quinta-feira, janeiro 28, 2010

CLÓVIS ROSSI

Da "Gallery" a Davos

FOLHA DE SÃO PAULO - 28/01/10


DAVOS - Quando era presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo, um certo Luiz Inácio Lula da Silva foi visto na casa noturna da moda na época, a "Gallery". Desatou um escândalo à direita e à esquerda.
À direita choveu preconceito. Como um operário se atrevia a frequentar um "point" da elite? Claro que ninguém ousava fazer a pergunta de público, mas o espírito da reação era esse.
À esquerda chovia preconceito de sinal invertido: como o suposto líder da revolução que a classe operária estava inexoravelmente destinada a fazer se animava a frequentar um símbolo da burguesia? Sim, a palavra burguesia ainda frequentava o vocabulário; só agora, na entrevista a Kennedy Alencar, desta Folha, é que Lula disse que não a utilizava mais.
Lula reagiu com o pragmatismo que viria a ser a marca de seu governo: disse que não pretendia incendiar a "Gallery", mas criar as condições para que a classe operária a frequentasse.
A classe operária pode não ter ido ao paraíso, no discutível pressuposto de que uma boate possa ser o paraíso, mas Lula foi. O prêmio de "Estadista Global" que recebe amanhã da quintessência da "elite branca", como a chamaria o ex-governador Cláudio Lembo, é todo um compêndio sobre sua gestão.
Melhorou a vida de uma fatia considerável de brasileiros, em seus oito anos de governo, sem, no entanto, tocar em um único fio de cabelo dos amigos de Lembo. Por isso, conforme leio nos "on-line", pôde ser ovacionado no Fórum Social Mundial e, posso apostar tranquilamente, receberá idêntica ovação do público de Davos.
Não sei, francamente falando, se ser aplaudido por dois lados tão distintos é bom ou ruim. Mas é evidente que Davos o aplaude porque se conformou em frequentar antes a "Gallery" e agora Davos em vez de revolucionar uma ou a outra.

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