dias que correm, não é comum ver um petista contrariado. Estão em geral muito satisfeitos. Exibem um pragmatismo confiante e despido de autocríticas, um ar triunfalista como nunca antes neste país. Costumam tratar adversários como inimigos do Brasil. São os efeitos da popularidade de Lula, agravados, no caso, pela velha convicção da esquerda de que tem a chave da história.
Chama ainda mais atenção, por isso, o tom de desconforto e desabafo da entrevista que o deputado José Eduardo Cardozo concedeu ontem ao jornal "Valor Econômico".
Ele diz que não vai concorrer à reeleição na Câmara porque "perdeu a paciência": "As coisas não só não se alteram como se agravam. (...) O que determina a vitória? Em larga medida é o dinheiro. Na disputa passada, minha campanha custou R$ 1,5 milhão. É um absurdo. Não tive problema com a Justiça, mas acho que foi até por acaso".
Mais adiante, Zé Eduardo diz que filhos de parlamentares costumam esconder tal fato de colegas para não ouvir na escola: "Seu pai é ladrão". E acrescenta: "Você vai a um jogo de futebol e pessoas ficam gritando mensalão, mensalão!".
A conclusão a que ele chega: "Sairão aqueles que querem ter ética na política e não sabem mais como operar". Operar?
Zé Eduardo também parece não saber como "operar" seus paradoxos. Resvala para uma franqueza incomum quando diz que "as relações com os doadores são muito problemáticas". Mas recua quando sugere que os políticos são reféns e vítimas de um sistema perverso, ao mesmo tempo em que se esmera na defesa dos companheiros João Vaccari e José Dirceu.
Zé Eduardo é um feixe de contradições. Abandona a disputa eleitoral contaminada, mas permanece à frente do segundo cargo na hierarquia do PT. Repele as atuais regras do jogo, mas dobra a aposta no partido. O mesmo partido que "democratizou" o vale-tudo no poder.

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

Vendas de imóveis em SP têm o melhor janeiro


FOLHA DE SÃO PAULO - 17/03/10

Mesmo em janeiro, mês tradicionalmente de menor movimento no mercado de imóveis novos na cidade de São Paulo, as vendas registraram níveis recordes para o período, de acordo com pesquisa do Secovi-SP (sindicato da habitação).
O volume de unidades comercializadas alcançou 1.508 no mês, resultado 35,5% superior ao apurado em janeiro de 2009, período de crise.
Foi também 7,9% maior do que em igual período de 2008, época de grande demanda.
"Já vínhamos em uma tendência de aquecimento. Entre novembro e dezembro de 2009, a venda de imóveis novos na cidade foi equivalente aos primeiros cinco meses do ano. Já esperávamos que 2010 começasse forte e isso reafirma a tendência", afirma Celso Petrucci, economista-chefe do Secovi-SP.
As vendas foram concentradas nas unidades de dois dormitórios e nas mais baratas.
O indicador VSO (Vendas sobre Oferta) -que relaciona o número de unidades vendidas e o total ofertado- alcançou em janeiro 11,3%, taxa que jamais havia sido atingida na história da pesquisa para o primeiro mês do ano.
O VSO de janeiro de 2007 e de 2008 foi de cerca de 7,5%. O de janeiro do ano passado havia ficado em 5,5%.
Em receita, as vendas estão em torno de R$ 600 milhões e a expectativa é que o mercado de imóveis novos movimente de R$ 12 bilhões a R$ 13 bilhões neste ano, segundo Petrucci.
Lei Kandir onera o agronegócio, diz Lovatelli 

"A Lei Kandir já teve o seu mérito. É preciso mexer nela." Essa é a afirmação de Carlo Lovatelli, presidente da Abag (Associação Brasileira de Agribusiness).
A lei, de 1996, hoje onera os produtos agrícolas de maior valor agregado, diz Lovatelli. "O país perde receita por exportar mais grão que óleo e farelo." A lei foi criada para estimular as exportações, isentando os produtos primários de ICMS.
Lovatelli acrescenta que a lei acaba, indiretamente, estimulando investimentos industriais em outros países, como China, e exportando emprego, por não ter construção de fábricas no país.
Um dos efeitos nocivos da guerra fiscal é a influência que exerce sobre decisões de investimento, diz. "O empresário faz uma fábrica em um Estado por causa do benefício fiscal, em detrimento de uma melhor logística."
A deficiência nessa área é outro entrave para o agronegócio. Segundo Lovatelli, o governo Lula poderia ter realizado mais investimentos em infraestrutura e logística.
"Foi uma oportunidade perdida. Se não investir, vai parar lá na frente", afirma.
A cada ano, o país bate recorde de produção de soja e, segundo ele, vai ter, mais uma vez, fila de caminhão para descarregar nos portos.
UNIFORME EM CAMPO

O uniforme que a seleção brasileira vai usar no mundial da África do Sul, apresentado recentemente pela Nike, contou com a colaboração criativa de um grupo de jovens aspirantes a jogador de futebol, em um processo de cocriação coordenado pela consultoria Mandalah.
Butique de inovação com escritórios em São Paulo e no México, a Mandalah é especializada em "open innovation", um processo de criação que conta com a colaboração aberta de segmentos da sociedade. A Mandalah foi a moderadora do grupo que analisou durante vários meses o visual de todos os uniformes da seleção usados em torneios mundiais passados.
"O modelo de camiseta que a Nike fez ficou muito parecido com as sugestões apresentadas pelos jovens influenciadores", diz Lourenço Bustani, um dos sócios da consultoria.
INTENÇÃO

O índice de intenção de consumo das famílias paulistas, calculado pela Fecomercio SP, mantém-se estável em março. Quatro dos sete itens do índice apresentaram variações positivas. A renda atual saltou de 154,1 pontos, em fevereiro, para 159,6, em março. A perspectiva de consumo teve 141,8 pontos ante 136,9. O nível de consumo atual e o emprego atual também subiram.
BOLEIA

Christopher Podgorski, diretor-geral da Scania Brasil, defendeu nesta semana a importância de o BNDES manter nos moldes atuais os programas de financiamento de caminhões Pró-Caminhoneiro e Finame PSI. Juntos, os programas responderam por um terço das vendas da empresa, de agosto a dezembro. O governo havia sinalizado possibilidade de não renovar as linhas.
PALESTINA 1

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva encerrou ontem, em Belém, o seminário "Brasil-Palestina investindo no futuro", em que 120 empresários, a grande maioria palestinos, discutiram parcerias em torno dos 201 projetos contidos no chamado "Programa Fayad", uma espécie de PAC palestino, elaborado pelo primeiro-ministro Salam Fayad.
PALESTINA 2

Serão US$ 5,5 bilhões de investimentos necessários no PAC árabe. O presidente Lula aproveitou a ocasião para anunciar que em julho, em São Paulo, será realizado o primeiro Seminário da Diáspora Palestina, também em busca de recursos.
GÁS

Com a chegada do gás natural à usina de Timóteo (MG), via gasoduto da Cemig, no Vale do Aço, a ArcelorMittal Inox planeja a implementação, a médio prazo, de sistema de geração de vapor e eletricidade por meio de uma termelétrica. O objetivo é gerar até 10 MW para ampliar o fornecimento de energia à usina.
AJUDA DE BACO

Vinhos chilenos não ficaram mais caros depois do terremoto, ao menos em três grandes importadoras. A preocupação, porém, é com a nova safra, que está sendo colhida. "Com algumas instalações e estradas afetadas, resta saber se conseguirão colher e processar tudo", afirma Ciro Lilla, da Mistral.
MAIS TRABALHO

O setor de eletroeletrônicos, que perdeu cerca de 10 mil empregos no período mais agudo da turbulência econômica, deve recuperar o patamar pré-crise antes do final do ano. A previsão é do presidente da Abinee (associação do setor), Humberto Barbato, que esperava voltar ao nível anterior a outubro de 2008, de 165,25 mil empregos diretos, apenas no final deste ano. Mas o resultado de janeiro surpreendeu as indústrias de eletroeletrônicos, que abriram 2.930 vagas no mês, elevando para 162.750 o número de trabalhadores. "A recuperação da crise praticamente já ocorreu", afirma Barbato. E ainda tem a Copa, para dar um empurrão no consumo de produtos do setor.

com JOANA CUNHA, ALESSANDRA KIANEK e MARIANA BARBOSA

PAINEL DA FOLHA

Repescagem do mensalão


RENATA LO PRETE
FOLHA DE SÃO PAULO - 17/03/10


Depois de apresentar a denúncia contra os 40 do escândalo do mensalão, a Procuradoria-Geral da República indicou dois peritos para fazer uma triagem e obter cópia de documentos da CPI dos Correios que, segundo parlamentares que atuaram na comissão, não chegaram a ser analisados pelo Congresso.
São dados que apareceram quando o relatório da CPI já havia sido concluído. O pacote inclui CDs com movimentações financeiras de fundos de pensão e corretoras, agora levados ao noticiário na esteira do caso Bancoop. A entrada e saída de papéis foi registrada em ofícios da Secretaria Geral da Mesa do Senado no período de maio de 2007 a março do ano passado.

Esticando a corda. Em conversa no final de semana, Ciro Gomes deixou as lideranças do PSB de cabelo em pé ao sugerir que o partido adie para junho, quando ocorrem as convenções, a definição sobre sua permanência ou retirada da disputa presidencial. Ninguém que não o próprio deputado tem interesse em levar a novela tão longe.
Que tal? Com a candidatura ao governo paulista pronta para sair do forno, Aloizio Mercadante (PT) sugeriu ao PDT o nome do prefeito de Campinas, Dr. Hélio, para vice. Mas o partido indicou Reginaldo Nogueira, que administra Indaiatuba. Na próxima segunda, os petistas tratarão do tema também com PC do B, PR e PRB.
Road show. Às vésperas da saída de Dilma Rousseff do governo, ninguém segura Lula em Brasília: o presidente se ausentará da capital por quatro dias na próxima semana. Estão previstas visitas a SP, Rio, Bahia e Tocantins.
Apertando. Ibope a ser divulgado hoje traz José Serra (PSDB) cinco pontos à frente de Dilma (PT) não apenas no primeiro turno mas também na simulação de segundo.
Teste. Recente pesquisa feita pelo instituto Ipsos para a Natura indagou aos entrevistados, entre outros itens relativos à imagem da empresa, qual seria o efeito da ida de Guilherme Leal, co-presidente do Conselho de Administração, para o lugar de vice na chapa de Marina Silva (PV).
Cofre 1. Feito a pedido de Lula, o pente fino da Controladoria Geral da União nas contas do Distrito Federal detectou que, ao final de 2009, chegavam a R$ 390 milhões os recursos repassados pelo governo federal à Secretaria de Saúde e que permaneciam aplicados em CDBs.
Cofre 2. O volume, equivalente a 50% do total direcionado à pasta no ano passado, já havia chamado a atenção do Ministério da Saúde.
Dividido. Enquanto o presidente do PTB, Roberto Jefferson, deixa clara a intenção de se aliar a José Serra, o líder do partido no Senado, Gim Argello (DF) organizou ontem um jantar de parlamentares petebistas com Dilma.
Caneta. A senadora Kátia Abreu (DEM-TO) será a relatora do projeto que trata da partilha dos royalties do pré-sal na CCJ do Senado.
De mal. O clima pesou entre os líderes do PMDB, Renan Calheiros, e do governo no Senado, Romero Jucá. O alagoano culpa Jucá por não ter sido chamado à reunião da cúpula do partido com Lula para discutir a substituição dos ministros-candidatos.
De bem.
Após intervenção de Alexandre Padilha (Relações Institucionais), que ontem foi ao Senado, Jucá e Renan fizeram questão de circular juntos ao lado do ministro. Visita à Folha. Maria Izabel Azevedo Noronha, presidente da Apeoesp (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo), visitou ontem a Folha. Estava com Fábio Souto de Moraes, secretário-geral, Rosana Inácio da Silva, secretária de Comunicações, e José Rocha Cunha, assessor.
com SILVIO NAVARRO e LETÍCIA SANDER
Tiroteio

"Não há problema em reabrir dados da CPI dos Correios, desde que o PSDB aceite retomar a investigação do mensalão mineiro."
De REGINALDO LOPES, presidente do PT-MG, sobre o esforço da oposição para buscar na base de dados da finada comissão informações relativas à Bancoop e ao tesoureiro do PT, João Vaccari.
Contraponto

Longo prazo


Gilberto Kassab discursava, sexta-feira passada, na cerimônia de formatura da primeira turma de alunos do programa de inclusão digital resultante de parceria entre a prefeitura da capital e o governo de São Paulo.
Num aparte, alguém da plateia propôs um debate sobre o tema em abril. O prefeito aproveitou a deixa para provocar os secretários que deixarão seus cargos até o final deste mês para disputar as eleições. Fingindo-se de sério, apontou para Rodrigo Garcia (Desburocratização) e Ricardo Montoro (Participação e Parceria) e informou:
-Então, a reunião fica agendada para o dia 15 de abril. Vocês dois estarão disponíveis, certo?

EDITORIAL - O GLOBO


À beira do ridículo
O GLOBO - 17/03/10

A busca por maior protagonismo externo, seja por um projeto eleitoral e/ou personalista, tem exposto o presidente Lula a constrangimentos em suas viagens internacionais.

Isto se dá em função do apoio de seu governo a regimes de exceção.

E ainda ao fato de Lula dar chances ao azar, como agora, quando suas visitas coincidiram com momentos de grande tensão em Cuba e em Israel.

No primeiro caso, a chegada do presidente brasileiro a Havana coincidiu com a morte de um dos dissidentes em greve de fome. Como o regime cubano é compañero, Lula não só perdeu mais uma chance de advogar sua abertura como apoiou a ditadura castrista, comparando os dissidentes políticos, presos de consciência, a criminosos comuns, uma excrescência para quem de fato se bate pelos reais direitos humanos. A visita do presidente brasileiro a Israel e Palestina, em curso, ocorre em meio à maior crise em muito tempo entre o Estado judeu e seu maior aliado, os Estados Unidos. A causa foi Israel ter anunciado a construção de mais 1.600 casas para colonos em territórios ocupados, durante a visita ao país do vice-presidente americano, Joe Biden, o que fez abortar o reinício das conversações de paz com os palestinos, depois de enorme esforço diplomático dos EUA. O fato eliminou a possibilidade de Lula faturar qualquer distensão entre os dois lados.

O atual governo brasileiro é um dos poucos entre os de países de maior peso a ir contra a imposição de novas sanções da ONU ao Irã, a serem adotadas em função do caráter ambíguo do seu programa nuclear, que ameaça a estabilidade do Oriente Médio e do mundo. Foi nesse contexto que Lula chegou a Israel, com um discurso cheio de boas intenções em relação a mediar a paz com os palestinos. Mas começou mal, recusando um convite para depositar flores no túmulo do fundador do sionismo, Theodor Herzl, quando estava previsto que o fizesse no túmulo de Yasser Arafat — pesos e medidas diferentes. Isto motivou um boicote do chanceler israelense, Avigdor Lieberman, a toda a programação do presidente brasileiro. Na sessão do Knesset (parlamento), Lula sofreu um bombardeio do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, do presidente da Casa, Reuven Rivlin, e da líder da oposição, Tzipi Livni, por seu apoio ao Irã. Outra lição à comitiva brasileira: quem diz o que quer, ouve o que não quer. Da desastrada viagem resta a confirmação do erro de avaliação do governo do seu real peso para interferir em um jogo pesado, que se trava longe do seu alcance.

Assim, a diplomacia vira um gestual vazio, à beira do ridículo.

EDITORIAL - O ESTADO DE SÃO PAULO


Da Bancoop ao mensalão

O Estado de S. Paulo - 17/03/2010

As acusações ao tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, já não se limitam aos autos da investigação em curso no Ministério Público paulista sobre os malfeitos na Bancoop, que lesaram pelo menos 3 mil dos seus 8.600 mutuários. Conforme se noticiou, com base nas evidências coletadas pelo promotor José Carlos Blat, eles compraram imóveis na planta que ou foram entregues ainda crus ou nem sequer saíram do papel. Apenas 18 dos 46 empreendimentos foram concluídos. Segundo o promotor, os dirigentes da Bancoop ? a começar de Vaccari, que a presidiu de 2005 a fevereiro passado ? "sangraram os cofres da cooperativa em benefício próprio e também para fomentar campanhas políticas do PT". Ele calcula que o rombo é da ordem de R$ 100 milhões.
Nos últimos dias, enquanto Blat reúne informações adicionais que respaldem o seu pedido de quebra do sigilo bancário de Vaccari ? a Justiça negou a solicitação original e o bloqueio dos bens da Bancoop ?, a imprensa voltou a publicar denúncias contra o tesoureiro petista. Desta vez foram extraídas de depoimentos ao Ministério Público Federal do corretor de valores Lúcio Bolonha Funaro, que vinculam Vaccari ao mensalão. Tomados entre 2005 e 2006, incriminam também o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu. Acusado de remeter ilegalmente para o exterior US$ 2 milhões, Funaro fez um acordo de delação premiada quando estava para ser denunciado como réu no processo sobre o maior escândalo do governo Lula. Funaro descreveu a engenharia financeira petista para abastecer o caixa 2 do partido ? de onde saíam os recursos do suborno a deputados federais e do pagamento dos custos de campanhas.
A crer no doleiro, era simples assim. Em 2003 e 2004, quando ainda diretor financeiro da Bancoop, Vaccari fazia a ponte entre o PT e os fundos de pensão das estatais, como Previ, Funcef e Petros. Nessa condição, ele intermediava negócios dos fundos com bancos, vantajosos para estes, porém prejudiciais para aqueles, desde que os beneficiados pingassem nas mãos do petista comissões de até 15%, as quais ele repassava para os cofres subterrâneos do partido. Sempre segundo Funaro, o padrão seria 12%. Vaccari não era um operador solitário. Trabalhava em sintonia com o então tesoureiro petista, Delúbio Soares ? ambos em sincronia com o ministro Dirceu, apontado como o cabeça da "organização criminosa". Em depoimento à CPI dos Correios em março de 2006, Funaro mencionou a participação de Vaccari no esquema, de que teria ouvido falar no mercado financeiro. Ficou por isso.
De José Dirceu, o doleiro contou que o então ministro induziu o fundo Portus ? também controlado pelo PT ? ao mau negócio de vender as suas participações em dois empreendimentos imobiliários em Santa Catarina. No primeiro caso, Dirceu teria recebido "por fora", dos compradores, R$ 500 mil. No segundo, a comissão seria de R$ 5 milhões. O seu advogado, José Luis de Oliveira Lima, considera as afirmações "levianas, desprovidas de qualquer documento". Além disso, Dirceu jamais teria tido contato com Funaro. Vaccari, por sua vez, assinala que, passados 5 anos do depoimento, "nunca fui chamado para prestar esclarecimentos". O Ministério Público Federal "não propôs ação contra mim. Nenhuma denúncia foi apresentada". De fato, há um problema tanto na história da Bancoop ? calçada, embora, em indícios objetivos ? como nas outras, que se amparam apenas na palavra de um "réu colaborador da Justiça".
O problema existe quando os procuradores não conseguem ver os seus procedimentos transformados em processos judiciais. Segundo a revista Veja, a parte do depoimento de Funaro que menciona Vaccari "ainda é guardada sob sigilo" no STF. Em São Paulo, vão para 3 anos as investigações sobre a Bancoop. A esta altura, de duas, uma: ou o caso já deveria ter sido encerrado ou despachado para a Justiça. Em situações do gênero, a divulgação de suspeitas ou alegações contidas em documentos a que a imprensa tem acesso apenas acentua a urgência com que elas devem chegar a um desfecho.

MERVAL PEREIRA


Ganância futura
O GLOBO - 17/03/10

Este nosso arremedo de Guerra de Secessão, com choro e ranger de dentes tipicamente tropicais, pode se transformar em uma crise política grave se o governo do Estado do Rio não agir seriamente, como não fez até agora.

Não ajuda nada o comentário sarcástico do deputado Ibsen Pinheiro, autor do projeto que reduz drasticamente o pagamento de royalties aos estados produtores de petróleo, dizendo que estado produtor “no máximo tem uma vista para o mar, que é muito privilegiada”.

Por outro lado, vamos e venhamos, cassar a Medalha Tiradentes dada ao deputado gaúcho, considerandoo persona non grata ao estado, beira o ridículo.

Melhor seria que a Câmara dos Vereadores zelasse pela escolha de personalidades que recebem a condecoração, valorizando-a, em vez de distribuí-la a torto e a direito.

Não se discute que cortar bruscamente o pagamento dos royalties do petróleo para o Rio de Janeiro, quase inviabilizando a economia do segundo maior estado brasileiro, coloca em risco o conceito de Federação, incluindo um componente deletério no relacionamento entre os estados.

Nem sempre a maioria pode tudo.

Mas o fato é que a posição do Rio não é tão segura assim como querem fazer crer as autoridades fluminenses, e é preciso mais do que protestos para que se chegue a bom termo na negociação.

A alegação de que o projeto de lei fere o artigo 20 da Constituição, que prevê a compensação aos estados produtores, não é tão irrefutável assim.

Segundo o caput do artigo 20, entre os diversos bens da União, estão os recursos naturais da plataforma continental.

Já o parágrafo 1º do mesmo artigo estabelece que: “É assegurada, nos termos da lei, aos estados, ao Distrito Federal e aos municípios, bem como a órgãos da administração direta da União, participação no resultado da exploração de petróleo ou gás natural, de recursos hídricos para fins de geração de energia elétrica e de outros recursos minerais no respectivo território, plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva, ou compensação financeira por essa exploração.” Há interpretações desse texto que entendem que os estados e municípios têm direito à compensação ou participação pela exploração apenas nos respectivos territórios, e a União pela exploração na respectiva plataforma continental, mar territorial ou zona econômica exclusiva.

Entre 1953 e 1968 só havia indenização da Petrobras aos estados e municípios pela produção em terra.

A União nada recebia dessa produção.

A partir de 1969, a União passou a ser indenizada pela produção marítima. As participações especiais pela exploração de petróleo existem apenas desde 1997, com a Lei do Petróleo, sancionada nove anos depois da Constituição.

A partilha de royalties de mar com estados e municípios é de antes da Constituição, de uma legislação de 1985. Essa legislação estabeleceu o critério de confrontação com base em projeções para definir a distribuição dos royalties para estados e municípios, que até aquela data eram apenas da União.

No entanto, mesmo que se interprete, como fazem o governo do estado do Rio e do Espírito Santo, que a União deve compensar estados e municípios pela exploração do petróleo em altomar, a forma de compensação depende de legislação ordinária, e é por isso que ela está sendo alterada por um projeto de lei complementar, e não por emenda constitucional.

Não há nenhuma obrigatoriedade constitucional de repassar 60% a estados e municípios, como ocorre hoje, nem de privilegiar nessa distribuição os estados e municípios confrontantes, conceito que sequer aparece na Constituição.

Os especialistas que são favoráveis à mudança ressaltam que a utilização de projeção marítima para delimitação da plataforma entre os estados para fins de distribuição dos royalties não torna a plataforma continental território de estado A ou B.

Basta a legislação alterar o tipo de projeção utilizada (ortogonal por paralela) para alterar o resultado da divisão da plataforma continental entre os estados.

É o caso do campo de Tupi, que, pelas projeções ortogonais, pertence à área do Rio de Janeiro, mas com paralelas pertenceria à área de São Paulo, como aliás queria o senador Aloizio Mercadante, para favorecer seu estado.

A infração a contratos seria apenas aos que já estão em andamento, mas mudanças futuras podem ser feitas para renovação dos atuais contratos e para os novos, como aliás pode ser alterada a legislação fiscal, desde que negociada no Congresso.

Uma reforma tributária, se chegasse a bom termo, alteraria a cobrança de tributos sem que pudesse ser considerada uma quebra de contrato.

O problema para os estados produtores é que a maioria esmagadora dos estados chegou a um consenso na Câmara sobre o pagamento dos royalties do petróleo.

Como não há nenhuma razão para se mudar os critérios de interpretação da legislação que está em vigor, a não ser a ganância por um tesouro que ainda está para ser explorado, é lícito classificar de covardia a alteração imposta pela maioria.

Mas será preciso muita negociação para que os estados produtores não saiam desse episódio com um prejuízo irrecuperável.

O governador Sérgio Cabral, que conduziu muito mal a negociação congressual, irritandose excessivamente no primeiro momento e chegando às lágrimas quando o estado foi atingido pelo corte de recursos, tem que tomar cuidado para que a passeata de hoje não se transforme em um tiro no pé.

Nos bastidores, é preciso que o governador se empenhe em negociações realistas, provavelmente abrindo mão de alguma vantagem futura para garantir o que o estado já tem, e não confie tanto na suposta amizade que o presidente Lula e sua candidata Dilma Rousseff devotam ao Rio e a ele pessoalmente.

O ESGOTO DO BRASIL

RUY CASTRO

Tunga


FOLHA DE SÃO PAULO - 17/03/10RIO DE JANEIRO - Se aprovada no Congresso a emenda Ibsen -que propõe uma redistribuição dos royalties com a exploração do petróleo, reduzindo a participação dos Estados produtores e dividindo-a pelos demais-, o Estado do Rio e seus municípios, responsáveis por 85% dessa produção, serão duramente atingidos. Dos R$ 7.504 bilhões que recebem hoje, ficarão reduzidos a nanicos R$ 236 milhões.
Significa que R$ 7.268 bilhões serão tungados da economia do Rio e pulverizados entre os municípios de 24 Estados, cujo mérito para entrar nessa bolada equivale ao dos fluminenses Macaé ou Rio das Ostras para entrar na bolada do leite produzido no Rio Grande do Sul, do minério extraído em Minas Gerais ou das receitas de turismo nas praias do Rio Grande do Norte. Mas, principalmente, farão a festa de deputados e prefeitos cuja cortesia com chapéu alheio lhes garantirá tranquilas reeleições.
A ideia de que o petróleo do Rio não é do Rio, mas "do povo brasileiro", foi enunciada outro dia pelo próprio presidente Lula, numa de suas tiradas para a geral. Mas já vem de longe. Pela Constituição de 1988, o petróleo é o único produto cujos derivados não recolhem ICMS onde são produzidos, mas onde são consumidos. O Rio deve esta bofetada ao então deputado José Serra.
Pelo visto, não era suficiente. Com a subtração de carteira tramada pela emenda Ibsen, o Rio terá de cancelar programas de saneamento, despoluição de baías e lagoas, reforma de estruturas viárias e outros projetos, comprometendo, por exemplo, a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016. Se tais metas não puderem ser cumpridas, o Rio será acusado de quebra de contrato. Mas, então, isso pouco importará. Quem ficará mal no filme será a "imagem do Brasil" lá fora.
Imagem que Lula tanto diz prezar. No fundo, apenas a sua própria.

JOSÉ NÊUMANNE


Lula joga no lixo a própria história
O Estado de S.Paulo - 17/03/10


As elites do exterior - ou pelo menos a parte delas que se jacta de ser civilizada - reagiram com estupefação à saraivada de disparates com os quais noço líder genial dos povos da floresta, da roça e da periferia urbana tem ferido de morte valores fundamentais do convívio humano, tais como a vida, a verdade e a liberdade. Antes encantados com o desempenho satisfatório da economia nacional no contexto da crise mundial e movidos pela mauvaise conscience quanto aos pobres da Terra, cuja redenção é a anunciada meta do "messias" Luiz Inácio Lula da Silva, os europeus agora torcem o nariz a sua bajulação à selvagem tirania cubana dos irmãos Castro. E os americanos o paparicam na certeza de que ele compreenderá que o mundo não põe Ahmadinejad contra a parede, mas o iraniano é que ameaça a sobrevivência do gênero humano. E usará o prestígio que amealhou entre os politicamente corretos do planeta para defender causas justas.

Quem conhece Lula sabe muito bem que ele não mudou tanto assim, desde que emergiu no País como líder dos sindicalistas do ABC paulista até nossos dias. Para os terráqueos bem-pensantes, o pedreiro negro Orlando Zapata, que morreu em consequência de uma greve de fome nos cárceres de Cuba, é um mártir da democracia. Para o menino retirante que chegou ao governo de uma das dez maiores economias planetárias, contudo, o cubano foi apenas um tolo, incapaz de perceber a verdadeira natureza teatral da decisão de parar de comer para constranger moralmente o adversário mais forte. "Ora, já fiz greve de fome", disse o representante supremo do maior herói popular brasileiro, o malandro. "Malandro que é malandro não bobeia", cantou o sambista Jorge Benjor. E, ainda que prefira Zeca Pagodinho a Jorge, Lula conhece esse meio de vida e o emprega como garantia de sobrevivência e código de conduta. O espertalhão come doces e bolachinhas escondido, como um faquir de fancaria, na calada da noite, enquanto os "otários" dormem. Sua debochada gargalhada com Fidel no anúncio da morte do dissidente equivale a um puxão de orelhas na vítima: "Não era preciso chegar a tanto, idiota!"

Essa nata acadêmica mundial que ignorava a Constituição de Honduras e, por isso, rotulou de golpe militar o que era defesa da democracia civil não consegue suportar a brutal comparação dos dissidentes cubanos com os criminosos comuns brasileiros. Mas o respeito incondicional à "Justiça" cubana e a redução da luta política correta e legítima pelo direito de agir e falar livremente ao banditismo comum feita pelo chefe de Celso Amorim e Marco Aurélio Garcia condizem com o que os três entendem que sejam poder e política. A índole dessa gente, forjada na militância estudantil e no peleguismo sindical, reinterpreta a "ética da conveniência" de Max Weber à luz da submissão de tudo ao "companheirismo", não no sentido da camaradagem solidária, mas definindo o instinto mafioso de compadres.

Quem renega a traição de Lula aos mais sagrados princípios humanitários, no caso cubano ou na estulta adesão ao Irã dos aiatolás, só para dizer aos americanos que eles não devem se achar os únicos reis da cocada preta no planeta, não se deu conta das dimensões dessa traição. Pois ela é mais sutil e diz respeito a ele mesmo, sem que se aperceba disso quem o bajula para seguir a voga igualitária. Ao ignorar os apelos dos dissidentes cubanos, por se julgar um "estadista" (imagine só o que Winston Churchill acharia disso!) que só lida com o interesse público de Estado para Estado, e ao fechar os olhos à ignomínia iraniana, ele trai mesmo é sua vida e sua lenda. E não só pela greve de fome que fez sem chegar às últimas consequências. Ao explicar sua gargalhada desumana, indiferente à repressão brutal de Fidel e Raúl à oposição, como um preito à autonomia da "Justiça" da tirania, Luiz Inácio Lula da Silva jogou no lixo sua biografia, seu maior feito e o mito que ele é. Ele é herói da democracia que ora preside por haver enfrentado - mais por manha do que com coragem - os cânones da tecnoburocracia do regime militar numa específica área da Justiça, a Trabalhista. Em sua genialidade ignorante de malandro espertalhão, que nunca bobeia, Lula fecha hoje em Cuba a porta que no Brasil ajudou a abrir há 35 anos, aos solavancos e empurrões, mesmo não dispondo de musculatura nem de convicções para fazê-lo. Quem está condenando sua negação dos princípios básicos da manutenção da vida e da decência nem sequer percebe essa traição à sua venerável biografia.

E sabe ainda menos que, por chocante que seja a desumanidade da opção que ele tem feito contra a humanidade no Caribe como no Oriente, esta oferece menos riscos que outro pontapé que deu em sua biografia. Ao liderar as greves no ABC, o sindicalista ajudou a derrubar o monstro de pés de barro do regime de exceção dos quartéis e das pranchetas. E agora lança mão desse farto cacife histórico apostando-o inteirinho na obsessiva tarefa de levar ao centro do poder Dilma Rousseff, sobrevivente da luta armada contra a ditadura. Lido assim, tudo parece perfeitamente coerente. Mas há uma diferença fundamental: ela pode até ter sido uma jovem idealista, mas seu ideal era derrubar uma ditadura para pôr outra, de esquerda, no lugar. Não contribuiu, então, para trocar o arbítrio de direita pelo Estado Democrático de Direito. Hoje, mesmo tendo perdido a guerra suja e ajudado a prolongar a vigência das trevas, os companheiros da utopia cruenta da favorita de Lula para seu lugar querem calar a dissidência, como fazem Castro e Ahmadinejad, seus modelos de poder e de gestão.

O cidadão decidirá nas urnas se isso ocorrerá, ou não. Mas, se chegarem lá, eles deverão o feito inédito de alcançar o topo do pódio, ainda que tenham perdido o confronto armado, ao prestígio e à força conferidos a Lula na vitória do ar livre e fresco sobre o bolor fétido dos porões, na qual a participação dele foi decisiva.

ANDRÉ MELONI NASSAR & LEILA HARFUCH


Fertilizante estatizante


O Estado de S.Paulo - 17/03/10


O governo federal andou insistindo na ideia de criação de uma empresa estatal de produção e comercialização de fertilizantes no Brasil. Os dois argumentos centrais em defesa dessa empresa estatal seriam a necessidade de reduzir a dependência brasileira do mercado internacional, uma vez que 74%, 49% e 92% do nitrogênio, do fósforo e do potássio, respectivamente, utilizados no Brasil na produção de fertilizantes são importados; e a necessidade de promover maior concorrência no mercado, tendo em vista que a produção de fertilizantes é um oligopólio no Brasil e no mundo.

Os dois argumentos mostram que o tema é sensível. Os produtores rurais, como esperado, estão preocupados com o assunto porque são eles que pagam a conta de fertilizantes mais caros. Viabilizar o aumento da produção brasileira e promover maior concorrência na produção fazem parte de um diagnóstico correto. Já o remédio, a estatal dos fertilizantes, está mais para adoecer o paciente do que para curá-lo. O fundamental nesse debate é entender que o bom objetivo de estimular concorrência no fornecimento de nutrientes básicos à produção de fertilizantes não será resolvido com a criação de uma estatal. O buraco, na realidade, é mais embaixo.

A constatação de que a produção das matérias-primas básicas dos fertilizantes (nitrogênio, fósforo e potássio) no Brasil não tem acompanhado a crescente demanda é um tema superado. A relação entre a produção nacional e a importação de fertilizantes intermediários se movimenta em favor das importações, que vêm ganhando fatia de mercado no decorrer do tempo. Os dados da evolução por nutriente mostram a mesma tendência. No caso do nitrogênio, a produção doméstica representava, em 2002, 47% do mercado e em 2008 representou 26%. No caso do fósforo, esse movimento foi de 57% para 51% e, no caso do potássio, de 12% para 8%. Não somente a produção nacional tem menor participação na oferta total, com exceção do fósforo, como também não tem conseguido acompanhar a demanda. Além disso, comparando o Brasil com o resto do mundo, os números também chamam a atenção. O Brasil é o terceiro maior importador mundial de nitrogênio, atrás apenas dos EUA e da Índia, é o maior importador de fósforo e o segundo maior importador de potássio, também atrás dos EUA.

A dependência de importações, no entanto, é uma questão capenga quando não analisada em conjunto com a estrutura de formação de preços dos fertilizantes no Brasil. A questão-chave a ser respondida aqui é a seguinte: os preços domésticos de fertilizantes pagos pelos produtores no Brasil seguem os preços mundiais? Se seguem, o problema dos elevados preços está no mercado mundial. Se não seguem, há razões para se pensar em políticas de estímulo a maior concorrência. Para responder a essa pergunta desenvolvemos um estudo analisando os preços internacionais e os preços pagos pelos produtores. Nossa conclusão foi a seguinte: os preços domésticos são determinados pelos preços mundiais, mas, com exceção da ureia, fertilizante à base de nitrogênio, as variações nos preços ao produtor do superfosfato simples e do cloreto de potássio são explicadas apenas em parte pelas oscilações dos preços internacionais, sugerindo que maior concorrência seria salutar para o produtor rural. Vamos entender o que essa conclusão quer dizer.

Quando são analisados os preços internacionais da ureia, da rocha fosfática e do cloreto de potássio e são comparados aos preços de importação do Brasil e aos preços dos produtos equivalentes praticados no mercado doméstico (aqui utilizamos os preços em dólar para eliminar oscilações cambiais), observamos que, para cada linha de produto - nitrogênio, fósforo e potássio -, os preços andam absolutamente juntos. Como grande parte da oferta brasileira é feita a partir de matéria-prima importada (74%, 49% e 92%, respectivamente), a conclusão de que os preços internacionais determinam os preços domésticos era esperada. Aliás, essa constatação demonstra que a concentração na produção doméstica não é forte o suficiente para impedir o mercado de funcionar. Ao contrário: na formação dos preços, o mercado está funcionando bem.

Essa conclusão tem uma implicação: como os preços internacionais são determinantes dos preços domésticos, o produtor brasileiro estará sempre sujeito aos movimentos de mercado na Rússia (nos três produtos), na China, no Canadá, na Alemanha, no Marrocos, na Tunísia, na Ucrânia e nos EUA (em pelo menos um produto), a menos que o Brasil reduza sua dependência de importações. A oferta, como se vê, é concentrada. Aliás, não poderia ser diferente, porque, sendo um setor muito intensivo em capital, demandante de elevados investimentos e com ganho de escala, a produção de nutrientes, em qualquer lugar do mundo, será sempre concentrada.

Superado o problema da formação dos preços, fizemos a análise da influência dos preços internacionais nas oscilações dos preços domésticos. A pergunta aqui é a seguinte: quando os preços domésticos oscilam - aliás, eles fazem isso o tempo todo -, quanto dessas variações pode ser explicado por oscilações nos preços internacionais e/ou por variáveis associadas ao mercado doméstico, tais como demanda e, por que não, concentração da produção? Quando esse valor é muito elevado, como no caso da ureia, é sinal de que os movimentos no mercado doméstico refletem integralmente os do internacional. Já no caso do superfostato simples e do cloreto de potássio, cujos valores encontrados foram menores, fatores associados à estrutura da indústria têm peso elevado nos movimentos de mercado doméstico. Neste caso, estimular competição na indústria será benéfico para os produtores rurais e é isso que o governo deveria estar perseguindo, em vez de advogar a volta do capital estatal ao setor.

DIRETOR-GERAL E PESQUISADORA SÊNIOR DO INSTITUTO DE ESTUDOS DO COMÉRCIO E NEGOCIAÇÕES INTERNACIONAIS. E-MAIL: AMNASSAR@ICONEBRASIL.ORG.BR

ELIO GASPARI

Brava gente brasileira


FOLHA DE SÃO PAULO - 17/03/10


Os 82 soldadores dekasseguis do estaleiro EAS indicam que Pindorama vive um novo tempo



A REPÓRTER ANGELA Lacerda trouxe uma das melhores notícias da vida nacional dos últimos tempos: para a construção de seus navios, o Estaleiro Atlântico Sul, de Suape, foi buscar no Japão trabalhadores brasileiros qualificados. Já trouxe 82 e deverá trazer 200. Pela primeira vez, desde o final do século passado, quando a ruína nacional levou milhões de brasileiros a emigrar, registra-se um movimento inverso.
É notícia boa em estado puro. Em primeiro lugar, porque os navios da Petrobras estão sendo fabricados em Pindorama. Como faltam operários especializados no mercado brasileiro, uma indústria pode ir ao Japão buscar trabalhadores que deixaram o país em busca de oportunidades.
Se a Petrobras continuasse comprando barcos e plataformas no exterior, um estaleiro nacional jamais precisaria de soldadores. Aliás, nem de estaleiro se precisaria. (O EAS tem uma encomenda de 22 navios e do casco da plataforma P-55.)
Um soldador de estaleiro japonês ganha o equivalente a até R$ 9.000, não tem expectativa de carreira nem direitos semelhantes aos dos nativos. O EAS paga na mesma faixa e lhes devolve a cidadania trabalhista. No Japão, há 280 mil brasileiros, chamados de dekasseguis, descendentes dos imigrantes que chegaram a São Paulo a partir de 1908.
As décadas perdidas espalharam 3 milhões de brasileiros pelo mundo. Eles batalham nas mais diversas ocupações, quase sempre submetidos a regimes de exploração. Como diria Nosso Guia, nunca na história do nosso país acontecera coisa semelhante.
Em 1995, o Itamaraty tinha calígrafo, mas não dispunha de sala para cuidar dos interesses da diáspora nacional. O presidente Fernando Henrique Cardoso encontrou três garçons brasileiros no banquete do Dia da Vitória, em Londres. Em 2002, um brasileiro que precisasse conversar por telefone com um funcionário do seu consulado em Nova York deveria fazê-lo entre as 15h e as 17h. Na cidade viviam 300 mil nativos.
Havia burocrata que chamava uma parte dessa diáspora de "os ilegais". De fato, cerca de 2 milhões de brasileiros vivem sem a necessária documentação dos países para onde foram, mas um funcionário pago pela Viúva não deveria chamar um compatriota de "ilegal", a menos que ele descumprisse alguma lei de seu país. Esse pedaço da patuleia remete anualmente cerca de US$ 7,5 bilhões para suas famílias, ervanário equivalente às exportações de soja.
O episódio das contratações do EAS é pontual, provocado pela carência de soldadores. Vale registrar que a maioria dos soldadores trazidos de volta estava empregada no Japão, onde quase todos qualificaram-se. Quando emigraram, há dez ou 20 anos, tinham escolaridade, pouca experiência e, em alguns casos, eram pequenos empresários arruinados pelo Plano Collor.
O estaleiro EAS poderia emprestar uma equipe à comissária Dilma Rousseff para cuidar dos cronogramas do PAC. Em julho do ano passado, quatro soldadores brasileiros que trabalhavam no Japão buscaram trabalho em Suape. Em novembro, surgiu a necessidade de contratar mais soldadores. A coordenadora de recursos humanos do estaleiro, Marcia Marques, 36 anos, lembrou-se dos dekasseguis e em dezembro embarcou para Tóquio. Em janeiro, chegou o primeiro grupo de oito trabalhadores. Alguns deles ralam na construção do primeiro petroleiro do EAS, que irá ao mar até o final do mês.

ANCELMO GÓIS

Qualquer pessoa  


O Globo - 17/03/2010
com a devida preocupação ecológica sabe que lixo é um tormento de difícil solução nas grandes cidades. Mesmo assim, não dá para se conformar com esta cena nos fundos do Hospital da Lagoa. Veja a quantidade de detritos que se acumulam em torno das árvores. São vários sacos (alguns abertos), muitas folhas secas e até pedaços de móveis. Moradores da vizinhança, na beira da Lagoa, contam que a bagunça impera por ali há tempos. Não pode
Salve a Portela!
“Portela dos grandes carnavais” será o enredo da azul e branco ano que vem.
A maior campeã do carnaval carioca vai falar de seus grandes personagens, em especial de Paulo da Portela, que completaria 110 anos em 2011.
Agora é o quarto
Pela contabilidade da “Forbes”, Eike Batista passa a ser o quarto homem mais rico do mundo e não o oitavo, como disse a revista há duas semanas.
É que o mercado pagou ontem entre US$ 1,5 bi e US$ 2 bi por 25% das ações da noviça OSX, que vai atuar no setor naval. Como Eike tem os outros 75%, é só fazer a conta.
Paraty-Cunha
O Ibama concedeu ontem licença para a construção da Estrada Parque da Bocaina, no trecho Paraty-Cunha, entre Rio e São Paulo.
O ministro Minc diz que todos os cuidados foram tomados para proteger o meio ambiente.
Usina nuclear...
A obra será paga pela estatal Eletronuclear. Foi uma das exigências do Ibama para permitir a operação da usina Angra 3.
É que a nova estrada poderá ser usada em caso de acidente nuclear — toc, toc, toc — para evacuar a população civil.
À la Zózimo I
E o Lula, hein? O “cara” está mesmo precisando pôr os pés — pelo menos um — no chão.
Achar que tem cacife para mediar o conflito entre árabes e Israel já é mais do que se achar. É soberba mesmo.
À la Zózimo II
E o Serra, hein? Desconversou sobre os royalties, alegando que soube do assunto pelos jornais.
Aliás, quando é que Serra, conhecido no passado por ter opinião a respeito de tudo, vai voltar a dizer algo interessante sobre qualquer coisa?
Deve ser terrível
Seu Jorge, o cantor nascido e criado em Belford Roxo, cidade da Baixada Fluminense que já teve fama de mais violenta do mundo, foi assaltado dias atrás ao lado de casa, no... Pacaembu, em São Paulo, onde vive agora.
Segue...
O cantor, de 40 anos, chateado, diz que vai trocar São Paulo por Los Angeles.
Os bandidos não o reconheceram e ainda perguntaram o que ele fazia. Seu Jorge disse que era o flanelinha da rua.
Como eu voto?
Ontem, no Senado, o líder do governo, Romero Jucá, chamou às pressas gente de sua base para impedir a convocação do promotor José Carlos Blat, que tem acusado dirigentes do PT no caso Bancoop.
O senador Wellington Cabelo Salgado chegou esbaforido e, antes de votar, gritou: “Jucá, como eu voto?”
No pasarán I
No Senado, é forte a articulação para que se vote o pacote do pré-sal, mas só se aprecie a questão dos royalties depois da eleição.
No pasarán II
Lulu Santos e Letícia Spiller também estão no elenco da passeata contra a tunga dos royalties de petróleo do Rio, hoje.
Lesão grave
Depois de tramitar pelo 9º Juizado Especial Criminal da Barra, seguiu para a 20ª Vara Criminal do Rio um processo em que Felipe Simão (namorado de Luana Piovani) e quatro amigos são acusados de lesão grave.
Eles teriam invadido uma festa num condomínio da Joatinga, em novembro de 2008. Um amigo de Felipe é acusado de ter dado um soco no dono da casa.
Vala negra
A 4ª Vara de Fazenda Pública do Rio condenou a Cedae a devolver às famílias de 41 ruas de Parada de Lucas os valores cobrados de taxa de esgoto nos últimos 15 anos.
Os moradores alegam que nunca tiveram o serviço. Cada chefe de família receberá R$ 1.500 por danos morais.
No pasarán III
Marchinha sobre a tunga dos royalties, feita por seu Sebastião, compositor da Portela: “Ah! Seu Ibsen Pinheiro/Eu vou à luta, eu me intrometo/ Pelo Rio de Janeiro/Sua emenda foi pior do que o soneto (...)/Que me desculpem meus irmãos deste Brasil/Deixem meus royalties e não mexam no barril.”


CENA DIGNA
de um catálogo sobre gaiatos boa praça: Antonio Pedro, o ator, e Amir Haddad, o diretor teatral, num ensaio do grupo Tá na Rua, no Rio
PONTO FINAL

Tem gaiato por aí enxergando semelhanças entre Ibsen Pinheiro, o deputado vilão dos royalties do Rio, o economista americano Albert Fishlow e o imortal coleguinha Luiz Paulo Horta. Confira nas fotos acima, mas saiba: o político é o da direita.