terça-feira, janeiro 26, 2010

AUGUSTO NUNES

VEJA ON-LINE

Governo Lula ameaça vítimas do terremoto com um PAC do Haiti

26 de janeiro de 2010

As cenas de ciumeira explícita protagonizadas pelo governo brasileiro depois do desembarque dos americanos no Haiti foram sobretudo mesquinhas. Enquanto uma nação ferida de morte implorava por alimentos e socorros que tardavam a chegar, o Itamaraty implorava pelo comando de um sistema de distribuição inexistente.

As cenas de exibicionismo explícito protagonizadas pelo general Floriano Peixoto diante do palácio presidencial em Porto Príncipe foram especialmente constrangedoras. “É uma forma de marcar posição, é muito importante que haja a percepção do trabalho do Brasil”, discursou o comandante-geral da Minustah no Haiti, suando a farda na operação de entrega de cestas básicas a flagelados já atendidos pelos ianques do outro lado do muro.

“Lamentavelmente, a imprensa tem dado pouco importância à participação brasileira na ajuda humanitária”, queixou-se o general. Queixou-se do general a canadense Kim Bolduc, coordenadora de assistência humanitária da Minustah: “Tem muita duplicação. Não sabemos a ração que estão entregando é suficiente, nem em quanto tempo será consumida”. Até a ofensiva de Floriano Peixoto, os oficiais em missão no Haiti mantiveram-se fora do assédio ao Conselho de Segurança da ONU. Palanque não é coisa para militares da ativa.

Nesta quinta-feira, o ministro Celso Amorim reincidiu na fantasia: o Haiti deve ser reconstruído por um Plano Lula, semelhante ao Plano Marshall do pós-guerra, executado sob a liderança do Brasil. Somadas às geradas pela competição impossível com os americanos, as cenas de sabujice explícita estreladas pelo chanceler ultrapassaram todos os limites do ridículo ─ e reduziram o Brasil a protagonista de um espetáculo indecoroso.

A alma subalterna de Amorim, que se refere ao chefe como “Nosso Guia”, revogou há muito tempo o sentimento da vergonha. Pior para ele. O país não merece virar motivo de chacota em todos os idiomas. É o que ocorrerá se prosseguir a chanchada concebida para equiparar o Brasil aos Estados Unidos e infiltrar um governante desoladoramente jeca na galeria dos estadistas que reconstruíram o mundo em escombros do pós-guerra.

Promover a potência emergente um país ainda afundado no atraso é uma esperteza eleitoreira quase inofensiva se confinada em comícios. Acreditar na fantasia e tentar vendê-la ao mundo é coisa de napoleão de hospício. Se o governo acha que falta serviço, que cuide das secas, das enchentes ou dos morros conflagrados que sobram por aqui.

Se for pouco, pode tratar de outros ítems da pauta gigantesca ─ os 12 milhões de analfabetos, o sistema de saúde falimentar, a malha rodoviária em decomposição ou a multidão de excluídos da rede de saneamento básico. Se ainda assim sobrar tempo, que trate de construir efetivamente o país fictício que estaciona nas inaugurações de araque programadas para fazer de conta que o PAC existe.

Em homenagem a Zilda Arns, que doou discretamente a própria vida, é preciso acabar com a quermesse armada pelos gigolôs da tragédia. Em respeito à imensidão de mortos, entre os quais 21 bravos brasileiros, convém enterrar sem demora nem honras o Plano Lula. Um PAC do Haiti seria pior que terremoto.

O DITADOR E A TERRORISTA

BRASÍLIA -DF

Palanque único

Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense - 26/01/2010


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva está convencido de que a vitória da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), na corrida pela sucessão presidencial, dependerá da retirada da candidatura de Ciro Gomes (PSB). Sem isso, será mais difícil transferir votos para a ministra e manter o foco da campanha no candidato tucano José Serra (PSDB). A operação para removê-lo já foi deflagrada. Ciro virou um estorvo eleitoral. A solução menos traumática é convencer Ciro a aceitar a candidatura ao governo de São Paulo; a pior, fechar as portas do seu próprio partido, o PSB, à candidatura presidencial. Ambas, porém, valeriam a pena. O pior dos mundos é Ciro disputar com Dilma a condição de candidato anti-Serra. E jogar por terra a estratégia de Lula para a eleição.


Pânico// O líder do PT no Senado, Aloizio Mercadante (PT), está com síndrome do pânico. Toda vez que o presidente Lula liga, fica com medo de que lhe peça para ser candidato a governador de São Paulo. Mercadante nunca disse um não a Lula.

Indigesto

De férias com a mulher, Patrícia Pillar, o deputado Ciro estava na Europa e desembarca hoje em Fortaleza. Resta saber se terá apetite para um jantar com o presidente do seu partido, Eduardo Campos (PPS-PE), previsto para amanhã. No cardápio, a definição do cenário político para as próximas eleições.

Troia



O presidente da Câmara, Michel Temer (foto), virou uma espécie de Cavalo de Troia dos caciques governistas do PMDB em guerra com o PT. Eles rechaçam a proposta de lista tríplice para indicação do vice de Dilma e ameaçam empurrar o parlamentar paulista goela abaixo de Lula. Mas podem abrir mão de Temer se o PT aceitar suas exigências em Minas Gerais, no Rio de Janeiro, na Bahia, no Ceará e no Pará.


Confiscos

A Advocacia Geral da União (AGU) entrou no lobby para que o Supremo Tribunal Federal (STF) dê ganho de causa à Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif), apoiada pelo Banco Central (BC), na ação que pede a validação dos confiscos dos planos econômicos Bresser, Verão, Collor I e Collor II. Cerca de 500 mil titulares de cadernetas de poupança entraram com ações judiciais contra os bancos pleiteando a restituição do dinheiro perdido.


Exemplo



A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, pressiona o ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel (foto) a desistir da disputa pelo governo de Minas. Não o faz em favor do ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias (PT), mas do ministro das Comunicações, Hélio Costa (PMDB). Dilma quer Pimentel no comando de sua campanha. A desistência de Patrus, que é candidatíssimo, seria um problema para o presidente Lula resolver.


A conta

O governo vai mesmo jogar pesado no ano eleitoral. O Orçamento da União para 2010, que Lula sancionará nesta semana, prevê 5% de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) e R$ 151,9 bilhões para investimentos públicos. As obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) custarão R$ 29,9 bilhões

Cavaco

O ex-ministro do Esporte Agnelo Queiroz, candidato do PT à disputa pelo governo do DF, começa a enfrentar resistência dentro do partido. O problema maior de Agnelo é o programa Segundo Tempo, marca de sua gestão no Ministério do Esporte, que está sendo investigado pelo Ministério Público Federal no DF.

Grampo/ Em sua primeira reunião do ano, o Conselho Nacional do Ministério Público pode aprovar, hoje, mudanças nas regras de interceptação telefônica. Entre outras coisas, os procuradores terão que informar o número de linhas grampeadas e a quantidade de interceptações iniciadas ou concluídas no período, além de agir contra policiais que não informarem ao Ministério Público a quebra de sigilo dos investigados.

Intifada/ A volta ao comando do PT de José Dirceu, José Genoíno e João Paulo Cunha — que tiveram seus nomes envolvidos no escândalo do mensalão — vai servir de vidraça para as pedras da oposição. “Esse será um assunto a ser tratado na campanha, pois tira um pouco da blindagem petista e mostra quem estará ao lado de Dilma”, antecipa o novo líder tucano na Câmara, João Almeida (PSDB-BA).

Doações/ Demorou, mas finalmente os Correios se engajaram na campanha de assistência humanitária às vítimas da tragédia no Haiti, que recebeu atenção especial do presidente Lula. Desde sexta-feira, a empresa transporta para um quartel no Rio os donativos recolhidos em todo o Brasil.

EDITORIAL - O GLOBO

Projeto em debate

O GLOBO - 26/01/10

A campanha eleitoral deste ano tem características especiais, além de ser a primeira, desde a volta das diretas para presidente, na redemocratização, em 1989, a não contar com o nome de Lula nas cédulas.

Se os principais candidatos tiverem a maturidade que o estágio da democracia brasileira exige, poderão ser travados ricos debates sobre o projeto do Brasil do século XXI. Não uma discussão filosófica, mas sobre pontos objetivos em torno de algo já em execução. No lado positivo, temos a manutenção de bases de uma política macroeconômica coerente, adotada desde 1999, no início do segundo mandato de FH. Vieram dali as metas de inflação, para dar horizonte aos formadores de preço, e a busca por superávits primários, como forma de impedir o descontrole da dívida interna.

O governo Lula, de maneira sensata, manteve estes pilares, preservou a autonomia do BC, e assim o próprio status do país no mundo melhorou.

Outro tema a ser debatido é um anacrônico modelo de capitalismo de Estado, em execução no segundo governo Lula. A ponta mais recente e visível deste projeto é a participação da Petrobras na operação de compra do grupo Quattor (Unipar) pela Braskem, da Odebrecht.

Com o negócio, a produção de matériasprimas petroquímicas ficou nas mãos de uma única empresa, da qual a petroleira é sócia minoritária, mas de grande peso. Há razões técnicas para a verticalização nesta indústria, mas, por parte do governo e da Petrobras, existe uma indisfarçável motivação ideológica: usar o Estado como “indutor” do desenvolvimento, uma reedição anacrônica do modelo usado por Geisel, na ditadura militar, num controvertido programa de substituição de importações.

São pilares deste modelo fundos de pensão de empresas públicas, onde centenas de bilhões de reais estão sob controle de sindicalistas — a maioria deles ligada à CUT e ao PT —; o BNDES; e, entre outras estatais, a Petrobras. Como na era Geisel, a ideia é criar a “grande empresa nacional”, não importa custo ou eficiência. São eleitos empresários privados de fácil trânsito em Brasília, e a eles todo apoio é dado.

A supertele é produto deste programa estratégico, de cunho estatizante.

Tanto que um passo anunciado poderá ser a ressurreição da Telebrás, sob pretexto de ativar o mercado de banda larga na internet. A experiência histórica demonstra que, no final, a conta da ineficiência deste modelo — de resto impossível de ser executado numa economia mais aberta que a da época de Geisel — é espetada no bolso do contribuinte. Outro aspecto é que se trata de um projeto de país sem grandes espaços para as liberdades democráticas.

JAPA GOSTOSA

PAUL KRUGMAN

O enigma de Bernanke

Folha de S. Paulo - 26/01/2010


Um republicano venceu em Massachusetts -e subitamente não está tão claro que o Senado venha a confirmar Ben Bernanke para um segundo mandato como chairman do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos). Isso não é tão estranho quanto parece: Washington subitamente percebeu a ira do público quanto às políticas econômicas que resultaram em resgate de grandes bancos, mas não conseguiram criar empregos. E Bernanke se tornou um símbolo dessas políticas.
Qual é minha posição? Admiro Bernanke profundamente, tanto como economista como por sua resposta à crise. (A transparência requer que eu informe que, antes de começar a trabalhar para o Fed, ele dirigia o departamento de economia da Universidade de Princeton, e foi ele que me contratou para o posto que hoje detenho naquela instituição.) Mas seus críticos têm argumentos fortes. Em última análise, apoio sua recondução, mas apenas porque rejeitá-lo poderia tornar as políticas do Fed piores.
Bernanke é um pesquisador econômico soberbo. E, do segundo trimestre de 2008 ao segundo trimestre de 2009, seus conhecimentos acadêmicos e seu papel na política econômica estavam sincronizados, enquanto ele aplicava táticas agressivas para evitar uma segunda Grande Depressão. Infelizmente, a história não para nesse ponto. Antes que a crise eclodisse, Bernanke era um dirigente bastante convencional do Fed, e cúmplice na complacência da instituição. Pior, depois da fase aguda da crise, ele retornou rapidamente a essa visão convencional.
Considere duas questões: a reforma econômica e o desemprego. Em julho, Bernanke falou contra uma proposta crucial de reforma: a criação de uma nova agência de proteção financeira ao consumidor, hoje responsabilidade do Fed. Mas eis a questão: durante o período que antecedeu a crise, enquanto proliferavam os abusos financeiros, o Fed nada fez. E ignorou diversos alertas sobre os empréstimos hipotecários de risco (subprime). E há o desemprego. A economia pode não ter entrado em colapso, mas está em péssima forma, com seis candidatos a emprego por vaga oferecida. E Bernanke não está esperando melhora rápida: no mês passado, ao prever que o desemprego cairia, ele reconheceu que o ritmo de declínio seria "mais lento do que desejaríamos". Assim, o que ele propõe fazer?
Nada. Bernanke não oferece indícios de que sente necessidade de adotar políticas que resultem em queda mais rápida do desemprego. É severo, mas ainda verdadeiro, afirmar que ele está agindo como se o resgate dos bancos significasse uma missão cumprida. O que aconteceu? Minha sensação é a de que Bernanke, como muita gente que trabalha em contato com o setor financeiro, terminou por ver o mundo com olhos de banqueiro. O mesmo se pode dizer de Timothy Geithner, o secretário do Tesouro, e de Larry Summers, principal assessor econômico de Obama. Mas eles não precisam ser reconfirmados pelo Senado; Bernanke sim.
Isso posto, por que não rejeitá-lo? Existem outras pessoas com o peso intelectual e a competência política necessários a exercer o seu papel: temos Alan Binder, meu colega em Princeton e ex-vice-chairman do Fed; e Janet Yellen, presidente do Fed de San Francisco. Mas -e isso explica por que defendo que Bernanke seja reconduzido- qualquer boa alternativa enfrentaria uma batalha acirrada no Senado. Além disso, as decisões de política monetária no Fed são tomadas em comitês. E embora Bernanke pareça preocupado demais com a inflação, muitos de seus colegas são ainda piores. Substituí-lo por alguém menos estabelecido, com menos capacidade de influenciar os debates internos, poderia reforçar a linha dura contra a inflação e fazer mais estrago nos empregos.
Não é um endosso entusiástico de sua candidatura, mas é o melhor que posso fazer. Caso Bernanke seja reconduzido, ele e seus colegas precisam compreender que aquilo que veem como sucesso de política econômica na verdade é um fracasso. Evitamos uma segunda Grande Depressão, mas estamos enfrentando desemprego em massa. E cabe ao Fed fazer todo o possível para reverter essa situação.

PAUL KRUGMAN , economista, é colunista do "New York Times" e professor na Universidade Princeton (EUA).

Tradução de
PAULO MIGLIACCI

ARNALDO JABOR

É proibido sofrer

O GLOBO - 26/01/10

O Brasil está se defrontando com o absurdo de sua estrutura institucional. Essa explosão galáctica da crise entre polícia, política, Judiciário, empresariado, Estado e capital revela o tumor do absurdo nacional.

Olho em volta e tenho de comentar o incompreensível, o indestrutível, o inexplicável, o inevitável, o incurável, o impossível. É desanimador. Deprimo, porque vivemos no Brasil uma dupla mensagem: tragédia nas notícias e gargalhadas nas revistas de celebridades. Dentro da paisagem tenebrosa, somos obrigados a ser felizes.

Hoje em dia, é proibido sofrer. Temos de "funcionar", temos de rir, de gozar, de ser belos, magros, chiques, tesudos, em suma, temos de ter "qualidade total", como os produtos.
Para isso, há o Prozac, o Viagra, os "uppers", os "downers", senão, nos encostam como mercadorias depreciadas.

No entanto, a depressão tem grande importância para a sabedoria; sem algum desencanto com a vida, sem um ceticismo crítico, ninguém chega a uma reflexão decente.

O bobo alegre não filosofa, pois, mesmo para louvar a alegria, é preciso incluir o gosto da tragédia.

No pós-guerra, tivemos o existencialismo, o suicídio da literatura com gênios como Beckett e Camus ou o teatro do absurdo, o homem entre o sim e o não, entre a vida e o nada.
A infelicidade de hoje é dissimulada na alegria obrigatória. "A depressão não é comercial", lamentou um costureiro gay à beira do suicídio, mas que tinha de sorrir sempre, para não perder a freguesia.

O bode pós-moderno vem da insatisfação de estar aquém de uma felicidade prometida pela propaganda e pelo mercado.

É impossível ser feliz como nos anúncios de margarina, é impossível ser sexy como nos comerciais de cerveja. Ninguém quer ser "sujeito", com limites, angústias; homens e mulheres querem ser mercadorias sedutoras, como BMWs, Ninjas Kawasaki... E aí toma choque, toma pílula, toma tarja preta.

Só nos resta essa felicidade vagabunda fetichizada em êxtases volúveis, famas de 15 minutos, "fast-fucks", raves sem rumo.

O mercado nos satisfaz com rapidez sinistra: a voracidade, o tesão, o amor. E pensamos: "E se não houvesse mais desejo? Eu posso escolher o filme ou música que quiser, mas, nessa aparente liberdade, "quem" me pergunta o que eu quero?

A interatividade é uma falsificação da liberdade, pois ignora meu direito de nada querer. Eu não quero nada. Não quero comprar nada, não quero saber nada, quero ficar deprimido em paz.

Estava neste ponto do artigo quando Ananda Rubinstein, cientista política, me enviou um texto chamado "Elogio da melancolia", de Eric G. Wilson, da Universidade de Wake Forest.

Veio a calhar. Com destreza acadêmica, ele aprofunda meus conceitos. Ele escreve:
"Estamos aniquilando a melancolia. Inventaram a ciência da felicidade. Livros de autoajuda, pílulas da alegria, tudo cria um ‘admirável mundo novo’ sem bodes, felicidade sem penas. Isso é perigoso, pois anula uma parte essencial da vida: a tristeza".

Ele continua:

"Não sou contra a alegria em geral, claro... Nem romantizo a depressão clínica, que exige tratamento. Mas sinto que somos inebriados pela moda americana de felicidade.
Podemos crer que estamos levando ótimas vidas simpáticas e livres, quando nos comportamos artificialmente como robôs, caindo no conto dos desgastados comportamentos ‘felizes’, nas convenções do contentamento.

Enganados, perdemos o espantoso mistério do cosmo, sua treva luminosa, sua terrível beleza. O sonho americano de felicidade pode ser um pesadelo.

O poeta John Keats morreu tuberculoso, em meio a brutais tragédias, mas nunca denunciou a vida. Transformou sua desgraça em uma fonte vital de beleza. As coisas são belas porque morrem - ele clamava. A rosa de porcelana não é tão bela como aquela que desmaia e fenece.

A melancolia, a consciência do tempo finito, é o lugar de onde se contempla a beleza. Há uma conexão entre tristeza, beleza e morte. Só o melancólico cria a arte e pode celebrar a experiência do transitório resplendor da vida.

A melancolia, longe de ser uma doença, é quase um convite milagroso para transcender o ‘status quo’ banal e imaginar inéditas possibilidades de existência. Sem a melancolia, a Terra congelaria num estado fixo, previsível como metal.

Desse modo, o mundo se torna desinteressante e morre. Todo mundo ficaria contente com o que lhe é dado (que, aliás, é o sonho do mercado - a satisfação completa do freguês).

Mas quando a gente permite que a melancolia floresça no coração, o universo, antes inanimado, ganha vida, subitamente. Regras finitas dissolvem-se diante de infinitas possibilidades. A felicidade torna-se pouco - passamos a querer algo mais: a alegria (‘joy’).

Mas, por que não aceitamos isso e continuamos a desejar o inferno da satisfação total, a felicidade plena?

A resposta é simples: por medo. A maioria se esconde atrás de sorrisos tensos porque tem medo de encarar a complexidade do mundo, seu mistério impreciso, suas terríveis belezas.

Para fugir dessa contemplação atemorizante, nos perdemos em distrações vãs e em um bom humor programado. Somos de uma natureza incompleta, somos de vagas potencialidades, e isso faz da vida uma luta constante em face do desconhecido. Usamos uma máscara falsa, sorridente, um disfarce para nos proteger do abismo.

Mas esse abismo é também nossa salvação. Ser contra a felicidade é abraçar o êxtase. A aceitação do incompleto é um chamado à vida. A fragmentação é liberdade".

É isso aí. A felicidade tem um pouco de tristeza.

O colunista está de férias até 27 de janeiro de 2010. Na sua ausência, republicamos artigos escolhidos pelo próprio autor.

GOSTOSA

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

Exportador quer incentivo para renovar indústria

Folha de S.Paulo - 26/01/2010


Os exportadores querem medidas do governo para renovar o parque industrial. A Abracex (Associação Brasileira de Comércio Exterior) enviou ao Ministério do Desenvolvimento documento em que o setor pede plano para ampliar a capacidade produtiva das indústrias e reduzir o custo de produção.

O objetivo é melhorar as exportações brasileiras, que estão sendo sustentadas apenas pelas vendas de commodities. No ano passado, as vendas externas brasileiras de produtos manufaturados, os de maior valor agregado, caíram 28%, enquanto a queda dos produtos básicos foi menor, de 15%.

Uma das medidas consideradas essenciais pela Abracex para a renovação do parque industrial é a liberação da importação de máquinas e equipamentos com alíquota zero.

"O maior fator inibidor de investimentos em tecnologia, em melhoria de qualidade e redução nos custos de produção é a elevada carga tributária sobre a importação de máquinas e equipamentos, entre 40% e 50%", afirma Roberto Segatto, presidente da Abracex.

Segundo ele, "é necessário que se implante uma política industrial agressiva, como já teve no passado e que possibilitou o país sair de exportações de US$ 1,6 bilhão em 1965 para os US$ 200 bilhões em 2008".

No passado, segundo Segatto, o país tinha uma política comandada pelo Conselho de Desenvolvimento Industrial, que mantinha o Befiex -programa de incentivo fiscal às exportações-, que foi responsável pelo crescimento da indústria brasileira e extinto na década de 90.

Entre outras medidas, a Abracex também vê como primordiais a correção do câmbio e a desoneração da produção das indústrias exportadoras.

MUNDO EM CRISE
A atual leitura do economista Marcio Pochmann, presidente do Ipea, inclui: "O Mundo em 2020" (ed. Record), de Hamish McRae, e "Contours of The World Economy, 1-2030 AD" (Oxford University Press), de Angus Maddison. "As minhas leituras no momento estão orientadas pelas preocupações sobre as novas perspectivas brasileiras de longo prazo no mundo em crise desde 2008", afirma Pochmann.

NOVA PLANTA
A Fugini, que faz molho de tomate, prato pronto e é dona da marca Amendocrem, irá inaugurar em julho uma fábrica em Cristalina (GO). Com investimento de R$ 90 milhões em cinco anos, a nova unidade marca a entrada da empresa no segmento de vegetais em conserva.

FLEXIBILIDADE
A demanda pelo álcool deu sinais de arrefecimento. O litro subiu, em média, 1,14% na semana passada nos postos de combustível da capital paulista -a menor alta desde 18 de dezembro. Isso mostra que o consumidor está mais consciente e passou a optar pela gasolina.

CASA SUSTENTÁVEL
Certificações ambientais, que estão cada vez mais comuns em construções de imóveis comerciais no Brasil, ganham espaço também em empreendimentos residenciais. A Fundação Vanzolini, especializada em certificação de sistemas de gestão e produtos da construção civil, lançou no país o selo Aqua Habitacional, uma certificação para projetos residenciais, segundo Manuel Martins, coordenador-executivo do processo Aqua na Fundação Vanzolini. O processo exige o cumprimento de 14 categorias de qualidade ambiental, como locais apropriados para coleta de resíduos na área externa, lâmpadas economizadoras, entre outros.

BENJAMIN STEINBRUCH

Profecias do pós-crise

folha de são paulo - 26/01/10

Todas as estatísticas já divulgadas confirmam que o Brasil atravessou bem 2009, ano de grande crise mundial. Mesmo sem crescimento do PIB, houve uma expansão do emprego formal de quase 1 milhão de vagas. Esse resultado é ao mesmo tempo negativo, por se tratar do pior desempenho desde 2003, e excepcional, considerada a calamidade enfrentada pela economia global.
A tendência de recuperação interna continua no radar de 2010. Nada contra. Mas é interessante observar que, nesse clima de expectativas positivas, começam a surgir no cenário mundial as primeiras profecias apocalípticas do pós-crise. A mais tenebrosa dessas profecias se refere à China e vem na esteira de recentes medidas tomadas pelo governo chinês, de elevação dos juros dos títulos públicos e restrição à oferta de crédito.
Até agora, está tudo bem com a China. Na sexta-feira, saíram dados mostrando que a economia cresceu 8,7% no ano passado, uma comprovação de que as medidas de estímulo ao consumo interno deram resultado em 2009. Enquanto a China caminhar a passos assim tão largos, o esfriamento dos Estados Unidos e da Europa poderá ser parcialmente compensado. Principalmente para o Brasil, porque os chineses, maiores parceiros comerciais do país em 2009, são grandes consumidores de nossas matérias-primas.
As profecias apocalípticas, porém, colocam dúvida exatamente sobre o ritmo chinês, ameaçado pela inflação e por uma bolha imobiliária. O economista Richard Duncan, citado pelo "New York Times", diz que a China tem poucas chances de manter essa cadência acelerada. Nos últimos 25 anos, o crescimento chinês se deu em razão do modelo exportador, beneficiado pelo baixíssimo custo de sua mão de obra, cuja remuneração média foi por muito tempo de US$ 1 por dia. Para atender à demanda crescente de seus manufaturados, a China trabalhou com farta distribuição de crédito e entrada de capitais destinados a investimentos industriais. Instalou, dessa forma, uma enorme capacidade de produção manufatureira, voltada para o mercado externo, que agora cortou demanda. Para compensar a queda das exportações, as autoridades chinesas decidiram estimular o consumo doméstico.
Até agora, a estratégia chinesa deu certo. Mas a aposta apocalíptica do economista é que a China não conseguirá estimular o consumo interno a ponto de ocupar toda a capacidade de seu parque industrial. Os salários são ainda muito baixos e não há como aumentá-los para incentivar mais o consumo sem risco inflacionário. O resultado disso seria um forte desaquecimento chinês. A ideia de um crescimento zero na China é assustadora para a economia global, especialmente num momento em que os dois grandes blocos econômicos, Estados Unidos e União Europeia, estão em recessão.
Há duas coisas que se pode fazer, aqui no Brasil, diante dessa profecia. A primeira é torcer (e rezar) para que ela não se realize. A segunda é preparar ainda mais a economia para um eventual momento como esse. Uma corrente de opinião muito forte defende a ideia de que o Estado deva cortar imediatamente todos os estímulos fiscais e creditícios oferecidos ao consumo e, ao mesmo tempo, elevar os juros. Isso é maluquice.
A travessia da grande crise mundial continua, confirmem-se ou não as profecias tenebrosas sobre a China.


BENJAMIN STEINBRUCH , 56, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

GOSTOSA

VINICIUS TORRES FREIRE

Barrados no baile argentino

FOLHA DE SÃO PAULO - 26/01/10


Sábado de tarde, 29 de dezembro de 2001. Alguém do Departamento de Estado dos EUA liga para o Ministério das Relações Exteriores da Argentina, atrás do ministro. O ministro renunciara, como seus colegas. Ligam para o Cerimonial da Presidência. O presidente renunciou? Ainda não. Mas demoram um pouco para achar Adolfo Rodríguez Saá, presidente provisório, eleito pelo Congresso depois da queda de De La Rúa (a história foi contada pelo jornal então oposicionista, "Página/12"). Na madrugada do sábado, uma multidão invadira o Congresso e pichara a Casa Rosada, sede do governo. No domingo de noite, Rodríguez Saá, que oficializara o calote, renunciava depois de sete dias no poder.
Agora, o tumulto é infinitamente menor. Não se sabe apenas quem é o presidente do banco central, que na Argentina, em tese, tem mais poderes que o BC brasileiro. Martin Redrado era o presidente do BC até quinta-feira passada, de acordo com o governo de Cristina Kirchner. Redrado (e parte da oposição aos Kirchner) acha que ainda detém cargo. Cristina confirmou Miguel Angel Pesce, vice de Redrado, como presidente de fato na sexta-feira.
Redrado havia sido demitido no dia 7 passado por se recusar a obedecer a um decreto de Cristina solicitando parte das reservas internacionais do BC para pagar a dívida externa do governo. No dia 8, a Justiça decidiu provisoriamente deixar Redrado no cargo e suspender a transferência de fundos. Pela lei do BC, Redrado só pode ser demitido depois de ouvida uma comissão do Congresso, cuja opinião, no entanto, pode ser ignorada pela presidente. Na sexta-feira, outra decisão judicial determinou que o governo não pode nomear um presidente "definitivo" para o BC até que o Congresso e o Executivo cumpram o rito legal para a destituição de Redrado. O governo achou que a decisão suspende Redrado, que por sua vez tentou entrar no BC no domingo de noite e foi barrado pela polícia.
O conflito político na Argentina extrapola largamente as vias institucionais. Ou melhor, não há consenso mínimo entre as partes a respeito do que são as vias institucionais. A política rotineira é pontuada de acusações de golpismo, de parte a parte. A ação do governo, e a reação da oposição, é frequentemente decidida na Justiça ou em votações no Congresso acompanhadas por conflitos de rua ou ameaças de "piqueteiros" (dos Kirchner) e de "tratoraços" (de agricultores e oposição). Parece um tumulto da espécie chavismo/ antichavismo, mas em baixa temperatura, que não evolui para coisa semelhante porque a Argentina não é, de longe, tão social e politicamente rudimentar como a Venezuela. Mas, incompreensivelmente, a Argentina tem um histórico já de quase seis décadas de tentativas de autodestruição.
Em tese, não há motivo para crise financeira neste ano, embora as contas do governo estejam no limite. Mas neste ano a economia ainda não vai recuperar o terreno perdido em 2009. Logo, os Kirchner precisam de algum trunfo (mais gasto) para se apresentarem bem na eleição de 2011 e estão dispostos a muita coisa para obtê-lo; a oposição não vai deixar barato.

MÔNICA BERGAMO

Só em duas vias


Folha de S. Paulo - 26/01/2010

Resolução da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) impõe novas restrições à venda do antiviral Tamiflu, usado no combate à gripe A (H1N1). O medicamento agora só pode ser prescrito com uma receita em duas vias (uma ficará retida na farmácia) e com validade de apenas cinco dias. Cada uma das vendas tem de ficar registrada em um sistema eletrônico de controle.

ASPIRINA 1
A Justiça de SP garantiu a um segurado da Sul América Saúde o direito a serviços como atendimento no hospital Sírio-Libanês e no laboratório Fleury, que o plano deixou de oferecer quando ele já era cliente. "É um aumento disfarçado: o preço continua o mesmo e a empresa não oferece mais serviços", diz o advogado Felice Balzano.

ASPIRINA 2
A seguradora, que ainda pode recorrer ao Supremo Tribunal Federal, diz que "cumpre todas as determinações da Justiça" e que "todos os segurados têm à disposição uma ampla e qualificada rede referenciada, além da opção de reembolso".

CADERNETA
A CPI da Gorjeta, que investigará bares e restaurantes que se apropriam da caixinha dos garçons, está próxima: deve começar em março na Assembleia Legislativa de SP.

SEM LIXÃO
A Virada Cultural deste ano, em abril, terá reforço de limpeza, banheiros químicos e outros itens de infraestrutura que falharam em 2009. O orçamento passa de R$ 5 milhões para mais de R$ 7 milhões.

NÃO ROLOU
Já está certo também que o palco do rock não será instalado na praça da República e a rave sairá da rua 15 de Novembro. Os locais foram considerados inadequados em 2009.

APAGA A LUZ
O iluminador Maneco Quinderé, que trabalha com Chico Buarque e Caetano Veloso, fará a iluminação dos carros alegóricos da escola de samba Grande Rio, na Sapucaí. "As escolas precisam apagar aquela luz igual à do Maracanã e fazer algo mais teatral, mais leve", diz.

RETORNO
Cláudio Pessutti, sobrinho e empresário da apresentadora Hebe Camargo, se reúne nesta semana com a direção do SBT para acertar a data em que ela volta ao ar na emissora.

DISCO SEXY
A banda Cansei de Ser Sexy grava disco novo ainda neste ano. A vocalista Lovefoxxx diz que começa a compôr com os colegas em fevereiro.



"Como estamos bem descansados, vão vir músicas divertidas. Não vai ter nada na linha "Eu te odeio"", diz a cantora.

ONCINHA A SOLTA
Ivete Sangalo prepara figurino com temas "animais" para o Carnaval de Salvador, estampados em vestidos curtos, micro-shorts e "corsets".

COM QUE BANDA?
A banda Ecos Falsos lidera a enquete do site do grupo Franz Ferdinand para abrir o show da turnê brasileira em São Paulo. No Rio, Moptop está na frente. Em Brasília, Móveis Coloniais de Acaju. Em Porto Alegre, quatro disputam nariz a nariz. A votação continua em aberto, no site

CURTO-CIRCUITO
A MOSTRA "A Obra e o Destino", com trabalhos de Odilla Mestriner, começa hoje, às 9h, no Centro Cultural Citi.
O DJ de funk Dennis é o convidado especial da festa de hip hop hoje, às 23h30, na Heaven. Classificação etária: 18 anos.
A BANDA Os Malkovich se apresenta hoje, às 23h30, no bar Rey Castro. Classificação etária: 18 anos.
A FESTA Mixturação estreia na sexta-feira, às 23h30, no clube Alley, com discotecagem de Alexandre Bezzi e Mitkus. Classificação etária: 18 anos.
TELAS em acrílico sobre linha do artista contemporâneo chinês Liu Ye podem ser vistas até o dia 27 de fevereiro, no bar Drosophyla. Classificação etária: 18 anos.

DANIEL BERGAMASCO (interino), com EVANDRO SPINELLI, ADRIANA KÜCHLER, DIÓGENES CAMPANHA e LÍGIA MESQUITA

GOSTOSA

WALDEMAR ZVEITER

Alto preço


O Globo - 26/01/2010


Recentemente o Irã testou uma versão mais veloz e precisa de um míssil capaz de atingir Israel, países do Sudoeste da Europa e bases americanas no Golfo Pérsico. Esse é mais um sinal do terreno perigoso que a diplomacia brasileira pisa ao aproximar-se de Teerã, num momento em que a tensão daquele país com o Ocidente aumenta de tom. Antes disso, o Conselho da Agência Internacional de Energia Atômica já havia condenado o Irã por seu polêmico programa nuclear e pela recusa a permitir ampla inspeção internacional em suas instalações atômicas.

Dos 35 países da atual junta de governadores daquela agência internacional, 25 apoiaram resolução proposta pela Alemanha que exigia de Teerã a garantia de que o Irã não manterá em funcionamento nenhuma instalação nuclear não declarada. Venezuela, Malásia e Cuba votaram contra o documento. O Azerbaijão não estava representado.

Ao abster-se, o Brasil aliou-se ao Afeganistão, ao Paquistão, ao Egito, à Turquia e à África do Sul.

Afinal, o que quer a diplomacia brasileira com essa atitude e ao receber com pompa e cerimônia o presidente do Irã, quando EUA, Israel e os principais países da Europa protestam contra a escalada militar e ameaçam aumentar as sanções econômicas contra ele? Se o objetivo é atropelar os esforços dos EUA e outras potências ocidentais para frear o programa de armas nucleares do Irã, certamente o caminho é esse.

O que faz o presidente Lula legitimar a reeleição de Mahmoud Ahmadinejad na primeira hora, quando milhares de cidadãos iranianos eram violentamente reprimidos, com centenas de presos e cinco condenados à morte por denunciarem fraudes comprovadas em todo o país? As relações do Brasil com os Estados Unidos já estavam tensas depois que o governo brasileiro criticou a atuação dos americanos na crise de Honduras e o aumento da presença militar na Colômbia. Se a intenção é esfriar as relações com Washington e arranhar a crescente reputação brasileira como poder global, essas atitudes não poderiam ser mais adequadas.

Ahmadinejad veio ao Brasil e disse que sua intenção é fortalecer a paz.

Mas na verdade ele é um radical, que já manifestou publicamente sua intenção de “varrer Israel do mapa”. Há quem argumente que a aproximação da diplomacia brasileira com o Irã e o alinhamento com outros países que se contrapõem às grandes democracias ocidentais sejam uma estratégia para conquistar um lugar permanente no Conselho de Segurança da ONU.

Sem dúvida, a pergunta que se põe é: não seria muito alto o custo político de voltar as costas para as principais potências ocidentais e legitimar uma figura política como Ahmadinejad? Se real, o suposto objetivo junto à ONU pode ser frustrado, além de muito provavelmente afastar o Brasil do grupo nas nações democráticas.

CELSO MING

Mais Europa, não menos

o estado de são paulo - 26/01/10


Na área do euro, há pelo menos cinco países (entre os 16) ameaçados de colapso fiscal e financeiro.

A situação mais grave é a da Grécia. Mas há os outros quatro do grupo que o jornal inglês Financial Times, em 2008, chamou de Pigs, acróstico que lembra um animal que adora se enlamear (pig, porco, em inglês). São eles: Portugal, Itália, Grécia e Espanha (Spain), mais tarde ampliado para Piigs, com a incorporação da Irlanda, que também está lambuzada e vai mal das pernas.

Uma coisa é o resgate dos ameaçados de naufrágio, assunto tratado aqui na edição de domingo, e outra, as providências que terão de ser tomadas para evitar os descolamentos entre economias dentro da união monetária.

Dia 14, o presidente do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet, já advertira para o estrago provocado na política monetária (política de juros) pelos desequilíbrios fiscais (rombos orçamentários) de países do bloco do euro. Não foi à toa que o Tratado de Maastricht (que criou o euro) e o Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) exigiram convergência fiscal como condição para admissão e permanência na área: déficit orçamentário não superior a 3% do PIB e dívida pública não maior que 30% do PIB. Não são imposições dos ortodoxos de plantão, mas fundamentos sem os quais não há administração sustentável da moeda comum.

Essas exigências poderiam ser definidas por meio de outros arranjos institucionais. Mas foram consagradas por meio do PEC, instrumento que permitiu a administração da macroeconomia por cada governo nacional do bloco, sem interferência dos demais.

A união política foi muitas vezes tentada por meio da aprovação de uma Constituição comum seguidamente rejeitada por certos parlamentos nacionais. No entanto, as infrações dos Piigs parecem exigir nova coordenação macroeconômica. Como relatado pelo correspondente do Estado em Paris, Andrei Netto, França e Espanha, secundados por Portugal, Bélgica e Luxemburgo, pregam a necessidade de se criar um "governo econômico europeu" que coordene a área fiscal, o comércio exterior, a regulação financeira e a política industrial.

A partir do momento em que uma comissão ou autoridades supranacionais impuserem regras conjuntas para definição e execução do orçamento haverá um núcleo embrionário de governo que implicará uma unidade política. A partir daí parece inevitável que a integração preveja transferências de recursos para os países-membros, como acontece em qualquer sistema federativo. Num segundo momento, essa unificação de políticas poderá alcançar outros setores, como defesa e regras de imigração.

Se for isso, terá sido um fato negativo, ou seja, terão sido os desequilíbrios macroeconômicos dentro da União Europeia, especialmente nos Piigs, que conduzirão para a adoção de uma espécie de sistema federativo europeu, ou para uma resposta de "mais Europa e não menos Europa", como pede o primeiro-ministro de Portugal, José Sócrates.

Confira

Endereço errado - A ministra Dilma Rousseff queixou-se da demora do Congresso para a aprovação dos projetos de lei do novo marco regulatório do pré-sal. "Está prejudicando o Plano de Investimento da Petrobrás", disse ela.

A ministra Dilma deveria culpar a si mesma e o governo pelo atraso. A comissão interministerial, da qual ela fez parte, levou um ano, de agosto de 2008 a agosto de 2009, para aprovar uma proposta.

No entanto, quer que, em ano eleitoral, o Congresso aprove tudo a toque de caixa, sem examinar a fundo as implicações de tanta mudança.

JAPA GOSTOSA

TODA MÍDIA - NELSON DE SÁ

Liderança armada

FOLHA DE SÃO PAULO - 26/01/10


O chanceler Celso Amorim falou à CNN en Español, ainda no final de semana, no Haiti, e respondeu sobre "diferenças" com os EUA em tom amistoso, "estamos trabalhando em coordenação muito boa".
Ontem, já no Canadá, na CNN original, manteve o tom, mas foi questionado sobre que países deveriam ter a liderança no Haiti e respondeu que não se trata de "controlar" o país -e sim de agir para que ele não dependa mais de ajuda externa. Ele informou a CNN da aprovação, pelo Congresso brasileiro, de mais 1.300 soldados brasileiros no Haiti.
Por aqui, o "reforço" foi manchete por toda parte - e, para José Sarney, "mostra a liderança do Brasil no comando das forças de paz das Nações Unidas".

MALVINAS & PETRÓLEO
O "Wall Street Journal" deu ontem que companhias britânicas menores iniciam, mês que vem, a prospecção de petróleo nas "ilhas Falklands", ou melhor, Malvinas. Elas "mostram características similares a áreas quentes [de exploração] no Brasil", a saber, o pré-sal.
O jornal diz que as "tensões na região cresceram após a Argentina aprovar lei em 9 de dezembro" identificando as Falklands como parte do país. As "complicações políticas tornam difícil saber" quais grandes companhias poderiam investir nas ilhas -evitadas pelas empresa que operam na Argentina, "como a britânica BP e a Petrobras, que faz prospecção nas ilhas Cuenca Malvinas, ao lado".

CLINTON CONTRA A CHINA
"New York Times", "Wall Street Journal" e agências destacam a reação da mídia estatal chinesa às pressões da secretária Hillary Clinton e do Google.
Na própria manchete on-line de ontem, o "WSJ" ecoou os ataques de jornais como o "Guangming" e o "Diário do Povo", do PC chinês, dizendo que, "nos olhos dos políticos americanos, só quando a informação é controlada pelos EUA ela é considerada livre". O "NYT" destacou o "Global Times": "imperialismo de informação".

AS TÁBUAS
A Apple convocou para o lançamento, amanhã nos EUA, da "última criação" de Steve Jobs, o "tablet". É a reunião de iPhone com notebook, que suplantaria os e-readers, como o Kindle, da Amazon.
Segundo o Blue Bus, linkando o "Los Angeles Times", o "NYT" enviou equipe à Apple para ajudar a desenvolver o aparelho, uma alternativa de sobrevivência para os jornais.
A editora de revistas Condé Nast confirmou que está no projeto. Correndo por fora, a HP e a Dell apresentaram protótipos de "tablets" nas últimas semanas.

PAC, PAC, PAC
Nos sites e portais, o prefeito Gilberto Kassab pregou medalhas em Lula e José Serra, dizendo que simbolizam povos que construíram a cidade, o nordestino e o italiano. Mas o presidente tomou o palanque e, na chamada da Folha Online, "Lula avalia verba do PAC para enchente". No G1, "Lula promete recursos do novo PAC para obras contra as enchentes em São Paulo".
E Lula ainda participaria de dois eventos voltados ao PAC, ontem no Rio _onde, como deu a Band e ecoaram Josias de Souza na Folha Online e Fernando Rodrigues no UOL, "Dilma alcança Serra", no Vox Populi.

ARI CUNHA

Ofensa opressora

CORREIO BRAZILIENSE - 26/01/10


O governador José Serra falou da candidata Dilma Rousseff, dando pouca importância à candidatura dela. Presidente Lula se irritou. Dias depois, convocou Serra para encontro de petistas. A história parece armada. Serra perguntou se havia algum palmeirense na aglomeração. Não houve resposta. O povo riu, debochando. É aí que o presidente Lula da Silva arma a vingança. Interrompe o orador e se volta para seus ouvintes. Faz ar de tristeza e lamenta a falta de palmeirenses. E tira a casquinha. Imaginem se eu perguntasse aqui se há alguém do Corinthians. O povo desaba em gargalhada e aplauso ao presidente. Foi reação de altivez. Lula passou a ser aplaudido e José Serra sabia que estava no papel. Triste espetáculo político.


A frase que não foi pronunciada

“Depois do Papa Doc e de Baby Doc, há vestígios da Mama Doc.”
Conversa de botequim



Valor nuclear

»
Foi descoberto em Macapá o trânsito irregular de material nuclear. Eram toneladas apreendidas pela Polícia Federal. A investigação continua. O objetivo é conhecer quem estava contrabandeando aquele material da defesa do Brasil.

Irregularidad
e

» Deputado Leonardo Prudente, da Câmara Legislativa, é aquele que colocava dinheiro de suborno dentro das meias. Foi advertido e poderia ter evitado tanto tempo para a renúncia. Protelou o que já estava decidido.

Carona

» Quando Brasília estava em construção, a carona era instituição. Chegamos ao aeroporto pela primeira vez, o engenheiro Kleber Faria se ofereceu para nos levar. Ele não sabia onde era o acampamento do Correio Braziliense. Deixou-me no da TV Brasília. Domingo, convidou para visitar o acampamento da EBE, onde trabalhava. Íamos tomar banho de piscina, mas antes passamos pelo Bar-Bebe, delicioso local.

FGTS

» Fundo de Garantia estava com grandes resultados. Foi quando o governo federal resolveu usá-lo de forma irregular. A classe trabalhadora assiste aos abusos sem protestos. Ainda.

Gasolina


» Há luta contra vendedores de gasolina clandestina em pleno Distrito Federal. Enquanto a gasolina e o álcool não forem colocados na bolsa de valores, vai haver sempre interferência de pessoas vendendo ambos falsificados. Um ex-engenheiro da Petrobras organizou a distribuição de gasolina e álcool pelos pipe-lines que seriam construídos. A coisa não cresceu e foi sabotada.

Combustível

» Grupo de físicos da UnB já desenvolveu projeto que torna impossível a falsificação de combustível. Como o interesse pela contravenção é maior, o projeto não vingou.

Egocentrismo

» Eleitores de Lula não mudam opinião por causa dos favorecimentos. A posição do presidente da República sempre foi egocêntrica. O dinheiro de ambos se confunde. Quando Lula precisa de verbas, cria ou as retira de onde seja possível. Quando a aquisição é feita, não há força que reduza.

Direitos humanos

» Esse é o assunto tese do Brasil. Quem deseja esquecer põe a sujeira debaixo do tapete. Oito anos atrás, Celso Daniel foi encontrado morto, assassinado. Investigações não dizem nada. Já que o PT defende direitos humanos, essa poderá ser a oportunidade para se esclarecer o crime que preocupa tanto o PT como a comunidade nacional.

Dívidas

» Governo de Dubai fechou os ouvidos e diz que não vai garantir a dívida do Dubai World. A dívida foi exagerada, não condizente com a realidade. Há outros perigos. Dubai criou pedaço de mar, fez aterramento e construiu milhares de casas de luxo. Como a natureza não suporta erro de ninguém, não será muito se o castigo vier a galope.


História de Brasília

As informações dão conta de que o navio está repleto de contrabando, e fiquem atentos, porque nós transmitiremos o que nos for informado. (Publicado em 23/2/1961)

GOSTOSA DO TEMPO ANTIGO

JANIO DE FREITAS

Ai, que campanha

FOLHA DE SÃO PAULO - 26/01/10

Ver Dilma discursar dá uma sensação de fora de lugar, falta de bossa; Serra é orador com discurso de papel, sem garra

O QUE MAIS ANIMA uma campanha eleitoral longa como a nossa, em condições normais, é a guerra, entre os principais candidatos, de diretas e indiretas espirituosas e ferinas, espontâneas e bem encaixadas, que fazem comparar a vivacidade ou a autoconfiança de um e de outro, traços de personalidade ou mesmo de concepção de vida, governo e política.
Não é o que se pode esperar de Dilma Rousseff e José Serra. Naquele sentido, pior do que serem tão semelhantes, é que são muito desanimadores. Quem vai ficar com o papel de injetar alguma espontaneidade na disputa dos dois é Lula, mas a perspectiva de ouvi-lo ainda mais é, para muita gente, quase assustadora. Ou mais que isso.
A cada vez que ouço/vejo a candidata-ministra discursando em um dos comícios, ou atos "de governo", é uma sensação de fora do lugar, de quadro de cabeça para baixo, que só não desligo como penitência pela profissão adotada.
Não é só falta de traquejo, como se poderia deduzir da insistência oposicionista em que Dilma nunca fez campanha, nem ao menos fez política em escala maior. É uma falta que não tem a ver com inteligência, cultura, educação. É um talento específico que falta, a falta de bossa. Na conversa a coisa pode ir muito bem, mas, diante de público, desanda. Ou melhor, não anda: é aquele corpo estático, os gestos não combinam com as palavras, as palavras não combinam com a alternância da ênfase, e o rosto, coitado, é traído pela perversidade do medo.
Se tudo dependesse de traquejo, Serra, com tantas campanhas feitas, por certo não seria um caso a admirar-se, mas estaria na média, entre os que não chegam a reavivar, ao ouvi-lo, a vontade distante de uma profissão mais aérea. Inclusive porque Serra tem o que dizer. O problema é que não diz: quer, supõe-se, mas não consegue. Travado, rígido, com o rosto capaz de traições que não dispensam nem uma brancura fatal.
Aniversário da cidade em um momento difícil, Lula presente com as demagogias engatilhadas, ontem era dia de Serra se exibir em um discurso daqueles, vibrante, de lançar empolgação pelo país afora, de comover até banqueiros paulistas. Mas apareceu só o Serra conhecido: o orador contido, com um discurso formal, discurso de papel, sem garra e sem futuro.
Já muitos políticos se submeteram a aulas de representação, de desinibição, de colocação da voz e outras promessas. O único caso de efeito comprovado, que me conste, foi o de Carlos Lacerda. Aluno tão aplicado, que passou muito da medida em vários sentidos. Mesmo esse resultado, porém, talvez fosse melhor para animar a campanha que nos espera. Sem alguma coisa assim, só há uma solução: meu reino por uma passagem aérea.