domingo, junho 06, 2010

ELIO GASPARI

O tucanato está tonto e zangado
ELIO GASPARI
FOLHA DE SÃO PAULO - 06/06/10


Serra entrou na disputa aveludado como Tancredo Neves e em poucas semanas enfureceu-se como Collor



O TUCANATO ESTÁ tonto, sem motivo. A prova da falta de rumo está na insistência de José Serra em fazer oposição vigorosa... ao governo da Bolívia. Campanhas presidenciais têm momentos mágicos, como o dia em que Fernado Henrique Cardoso viu eleitores empunhando cédulas do real durante um comício na Bahia. Serra precisa perseguir esses momentos. Ele entrou na disputa com um discurso aveludado, lembrando Tancredo Neves, e em poucas semanas crispou-se, tentando ficar parecido com Fernando Collor.
A perplexidade tucana não tem amparo na realidade. A percentagem de eleitores dispostos a tirar o PT do governo é igual à daqueles que gostariam de votar em Dilma Rousseff. Trata-se apenas de batalhar pelo votos com uma plataforma real, livre de marquetagens. Se perder, paciência.
Em 2008, nos Estados Unidos, o jogo bruto detonou a candidatura de Hillary Clinton, que parecia invencível. Em vez de falar macio, ela e o marido, Bill, decidiram pegar pesado. Ciscaram para fora. Num episódio típico, empurraram Ted Kennedy para o colo de Obama. É verdade que ele namorava a hipótese, mas a gota d"água se deu quando Bill Clinton disse-lhe: "Esse sujeito nunca fez nada. (...) Ele nos servia café!". Kennedy ouviu e fechou a conta.
Tanto Serra como Dilma se parecem mais com madame Clinton do que com o companheiro Obama. O problema de Serra é que Dilma tem Lula ao seu lado. Com estrondos, não ganhará a eleição.

FONTES SECAS
O presidente do Supremo, Cezar Peluso, estabeleceu um padrão capaz de tirar do noticiário as declarações habituais de "fontes do Supremo". Se depender dele, as únicas fontes da Casa serão os bebedouros.

CIRURGIA
O comissariado da Fazenda gostaria de expelir do Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, o CRFSN, a cadeira cativa da Secretaria de Comércio Exterior, ligada ao Ministério do Desenvolvimento.
Esse conselho tem oito membros, quatro do governo e quatro das representações empresariais, e compete-lhe julgar, em última instância, as penalidades impostas ao mercado pelo Banco Central e pela CVM.
Desde 2005, quando um procurador da Fazenda foi posto para fora por conta de suas relações com o mensaleiro Marcos Valério, o CRFSN vive longe dos holofotes. Seria bom que retornasse, para que se entenda o motivo da pretendida cirurgia.

VULGARIDADE
Carla Bruni, mulher do presidente francês, Nicolas Sarkozy, pisou no colchão durante uma conversa banal com Michelle Obama.
Forçando uma intimidade que a companheira não dá a ninguém, La Bruni contou-lhe que numa ocasião o casal deixou um chefe de Estado esperando, enquanto concluía um sessão de saliência, como diria Ancelmo Gois.
Indo além, perguntou se isso já lhe acontecera com Obama. Michelle respondeu com uma negativa sorridente e nervosa.
A história chegou ao ouvido do jornalista Jonathan Alter, que contou o caso em seu livro "The Promise" ("A Promessa"), sobre o primeiro ano de Obama na Casa Branca.

MADAME NATASHA
Madame Natasha é uma veterana de todas as guerras em defesa do idioma e, vestindo um uniforme do Bope, concedeu mais uma de suas bolsas de estudo ao embaixador de Israel no Brasil, Giora Becher.
Narrando a interceptação da flotilha multinacional que pretendia chegar a Gaza, ele escreveu o seguinte:
"Durante a madrugada de 31 de maio, soldados da marinha israelense embarcaram em uma frota de seis navios que tentavam violar o bloqueio marítimo em Gaza".
Ele quís dizer o seguinte:
"Durante a madrugada de 31 de maio, soldados da marinha israelense abordaram e capturaram uma frota de seis navios que tentavam violar o bloqueio marítimo em Gaza".
Quem embarcou nos navios foram os militantes da organização Gaza Livre. Os comandos os invadiram.

EREMILDO, O IDIOTA
Eremildo é um idiota e jura que já viu o filme de um navio tentando chegar a Israel. Em 1947 a organização Aliya Belt, apoiada por combatentes da Haganah, embarcou no porto de Marselha 4.500 judeus que pretendiam entrar ilegalmente na Palestina. O barco chamou-se Exodus.
A Marinha inglesa interceptou o navio, matou três e feriu trinta imigrantes. A viagem terminou no porto de Hamburgo, de onde os judeus foram levados para dois campos de refugiados. Mais tarde, quase todos chegaram a Israel.
A comovente história do Exodus virou romance e, no cinema, Paul Newman viveu o papel de Yossi Harel, o comandante do barco. Ele morreu em 2008, em Jerusalém.

O IPAD REVOLUCIONA A MÍDIA E A PUBLICIDADE

Com dois meses de existência, a tabuleta iPad, da Apple, deu os primeiros sinais da revolução que essa plataforma de comunicação provocará na imprensa e, sobretudo, no mercado publicitário.
A editora Condé-Nast ("Vanity Fair", "Vogue" e "The New York") botou no ar uma edição da revista "Wired" concebida especialmente para a tabuleta. Simples, criativa e inteligente, estourou. Esperavam vender 5.000 cópias e baixaram 24 mil em apenas 24 horas, tornando-se o maior sucesso da Apple durante um dia, mesmo cobrando US$ 5 pelo exemplar. (A "Wired" vende 82 mil nas bancas e tem 672 mil assinantes). Outras revistas testaram o mercado, mas atolaram por falta de qualidade. Os anúncios interativos da "Wired" são um espetáculo a parte.
A revista "Sports Illustrated" promete sua versão com recursos de vídeo. Por hipótese: a capa traz Kaká matando a bola no peito, o freguês toca a tabuleta, ele dispara e marca.
Noutra ponta do negócio, dois jovens indianos, engenheiros formados por Stanford, trabalharam cinco dias e fizeram um aplicativo que junta vinte canais de informações, à escolha do cliente, cada um com vinte notícias, fotos e textos. Chama-se Pulse, custa US$ 4,99 e conseguiu 15 mil clientes em poucos dias. Os rapazes embolsaram pelo menos US$ 40 mil e, pelo andar da carruagem, o sucesso da marca pode transformá-los em milionários.
Quando a patuleia vê qualidade, paga. Pão dormido, só de graça.
A Apple já vendeu dois milhões de iPads no mundo. Ele custa US$ 500 lá fora e R$ 2 mil no Brasil. É caro, mas pelo menos os cartões de crédito brasileiros já podem entrar na loja iTunes, a partir da qual opera-se o iPad.
Em 2001, quando o iPod foi lançado, custava US$ 400 e guardava mil músicas. Hoje o Nano sai por US$ 150 e guarda 2.000, com direito a vídeos. Pode-se esperar que o iPad caia para uns US$ 250, ou mesmo que algum tipo de tabuleta seja dado de graça pelas empresas na compra de pacotes de assinaturas daquilo que virão a ser novas versões dos jornais e revistas.

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