sexta-feira, novembro 20, 2009

DEMÓSTENES TORRES

É tribunal, é federal, mas é sobretudo Supremo

O BLOG DO NOBLAT

Quando chegou à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania o pedido de análise da decisão do Supremo Tribunal Federal cassando o mandato do senador Expedito Júnior, me recusei a aceitar.

Argumentei que sentença do STF não é para se discutir, é para se cumprir, pois, acima dele, só Deus.O problema é que alguns se consideram deuses e ao menos um tem disso certeza absoluta.

Agora, no caso da extradição de Cesare Battisti, é imperativo cortar quaisquer dúvidas acerca do alcance dos vereditos do STF, inclusive quando eles se dão pela metade.

A Corte resolveu que se trata de autor de crimes comuns, que deve ser mandado para cumprir a pena no país em que os cometeu.

Ao mesmo tempo, decidiu não decidir que se trata de um órgão maior e passou o crivo de sua sentença a outro Poder, como se o Executivo, que já domina o Legislativo, tivesse o mando sobre o Judiciário.

Para o senador Expedito Júnior, a certeza da cassação; para o assassino Battisti, a dúvida na extradição.

Expedito Júnior chegou aos tribunais superiores por crimes eleitorais, acusado por empregados da firma de segurança da família.

Battisti foi alçado a centro de polêmica porque parte do governo brasileiro o considera um ativista político, não um assassino frio, condenado pelo Judiciário de um país democrático.

Para a esquerdossinecura brasileira, matar quatro pessoas, deixar outras com deficiências permanentes e enlutar famílias não é nada, faz parte do esquema para chegar ao poder, perigoso mesmo é comprar voto.

O argumento não resiste aos fatos explicados na época do mensalão como “recursos não contabilizados”.

Se o governo compra voto, é filigrana; se é a oposição, incinera-se o infrator. Ambas as condutas deveriam ejetar da política seus autores, governistas ou contrários.

O abuso de poder econômico custou o mandato ao senador. O abuso de desfaçatez do governo custou indisposição com a Itália e, ao STF, pode redundar em redução do prestígio.

Battisti não merece a desmoralização do Brasil perante a comunidade internacional nem o menor esforço dos ministros do Supremo. Muito menos, o assassino vale o temor de que a Suprema Corte seja vista como clube lítero-teatral.

Não é um espaço lúdico, não é um jogo de empurra, não comporta dubiedades, não sedia vacilos. O STF é o sustentáculo da democracia.

A ele a nação recorre quando se vê ameaçada e ele a nação socorre qualquer que seja a crise. O criminoso italiano não merece ser o marco do início de um processo de decadência em que as decisões da Instância Maior tenham apenas caráter informativo e não vinculante.

O STF tem as mãos que guiam os destinos de um povo e não pode cometer a pilatice de lavá-las. Decidiu, está decidido. Não tem conversa, não tem consulta, não tem pressão por trás nem presidente pela frente.

Longe de Brasília, o chefe do Executivo, que nunca sabe de coisa nenhuma, parecia muito bem informado sobre os saltos pendulares de posições internas no Supremo.

Tanto que, o presidente da República prometeu respeitar as opiniões “determinativas” do STF.

Sim, no entender do presidente, trocou-se a sentença indiscutível por mero juízo de uns e outros. Não, o Supremo merece o respeito da Pátria e, sobretudo, das autoridades constituídas.

Sigo acreditando que nada há acima do Supremo Tribunal Federal, muito menos os que se consideram os deuses de plantão. Que seja retomada a rota e decida sempre sem titubeios, sem interpretações posteriores, como a sociedade espera que seja o guardião de sua Carta.

O País espera, também, que o presidente da República repare a grosseria institucional e o absurdo nunca antes visto de confrontar uma nação amiga por causa de um assassino.

O riso de escárnio implantado no rosto de Battisti por irresponsáveis plantados no governo brasileiro deve se esmaecer apenas quando entrar no avião com destino à Europa e na cadeia italiana pelas próximas décadas. Expedito Júnior voltou para seus negócios em Rondônia.

Falta Cesare Battisti retornar à Itália, para que as famílias das vítimas não cumpram a pena perpétua da impunidade.

Demóstenes Torres é senador (DEM-GO)

BRASÍLIA - DF

Assalto aos royalties


Correio Braziliense - 20/11/2009


O Palácio do Planalto resolveu pisar no acelerador e votar a partilha do pré-sal na próxima semana, antes dos demais relatórios. Teme que as bancadas dos estados não produtores inviabilizem a aprovação do acordo fechado pelo governo com os governadores do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, e do Espírito Santo, Paulo Hartung, ambos do PMDB. Segundo o acerto com Lula, 25% dos royalties seriam destinados aos estados produtores. O governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), que diverge da proposta, comanda a rebelião das bancadas do Norte e do Nordeste, como a coluna antecipou.

“Todo mundo quer tirar um pouco dos royalties do Rio de Janeiro”, justifica o líder do PT, Cândido Vacarezza (SP), que negocia com o presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), a inversão da pauta. Segundo o petista, a intenção é votar no começo da semana o relatório do deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), que estabelece a partilha dos royalties. Mesmo assim, segundo o parlamentar, será preciso fazer alguns “ajustes” na proposta para amansar os descontentes.

Bombou// A equipe econômica estima que o país crescerá 2,5% no último trimestre, o que projeta uma taxa de crescimento “anualizada” de 10% do Produto Interno Bruto (PIB). Mas a previsão que deixa o ministro da Fazenda, Guido Mantega, rindo mais do que aeromoça é o aumento da arrecadação federal a ser divulgada na próxima semana.

Caixa



A propósito dos projetos do pré-sal, o líder do PSDB, José Aníbal (foto), está cismado com a pressa do governo para aprovar o projeto de capitalização da Petrobras, urgência que atribui a problemas de caixa. Para o tucano paulista, o socorro de R$ 2 bilhões da Caixa Econômica Federal à empresa, em outubro passado, ainda preocupa o mercado. Como o número é pequeno para uma empresa que investe somente este ano US$ 60 bilhões, a única explicação para sua necessidade é a falta de capital de giro.

Fênix

O ex-governador de Minas Newton Cardoso quer renascer das cinzas. Na moita, arrebanha delegados para a convenção do PMDB mineiro com objetivo de recuperar o controle da legenda. Quem não está gostando da empreitada é o ministro das Comunicações, Hélio Costa, candidato ao governo mineiro. A deputada Maria Lúcia Cardoso, ex-mulher e desafeta de Newton, corre risco de perder a legenda e não concorrer à reeleição.

Cana-dura

Um pedido de vista coletivo adiou para a próxima semana a votação no Senado do projeto que altera as atribuições do Ministério Público e das polícias federal, civil e militar na repressão ao crime organizado. O líder do PT, senador Aloizio Mercadante, relator do projeto, no qual o MP exercerá o controle externo das polícias, tenta costurar um acordo para acabar com a disputa entre os órgãos. O petista também leva em conta o projeto do Ministério da Defesa que atribui poderes de polícia à Marinha e ao Exército nas fronteiras do país.

Mulheres

Pesquisa do Data Senado aponta que 62% das entrevistadas conhecem mulheres que já sofreram violência doméstica e familiar. Entre os tipos de violência, as mais citadas foram a física (51%), a moral (16%) e a psicológica (15%). No Brasil, uma mulher é espancada pelo marido ou companheiro a cada 15 segundos.

Absoluto



O favoritismo do senador tucano Marconi Perillo (foto), ex-governador de Goiás, inibe a candidatura do prefeito de Goiânia, Iris Rezende (PMDB), até agora o único que poderia enfrentá-lo na disputa pelo governo goiano. Pela mesma razão, o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, que se filiou ao PMDB, anda falando que permanecerá no cargo.

Recauchutagem/ Enquanto os 36 novos caças de última geração que o governo Lula pretende adquirir taxiam na pista do Programa FX-2, a Força Aérea Brasileira recauchuta mais 12 aviões F-5 adquiridos de segunda mão da Jordânia. O programa de modernização da frota de combate da FAB já reformou 34 caças norte-americanos F-5, que compõem a vanguarda da Força, juntamente com os velhos Mirages 2000, também reformados.

Sem-terra/ A bancada ruralista aprontou mais uma na Comissão de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural: aprovou, ontem, projeto do deputado Valdir Colatto (PMDB-SC) que condiciona a desapropriação de terras para fins de reforma agrária à prévia autorização do Congresso Nacional. A pretexto de combater os sem-terra, a comissão invadiu as atribuições do Executivo.

Olodum/ O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), que assinam vários decretos de regularização de terras quilombolas, vão levar o presidente da Autoridade Palestina, Mahmud Abbas, a um ato público na Praça Castro Alves, hoje, às 16 horas, em comemoração ao dia da Consciência Negra. Acostumado aos tiros para o ar de AK-45 dos soldados do Fatah, durante as solenidades palestinas, Abbas ouvirá pela primeira vez o canto de Margareth Menezes e o som dos tambores da Bahia.

GOVERNADORA WILMA DE FARIA-RN

DIRETO DA POLÍCIA FEDERAL-URGENTE

A governadora Wilma, colocando o neto no BERÇO-PRISÃO. Até o momento o blog não sabe qual crime foi cometido pelo bebê. O que o blog tem conhecimento, são os crimes cometidos pelo Filho, irmão, genro e agregados da governadora.
Pelo sim, pelo não, deve ser prisão preventiva.

NELSON MOTTA

Caças e caçadores


O Globo - 20/11/2009


A cubana Yoani Sánchez está se tornando um símbolo mundial da liberdade de expressão na internet.

Proibida de ser lida em seu próprio país, de viajar para receber diversos prêmios internacionais, vigiada dia e noite, e agora sequestrada e espancada por agentes da policia política, ela continua contando em seu blog como é a vida real em Cuba — que os meios de comunicação estatais, sovieticamente controlados, escondem.

Yoani é perseguida porque revela a realidade do cotidiano cubano, desmente mitos da propaganda oficial com fatos e fotos, ironiza e debocha dos dinossauros no poder, é intolerável para qualquer ditadura. Pior, quanto mais famosa fica, mais difícil calá-la e encarcerá-la, por medo do clamor internacional. No clássico estilo oficial, é acusada de ser inimiga da revolução a soldo da CIA e do Império, embora viva modestamente e sequer tenha internet em casa, privilégio dos fiéis ao partido. Tem que fazer os seus posts de lan houses, que são proibidas aos cubanos, disfarçada de turista.

Os anticastristas fanáticos de Miami, que se nivelam em estupidez aos castristas da ilha, na tentativa de monopolizar a oposição ao regime, plantaram que Yoani fez um acordo com o governo e é usada para mostrar que há liberdade de expressão em Cuba. É ridículo: ela não pode nem ser lida na ilha.

Os velhos revolucionários nunca imaginaram enfrentar inimigo tão poderoso, a serviço do Império, por supuesto: blogs, twitters, sites, celulares, e-mails, satélites, que estão mostrando os desastres de 50 anos de revolução. Tudo que o governo cubano não tolera. Mas é um caminho que não tem mais volta, que nem armas, nem slogans e nem bravatas poderão conter.

Corajosa, logo depois da agressão, Yoani postou fotos de diversos agentes da repressão que vigiam seu apartamento e seus passos. Os arapongas foram flagrados no susto, alguns fugindo, outros cobrindo o rosto como bandidos presos, em flagrantes históricos de uma ditadura.

A caça, armada de celular, passou a caçadora. Os secretas foram expostos, suas fotos circulam pela ilha, Yoani pergunta o que eles vão dizer a suas famílias.

ROBERTA FRAGOSO MENEZES KAUFMANN

O tribunal racial da UnB


O Globo - 20/11/2009

Você já ouviu falar de Tribunal Racial? Só na Alemanha, nos tempos de Hitler? E no Brasil? Pois saiba que em Brasília, a poucos metros da Corte Constitucional, a UnB resolveu instalar uma Comissão Racial, de composição secreta, que, com base em critérios secretos, define quem é branco e quem é negro no Brasil.

Desnecessário comentar sobre o verdadeiro massacre ao princípio da igualdade, da razoabilidade e da dignidade da humana.

Em pleno século XXI, o item 7, e subitens, do Edital n o02/2009 do vestibular Cespe/UnB ressuscitou os ideais nazistas, hitlerianos, de que é possível decidir, objetivamente, a que raça a pessoa pertence.

Em outras palavras: será constitucional que uma comissão composta por pessoas arbitrariamente escolhidas pelo Cespe diga a que raça alguém pertence? Quais são os critérios utilizados? Em um país altamente miscigenado, como o Brasil, saber quem é ou não negro vai muito além do fenótipo. Após a Nigéria, somos o país com maior carga genética africana do mundo! Nesse sentido, importa mencionar a recente pesquisa de ancestralidade genômica realizada em líderes negros brasileiros pelo geneticista Sérgio Pena. Na ocasião, observou-se que a aparência de uma pessoa diz muito pouco em relação à ancestralidade.

O sambista Neguinho da BeijaFlor, por exemplo, possui 67,1% de ascendência europeia.

A mesma coisa pode ser afirmada em relação à ginasta Daiane dos Santos e à atriz Ildi Silva, nas quais a ascendência europeia é maior do que a africana.

Assim, no Brasil, há brancos na aparência que são africanos na ancestralidade. E há negros, na aparência, que são europeus na ascendência! O professor Sérgio Pena, no estudo denominado Retrato Molecular do Brasil, chegou à conclusão de que, além dos 44% dos indivíduos autodeclarados pretos e pardos, existem no Brasil mais 30% de afrodescendentes, dentre aqueles que se declararam brancos, por conterem no DNA a ancestralidade africana, principalmente a materna (a medicina comprova a história de miscigenação precoce).

Nessa linha, infinitos são os questionamentos possíveis em relação aos critérios segregatórios (se é que existe algum critério) de definição racial utilizados pela tal comissão.

Por exemplo: quantos por cento de ancestralidade africana fazem alguém ser considerado negro? E se a pessoa for africana na ancestralidade, mas branca na aparência, e nunca tiver sofrido preconceito e/ou discriminação, isso faz com que ela também possa ser beneficiária da medida? E se o indivíduo negro estrangeiro tiver acabado de chegar ao Brasil para aqui ser residente, ele também pode ser beneficiário da política? E se o negro não descender de escravos, terá direito? E o branco na aparência que comprovar descender de negros escravos, poderá ter acesso privilegiado? E o negro que descender de negros que possuíram escravos, também poderá ser beneficiário? Por outro lado, admitir que uma “Banca Racial” decida quem é negro no Brasil, utilizando-se de critérios arbitrários e ilegítimos, lastreada em perguntas do tipo “Você já namorou um negro?”; “Você já participou de passeatas em favor da causa negra?”, é totalmente ofensivo a os princípios da igualdade, moralidade, publicidade e autonomia universitária.

A questão que se levanta não é superficial: se não se pode definir objetivamente os verdadeiros beneficiários de determinada política pública, então sua eficácia será nula e meramente simbólica.

De fato, a estupidez humana parece não encontrar limites.

JAPA GOSTOSA

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EDITORIAL - FOLHA DE SÃO PAULO

Confusão legal

FOLHA DE SÃO PAULO - 20/11/09


Desfecho do caso Cesare Battisti cria anomalia institucional e projeta insegurança jurídica para as extradições futuras

A DESASTRADA decisão do ministro da Justiça, Tarso Genro, de conceder refúgio ao terrorista italiano Cesare Battisti -condenado em seu país por quatro homicídios- acabou por desencadear uma reviravolta no modo como o Brasil trata pedidos para extraditar estrangeiros. O resultado é uma anomalia institucional que projeta confusão e insegurança jurídica para o futuro.
Ao sustentar o refúgio, o ministro da Justiça imputou à Itália "fundados temores de perseguição política" contra Battisti. Para Genro, uma democracia estável desde o final dos anos 1940, com Judiciário independente, seria incapaz de garantir o cumprimento adequado de sentenças transitadas em julgado.
Expedido o refúgio, a lei específica, de 1997, manda cessar o trâmite dos pedidos de extradição. Mas outra norma, o Estatuto do Estrangeiro, de 1980, atribui exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal decidir se um crime imputado a um extraditando é político -hipótese em que o Brasil não permite a extradição.
Ora, Tarso Genro concedeu o refúgio por avaliar que os crimes pelos quais o italiano foi condenado eram políticos: havia, portanto, um conflito de competências. O Supremo, que já havia ensaiado dirimir essa dúvida num caso precedente, decidiu fazê-lo por ocasião do juízo de Battisti.
Por margem de um voto, o plenário desqualificou os argumentos de Tarso Genro, anulou o refúgio, refutou a tese dos homicídios políticos e julgou procedente a extradição. A maior novidade viria a seguir: o ministro Ayres Britto mudou de lado e juntou-se aos colegas antes derrotados para estabelecer que é do presidente da República a última palavra, nesta e em todas as outras extradições daqui por diante.
Não se trata, é importante notar, de autorizar o chefe do Executivo a recusar ou adiar a entrega de Battisti à Itália nos casos já previstos nas leis e no tratado de extradição com o Brasil -já é do presidente, por exemplo, a faculdade de aguardar o término do processo ao qual o estrangeiro responde aqui, por falsificação de documentos. O Supremo diz, simplesmente, que Lula não está obrigado a cumprir a extradição. Pode recusar-se a entregar o extraditando num ato de pura, e ilimitada, discricionariedade.
Num passe de mágica, transfere-se a instância julgadora da extradição -papel que a Constituição reserva ao Supremo- para a Presidência da República. A corte máxima de repente se torna um órgão meramente consultivo nessa matéria, contrariando sua tradição centenária de decidir as questões, produzindo efeitos necessários de suas manifestações.
O inusitado é tamanho que nem sequer o Planalto -sequioso por consumar a ação entre amigos iniciada por Genro- sabe reagir. Como manter um estrangeiro cujo status de refugiado foi cassado na Justiça? Como justificar politicamente um ato que contraria o Supremo? Como impedir a entrega de Battisti sem desmoralizar o tratado de extradição entre Brasil e Itália?
A obsessão do governo de atender a um pequeno mas ruidoso lobby de militantes de esquerda já nos custou demais. Os amigos de Cesare Battisti têm todo o direito de pleitear o relaxamento de sua prisão. Mas que o façam no lugar certo -na Itália que o julgou e condenou. É para lá que Lula deveria transferir o terrorista, respeitando a vontade da maioria do Supremo.

TÂNIA DA SILVA PEREIRA

Liberdade para morrer!

O Globo - 20/11/2009


O mundo acompanhou pela imprensa internacional e pelos relatos das pessoas próximas ao Papa João Paulo II que, desde o início do agravamento de sua doença, manifestou a vontade de permanecer em sua casa e solicitou que fossem afastados tratamentos que dariam somente um prolongamento precário e penoso da vida, todos resumidos em suas últimas palavras: “Deixai-me ir para a casa do Pai”.

Devemos entender o “testamento vital” como eficaz instrumento garantidor da autonomia do paciente terminal que, redigido em momento de sanidade mental, reflete o direito de ser respeitado em sua vontade, em concreta manifestação de sua dignidade no momento da morte.

O “testamento vital” é ato unilateral de vontade onde o declarante, com lucidez e convicção, atestadas por um especialista, expressa seu desejo em instrumento público, perante duas testemunhas de, em situações terminais, na hipótese de ser acometido de uma doença grave, ou no caso de um acidente que acarrete um quadro de inconsciência permanente, ser evitado o prolongamento da vida por meios artificiais. Deve indicar um médico da sua confiança para acompanhar o estado terminal. Nesse documento podem ser incluídas cláusulas sobre sepultamento, cremação e doação de órgãos.

O novo Código de Ética Médica (Resolução do CFM no1931/2009 ) estabeleceu que “nas situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos pacientes sob sua atenção todos os cuidados paliativos apropriados”. As Unidades de Cuidados Paliativos já representam no Brasil uma conquista significativa na atenção ao doente terminal, buscando atender às necessidades físicas, psíquicas, sociais e espirituais do paciente e de sua família.

O projeto de lei 116/2000 do senador Gerson Camata, debatido em audiência pública (17/09/2009), busca excluir a ilicitude da ortotanásia se previamente atestada por dois médicos, diante de uma morte iminente e inevitável e desde que haja consentimento do paciente ou, em sua impossibilidade, do cônjuge, companheiro, ascendente, descendente ou irmão. Evita-se, assim, o desgaste emocional, físico e financeiro que sua existência infeliz e impro dutiva possa acarretar.

Em nome do direito à vida, da liberdade e do princípio da dignidade humana, não se pode recusar às pessoas o direito de expressar sua vontade de maneira a orientar os médicos e aqueles com quem convive com afinidade e afetividade. Tendo como parceira a comunidade científica, busca-se estabelecer um posicionamento dos operadores do Direito, da classe médica e da sociedade civil organizada. Igualmente, o acesso aos cuidados paliativos deverá representar um direito universal e uma prática comum porque é direito de qualquer pessoa uma vida com qualidade que termine com uma morte digna.

TÂNIA DA SILVA PEREIRA é advogada e professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

GOSTOSA


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FERNANDO DE BARROS E SILVA

Filme C


Folha de S. Paulo - 20/11/2009

Como "2 Filhos de Francisco", "Lula, o Filho do Brasil" é um filme sobre a superação. Ambos os enredos têm origem em histórias verídicas de brasileiros que, nascidos na miséria e sem perspectivas pela frente, conseguem contornar as adversidades para ascender socialmente, até atingir os píncaros da glória individual e o ápice do reconhecimento público.
A trajetória que vai da miséria ao estrelato é parecida, mas, no primeiro caso, os personagens são uma dupla sertaneja e, no segundo, o presidente da República, o que muda as coisas de figura. O pai deste Lula da Silva não é "Francisco", mas "o Brasil".
Se a expressão "filme B" designa as produções rudimentares, o cinema menor destinado ao consumo ligeiro, parece que agora estamos diante de um novo fenômeno: o "filme C". Com "Lula, o Filho do Brasil", o melodrama épico da vitória pessoal sobre a pobreza se converte em ideologia de uma época.
Esse gênero de entretenimento com mensagem social e intenção edificante já está presente em "2 Filhos de Francisco", mas ganhou agora sua versão oficial com o carimbo do Planalto. A oportunidade vislumbrada pelo clã Barreto para lavar a égua e o estímulo de Lula a tudo o que possa resultar no culto à sua personalidade estão associados numa obra que vai alimentar a confusão entre a sorte de um indivíduo e o destino de um povo.
Em 1982, em sua primeira campanha eleitoral, quando disputou o governo de São Paulo, Lula dizia ser "um brasileiro igualzinho a você". Anos depois, diria, em tom de ironia: "Ninguém queria ser um brasileiro igual a mim".
Hoje as coisas mudaram. É provável que a classe C emergente, a quem o filme parece ser didaticamente dirigido, se reconheça e se emocione diante da tela.
O Brasil continua a ser o país em que a desigualdade ainda imensa convive com infinitas formas de mobilidade social. Mas estamos avançando. Quem nos diz é esse filme simplesmente horroroso.

LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

Real forte chega à exportação de primários

FOLHA DE SÃO PAULO - 20/11/09


A ATENÇÃO quanto aos efeitos negativos da valorização do real estava até agora restrita ao setor industrial, principalmente nos segmentos voltados para a exportação. Não por outra razão são os órgãos representativos da indústria os que mais reclamam e pedem uma ação mais decisiva do governo.
Os exportadores de produtos primários estavam -até agora- protegidos da taxa de câmbio valorizada por uma nova lógica de mercado: os preços em dólar desses produtos subiam na proporção da valorização do real e de outras moedas emergentes. Durante vários meses, os índices que medem os preços das principais commodities, quando calculados em real, apresentavam uma estabilidade monótona, apesar das grandes oscilações do câmbio.
Com a aceleração recente da desvalorização do dólar em razão da percepção de que os juros nos Estados Unidos devem continuar muito baixos em 2010, essa mágica se desfez. Com isso, o valor em real dos produtos primários exportados pelo Brasil começou a ser afetado. Nesta última semana, o jornal "Valor" trouxe extensa reportagem sobre os preços da carne bovina no Brasil e em outros países exportadores que competem conosco.
A arroba do boi custa hoje US$ 44,50 para os frigoríficos brasileiros, valor equivalente ao que vigora nos Estados Unidos. Na Argentina -grande concorrente do Brasil nos mercados internacionais-, os frigoríficos pagam menos de US$ 30 pela mesma arroba. O mesmo ocorre no Uruguai (US$ 34,60) e na Austrália (US$ 38,60). Mesmo com os preços em dólar mais baixos, os criadores nesses países continuam a receber o mesmo valor em moeda local e estão felizes da vida. No Brasil, os criadores terão de aceitar menos reais por arroba para viabilizar as exportações de carne.
O mesmo fenômeno -perda expressiva de competitividade- está ocorrendo no setor de carne de frango por conta da taxa de câmbio. Nesse segmento, as empresas americanas -que são mais eficientes do que as brasileiras- têm escala de produção que permite aumentar sua presença nos principais mercados consumidores. Da mesma forma, produtos como soja e seus derivados e café também têm seus preços em real deprimidos em razão da moeda brasileira cada vez mais forte. Certamente os associados da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e da CNI (Confederação Nacional da Indústria) vão ganhar novos companheiros na luta para enfraquecer o real nos próximos meses.
Em todos os setores exportadores e nos segmentos mais sujeitos à concorrência das importações, estamos assistindo a uma transferência de renda das empresas para os consumidores, por meio dos preços mais baixos de produtos industriais e alimentícios. Os índices medidos no atacado nos últimos meses mostram esse fenômeno de forma clara, tanto na cadeia industrial como na maioria dos produtos agrícolas.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva aconselhou os exportadores mais prejudicados a ganharem competitividade para enfrentar a realidade de uma moeda nacional forte.
Esquece ele que, para que isso ocorra, o governo precisa mudar sua forma de organizar o gasto orçamentário. Somente com investimentos em infraestrutura, principalmente na cadeia logística de exportação e importação, e mudanças profundas na estrutura tributária do setor exportador será possível esse movimento por maior eficiência. Está mais do que na hora de uma melhor execução da política fiscal, com menores gastos de custeio e mais investimentos.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS , 66, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).

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JOÃO MELLÃO NETO

Meu caro Lula

O Estado de S. Paulo - 20/11/2009
Nos últimos 23 anos já lhe escrevi, aqui, neste Espaço Aberto, pelo menos umas cinco cartas, sempre com o mesmo título. Não tenho grande esperança de que você as leia. Afinal, você mesmo se vangloria do fato de não gostar de nenhum tipo de leitura. Não tem importância. Eu já me dou por satisfeito se ao menos algum assessor seu as ler. E me compraz também o simples fato de escrevê-las.

A primeira, bem me lembro, foi em novembro de 1989. Você acabava de passar para o segundo turno, que viria a disputar com o Collor. O seu discurso, à época, era eivado de rancor e ódio contra as camadas mais favorecidas. A queda do Muro de Berlim ainda não fora devidamente deglutida pelas nossas bravas esquerdas, tanto que ainda se falava a sério sobre o comunismo e você, não sei por que cargas d"água, colocava-se como porta-voz dessa gente toda. Eu o conheci quando ainda era presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e você dizia que "intelectuais e estudantes só serviam para atrapalhar". Depois disso, quando começou a dirigir o PT, você, estranhamente, mudou. Adotou o discurso marxista, que era usado justamente por aquelas pessoas que você disse que "atrapalhavam". Tudo isso com a bênção da ala dita progressista da Igreja.

Intelectuais, estudantes e padres - não foi à toa que você perdeu três eleições.

Mas tudo isso é passado e você já tratou de enxotar toda essa gente esquisita. Uma gente, aliás, que custeou a sua vida, na condição de presidente do Partido dos Trabalhadores.

Estou novamente lhe escrevendo porque tenho notado que você mudou. E, sinceramente, não consigo vislumbrar para onde.

Seu discurso, desculpe-me dizer, é populista. Mais responsável do que o de seus colegas Hugo Chávez e Evo Morales, mas mesmo assim populista. Você mudou de carismático para carinhoso e ninguém sabe dizer por quê. A sua proposta é a da conciliação e da concórdia e você mal imagina o estrago que está causando em nossas instituições. Você tem o Poder Executivo, dispõe de maioria no Legislativo e, quanto ao terceiro Poder, o Judiciário, coube-lhe a rara oportunidade de indicar 7 dos 11 ministros do Supremo Tribunal Federal.

Os partidos políticos perderam a razão de existir. Com exceção de três ou quatro, todos os demais o apoiam. "Nunca antes neste país" se viu uma aliança tão ampla e contraditória. As esquerdas o aplaudem e as direitas, também, incluindo aquele partidos que abrigam os remanescentes da ditadura.

Até mesmo a União Nacional dos Estudantes (UNE), agora, ao invés de bradar contra o governo, deu de aplaudi-lo. "Nunca antes na História deste país" tal fenômeno ocorreu.

Na área sindical, tudo corre às mil maravilhas. Tanto a CUT como a Força Sindical, as duas grandes centrais, em vez de promoverem passeatas de protesto, preferem fazer atos públicos de apoio. Cabe aqui outro "nunca antes neste país".

Por que você se tornou tão "light"?

Eu me recordo de ter lido em 2001 (antes, portanto, de sua primeira vitória) um livro muito interessante de Duda Mendonça, o seu então marqueteiro oficial, no qual comentava "o jeito petista de ser". Dizia ele que os militantes do partido, sabe-se lá por quê, só apareciam em público com a cara amarrada, barba desgrenhada e ar ameaçador. Você mesmo não fugia à regra.

Companheiro a se despedir de companheiro lascava um "a luta continua". Que luta é essa?, perguntava-se Duda Mendonça.... Contra quem ela se dá?

Mais adiante afirmava que, se há algo que o brasileiro médio abomina, é confusão. Nada por aqui se resolve com brigas, refregas, muito menos com "lutas". Esse slogan "a luta continua" prometia exatamente o contrário. Por essa e outras razões correlatas, o partido sempre era derrotado nas urnas.

Esse livro, caro Lula, presumo que você leu. E se não o fez, ao menos foi um aluno aplicado do mestre Duda. Foi assim, creio eu, que surgiu o "Lulinha paz e amor".

Você já está no leme da Nação há quase sete anos. De modo fulminante, o episódio do "mensalão" tratou de afastar de seu convívio quase todos aqueles que o vinham acompanhando havia décadas. Outros caíram em desgraça por se terem proposto a realizar proezas impossíveis. Como aquele que iniciou o governo como ministro do "combate à fome". Em nome de seu programa, o famigerado Fome Zero, o seu governo abriu mão até de adquirir uma dúzia de aviões de guerra, alegando que o dinheiro necessário para tanto seria revertido para o meritório projeto.

O tempo passou e nunca mais se ouviu falar nem do tal ministro nem do Fome Zero. Quanto aos aviões de combate, eles estão sendo comprados agora. Que papelão, hein, Lula? Você deixou de comprar os jatos na ocasião e menos de um ano depois adquiriu o Aerolula. Vai entender...

Outra coisa que tenho reparado em você é que adquiriu uma rara habilidade na arte do "recorte e cole".

Depois do fracasso do Fome Zero, você e seus amigos decidiram levar adiante vários programas sociais dos tempos do Fernando Henrique. Eram o Bolsa-Escola, o Vale-Gás, etc. Funcionou tão bem que você decidiu colar todos eles e assim nasceu o Bolsa-Família.

Essa história de PAC também é um exercício de colagem. Você pegou todas as obras públicas que estavam sendo realizadas no País, juntou-as com as das estatais e pronto: estava criado o pomposo Programa de Aceleração do Crescimento!

Você já está ficando oito anos. Dizem por aí que pretende se candidatar em 2014 e assim ficar para mais oito.

Para falar a verdade, eu nunca votei em você, mas, pelo andar da carruagem, meus netos e bisnetos ainda terão oportunidade de fazê-lo.

Lula-lá em 2032!

VINÍCIUS TORRES FREIRE

Desigualdades, de FHC a Lula


Folha de S. Paulo - 20/11/2009

Desigualdade econômica regional caiu mais sob FHC, mas mudança não é efeito direto de ações de governo


A DESIGUALDADE econômica entre Estados e regiões diminuiu mais nos anos FHC do que nos anos Lula, segundo dados divulgados nesta semana pelo IBGE.
Decerto não foi intenção de nenhum dos dois puxar a sardinha econômica para esta ou aquela região. Nem a mudança é efeito direto da ação de governos. Políticas públicas têm efeito lento e retardado na alteração das diferenças econômicas regionais, se tanto, quando não têm consequências inesperadas. Além do mais, certos fatores que influenciam o destino de regiões estão fora do alcance de governos, como as andanças da economia mundial.
Nos anos Lula, houve grande alarido sobre o progresso econômico do Nordeste. Mas, a julgar pelos dados do PIB, a região andou apenas um tico mais rápido que o "Sul rico" entre 2003 e 2007. Os dados recentes e o recálculo do PIB desde 1995 reforçam a impressão de que algumas mudanças ocorridas entre 1990 e 1995 é que deram origem a alguns deslocamentos produtivos no país ao longo da década seguinte.
O PIB per capita no Nordeste equivalia a 42,3% do PIB per capita nacional em 1995, 46,44% em 2002 e ainda estava quase por aí em 2007 (46,66%). O do Sul foi de 108,6% em 1995 para 114,76% em 2002 e também quase estacionou: equivalia a 114,51% da média nacional em 2007.
De 1995 a 2002 foi a região Sudeste que "cedeu" participação no PIB. As mudanças maiores, essas e outras, ocorreram entre meados dos 90 até os anos da retomada do crescimento do país, no governo Lula.
A abertura comercial de 1990 (Collor) a 1994 (Itamar & FHC) e o real forte de FHC 1 avariaram alguns setores industriais e obrigaram outros a partir de centros como São Paulo. Sujeitas à competição do importado de melhor qualidade e/ou mais barato, as empresas tiveram de se mexer. Algumas se mudavam à procura de salários menores, sindicatos fracos ou inexistentes, subsídios estaduais, impostos menores ("guerra fiscal") e de outras reduções de custo -em alguns setores, a confusão metropolitana é um custo.
Outras empresas procuravam ficar mais próximas de centros de fornecimento de matérias-primas ou se mudaram com seus fornecedores, caso de indústrias de alimentos que migraram para o Centro-Oeste.
Trata-se aqui da indústria de transformação ("fábricas") e não da indústria total, que inclui a indústria extrativa (como petróleo). Costuma-se ouvir que a indústria paulista perdeu bastante participação na produção nacional. Nem tanto. Na indústria total, São Paulo tinha 44,5% do valor da produção em 1995; em 2007, 35,4%. Mas, no caso da indústria de transformação, a "queda" foi de 48,7% para 44,4%.
"Queda", entre aspas, pois na verdade houve um grande crescimento da indústria extrativa, em especial no Rio de Janeiro (petróleo).
O Nordeste ganhou uma fatia magra da indústria -foi de 7,94% para 8,84% do total nacional. Mas 95% desse incremento ficou na Bahia, que tem sua petroquímica e implantou uma indústria de automóveis.
Claro que não é só de indústria que se faz um país. O Centro-Oeste, por exemplo, no período cresceu quase o dobro do Sudeste -enriquece com a agropecuária. Mas é preciso achar um norte para o Nordeste.

TAXÍMETRO

BARBARA GANCIA

Arrivederci, Cesare Battisti!

FOLHA DE SÃO PAULO - 20/11/09


É natural que se pense que o presidente Lula esteja alinhado a Tarso Genro no caso Cesare Battisti


"NÃO ME TRAGA problemas, só me traga soluções." Durante anos, convivi com um diretor de Redação que mantinha uma plaquinha com essa frase sobre sua mesa de trabalho.
Era do tipo explosivo, e vira e mexe um urro vindo de sua direção desviava a minha atenção da tela do computador para uma cena bastante comum, a imagem do diretor brandindo a placa feito um punhal de sacrifício sobre a cabeça de algum repórter mais incauto.
Imagino que o presidente Lula seja o tipo de chefe que teria de bom grado essa mesma plaquinha sobre a mesa em que despacha no Palácio do Planalto. Acho que já deu tempo de aprendermos que Lula não gosta de problemas, que foge da contrariedade e que prefere sempre deixar os pepinos de casca mais espessa para outros descascarem.
É fato que ele não ficou nem um pouco feliz com seu ministro da Justiça, quando o atual titular da pasta inventou um conflito absolutamente evitável com a Itália na questão da extradição do terrorista italiano Cesare Battisti.
Qualquer um que tenha um pouco de intimidade com o temperamento e o modus operandi do nosso presidente, sabe que o "imbroglio" deve tê-lo deixado fulo da vida.
É bem verdade que qualquer calouro do Instituto Rio Branco teria passado ao léu do desgaste diplomático. Pois, já pensou, meu dileto leitor, o que alguém com o jogo de cintura e a habilidade política de Lula não deve ter achado dessa confusão toda?
E, agora que a decisão terminou no colo do presidente, eu não gosto nem de pensar nas cobras e lagartos que devem estar bolindo a respeito do ministro da Justiça na intimidade do Palácio da Alvorada.
É natural que se pense que Lula esteja alinhado a Tarso Genro no caso Battisti. Além do maniqueísmo generalizado que opõe duas ideologias como num clássico do Maracanã, fazendo supor que o mundo se divida na vida real como na cabeça de Chico Alencar, Ivan Valente e Eduardo Suplicy, o ministro da Justiça, afinal de contas, é de Lula e foi o presidente quem o colocou lá.
Logo após o Supremo Tribunal Federal decidir por delegar a decisão final sobre a extradição de Battisti a ele, foi também o presidente quem acionou a AGU (Advocacia Geral da União) para dar a impressão de que estaria buscando uma saída jurídica que conseguisse manter o italiano em solo tapuia.
Mas, veja bem: se Lula optar pela permanência do italiano, ele agradará a Marilena Chauí, Antonio Candido, Maria Victoria Benevides e a mais dois ou três gatos pingados da facção mais retrógrada do seu próprio partido. Mas desagradará à opinião pública de seu país, à Europa inteira e, sobretudo, criará uma situação inédita de tensão e rancor entre o Brasil e a Itália.
Conhecendo nosso presidente "sombra e água fresca", o que você, meu nobre leitor, acha que ele fará?
Sou capaz de apostar um caminhão refrigerado de picolés de limão como Lula irá enrolar o máximo que puder para fazer crer que tentou manter o facínora por aqui e que, no fim das contas, Cesare Battisti acabará cantando o "Sole Mio" lá na terra dele. Que assim seja!

MÍRIAM LEITÃO

Ciência e tempo

O GLOBO - 20/11/09


O ministro inglês do Meio Ambiente, Hilary Benn, está convencido de que a reunião de Copenhague será bem-sucedida. “A ciência é clara, e o tempo é curto.” Benn passou esta semana no Brasil e fez elogios ao país e ao presidente Lula, que mostrou “liderança” ao anunciar compromissos de corte de gases de efeito estufa. Ele disse que haverá financiamento dos países ricos

Ele me disse que não entendeu o comunicado da Apec, Cooperação Econômica Ásia e Pacífico, como um sinal de que China e Estados Unidos querem adiar o acordo do clima: — Não creio que eles queiram adiar. Eles discutiram até que ponto é possível se resolver as questões em Copenhague para se chegar a um acordo legalmente obrigatório. O que está claro é que precisamos de um acordo forte, e o que foi discutido na Apec não muda isso, porque a ciência é clara, e o tempo é curto.

Entrevistei o ministro num programa que foi ontem ao ar na Globonews e repete hoje às 8h30m e 16h30m. Ele disse que na reunião de cúpula do clima os países precisarão dizer claramente que compromissos estão dispostos a aceitar.

Explicou que a Europa já disse que vai chegar a 2020 emitindo 20% menos do que em 1990. A Inglaterra foi além, propôs 34% e promete chegar a 2050 emitindo 80% menos do que em 1990: — É essencial termos a contribuição dos Estados Unidos. As pessoas precisam colocar os números na mesa. Para fazer um tratado válido, um país vai olhar para o outro e dizer: “o que você vai dar? O que vai oferecer?” Quando somarmos todas as ofertas feitas, poderemos ver se é o bastante para evitar uma perigosa mudança climática.

Não faz sentido que os líderes digam assim: “vou prometer ao meu povo que faremos isso, mas estou relutante em assinar um acordo internacional.” Hilary Benn vem acompanhando essa negociação há algum tempo como parlamentar ligado à causa ambiental, antes de ser ministro, e por isso tem uma visão concreta de quanto se avançou.

Lembrou que nos EUA, anos atrás, o governo até negava a existência da mudança climática e hoje está disposto a negociar. Entre os avanços dos últimos anos, ele inclui o Brasil: — O Brasil mostrou um grande progresso. O índice de desmatamento hoje é um quarto do que era há cinco anos. Foi muito bem recebido o comunicado do presidente Lula em nome do Brasil, semana passada, porque mostra liderança de verdade, que é o que queremos em Copenhague.

Lembrei a ele que o desmatamento caiu, mas 7.000 km2 é uma área equivalente a 4.4 vezes o tamanho da área metropolitana de Londres: — É uma área imensa, mas se há 10 anos alguém dissesse que seria possível reduzir a um quarto a área desmatada em cinco anos, ninguém acreditaria. É muito importante na nossa missão reconhecer quanto é feito de progresso. Ainda falta muito? Falta. Já demonstramos que temos capacidade de fazer as mudanças necessárias? Acho que sim.

Acha que hoje há progressos em proteção de florestas, em uso de energia, em posição política, em compreensão científica, em decisão de agir dos governos.

O governo inglês — ressaltou — foi o primeiro a ter uma lei climática, a ter um orçamento de carbono para a própria administração pública. Funciona assim: cada órgão do governo tem que cumprir uma meta de redução das emissões em suas atividades.

O ministro admite que se uma parte do acordo de Copenhague será o esforço de cada país, a segunda parte envolverá financiamento para que países em desenvolvimento possam fazer sua transição: — As economias emergentes e em desenvolvimento perguntam, e com razão: como pagaremos pela baixa emissão de carbono, pelas novas tecnologias e mudanças necessárias? Sem dúvida, isso tem que fazer parte do acordo. Na última cúpula, o primeiroministro Gordon Brown disse que até 2020 o apoio financeiro tem que ser de US$ 100 bilhões por ano e viria de fontes públicas e de fontes privadas através do mercado de carbono.

Ele acha que não faz sentido que os grandes emergentes, que são também grande emissores de gases estufa, não tenham que cumprir meta, e que países como China, Brasil e Índia sejam tratados da mesma forma que os países pobres: — A China e o Mali são países inteiramente diferentes, com um grau de responsabilidade diferente.

Londres vai sediar as Olimpíadas em 2012, e eu perguntei como ele vai assegurar a Olimpíada sustentável.

Ele disse que isso tem que ser pensado desde o começo. Contou, por exemplo, que em vez de usar caminhões para levar material de construção para Vila Olímpica, eles usaram barcos e foram pelo Rio Tâmisa.

E que só isso já reduziu muito o volume das emissões. O segredo de uma Olimpíada verde é pensar desde o início do projeto.

Antes de começar a entrevista, eu disse que o número dos céticos, os que não acreditam em mudança climática, está diminuindo a tal ponto que eles já são uma espécie em extinção.

Ele deu uma boa gargalhada e admitiu: — Eu me preocupo em proteger as espécies, mas sobre essa, em particular, acho que não devo me preocupar.

JAPA GOSTOSA

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ARTHUR DAPIEVE

Fla-Flu mental

O GLOBO - 20/11/09

Lobão, Marina, Caetano, Azeredo

Contudo, vamos trocar de metáfora esportiva.
Semana passada, era corrida maluca. Nesta, é futebol. O apagão do Lula acirrou os ânimos de um dos embates mais estúpidos do Campeonato Brasileiro de Política: o Fla-Flu mental. Parecia a velha piada sobre as obras paralisadas do metrô em Copacabana: “O buraco é do Brizola ou o buraco é do Moreira?” Foi constrangedor ver Edison Lobão, ministro das Minas e Energia, incapaz de trocar pilha em lanterna, censurando um técnico do Inpe sob a alegação de que o tal não tem conhecimento de causa para falar do sistema elétrico brasileiro. Foi igualmente constrangedor ver Arthur Virgílio, líder do PSDB no Senado, declarar que o apagão em 18 estados é que foi o verdadeiro racionamento a fim de defender, hã, a poupança compulsória de energia no Governo FH, sem nem mesmo se dar ao trabalho de consultar um dicionário.
A rejeição in totum do Governo FH pelo time do PT atrás é obtusa. Quando Lula assumiu, só se queixava da “herança maldita”, mas foi esperto o bastante para se apoderar das conquistas do antecessor. Agora, a rejeição in totum do Governo Lula pelo time do PSDB não é menos tapada. Renegá-lo é, de certa forma, renegar a si próprio.
Não se trata de, daqui da cabine, perseguir a imparcialidade jornalística, que, aliás, nem concerne a um cronista, mas é ululante a continuidade do futebol praticado por PSDB e PT.
Partir para o tudo ou o nada ofende a inteligência.
A principal diferença é que tucanos foram tímidos na defesa do social, e petistas foram desinibidos no ataque à ética.
E aí, em meio ao clássico do maniqueísmo pátrio, Marina invadiu o campo. Ela assinalou um tento, levantou a camisa verde e, por baixo, apareceu outra, com a frase “Sou de Jesus”.
O efeito nos bancos adversários foi imediato.
Além de Marina, já confirmaram presença na conferência sobre o clima o tucano Serra e a “petista” Dilma. Serra sempre foi verde.
Basta olhar. Dilma achava que Copenhague era só o nome de uma chocolataria.
A propósito de “Marina”, dois personagens escreveram em busca de reparação. Por ordem de surgimento no texto da semana passada, Caetano Veloso e Eduardo Azeredo. Seguemse, então, cada trecho em questão, os emails deles e as respostas que lhes enviei.
Trecho: “Porém, ao contrário de Caetano, que em temporadas passadas já se desmanchara em elogios a Antônio Carlos Magalhães, a Mangabeira Unger e ao próprio Ciro, o cronista até hoje não chegou a nenhuma conclusão sobre a tímida Marina.” E-mail: “Dapieve, em meio ao cansaço diante da grita por causa de uma manchete do ‘Estadão’ e da fanfarronada do Segundo Caderno sobre Woody Allen (extraída de entrevista autobiográfica dada a pequena revista cultural de João Pessoa), me deparei com você, de quem gosto, afirmando que apoiei ou louvei Antônio Carlos Magalhães. A verdade é que fiz oposição sistemática a esse político durante toda a sua vida pública, tendo recebido dele respostas pela imprensa (‘Caetano quer ser diferente’, ‘Ele não gosta de mim mas a mãe dele gosta’). Subi nos palanques de Waldir Pires e Lídice da Mata contra ACM. Disse repetidas vezes que ele representava um tipo de político de que a Bahia deveria poder se livrar. E que ninguém era meu dono. Portanto, minha declaração de voto a Marina Silva não pode ser emoldurada por informações descuidadas e irresponsáveis. Minhas ideias são ideias de artista: complexas e maleáveis. Se um dia você quiser saber as nuances de minha apreciação de ACM, podemos conversar. Mas minha oposição pública a ele foi clara e teimosa. Peço que você corrija a informação.
Obrigado. Caetano Veloso.” Resposta: “Caro Caetano, agradeço seu apreço e sua mensagem. Concordo, sim, que o que escrevi pode dar a entender que você ou apoiou ou louvou Antônio Carlos Magalhães. Isso não está correto, nem na minha memória, e será corrigido na coluna. Dada a repercussão do tema Marina junto ao (e)leitorado, acho que voltarei ao assunto na próximo sexta. Seja como for, não era apoio ou louvação ao político que eu tinha em mente — tanto que escrevi ‘elogios’, algo bem mais genérico — e sim alguma frase sobre a beleza física do ACM ou coisa parecida. Mas não pretendo polemizar, imagino como deva ser cansativo mesmo. Se você se sentiu ofendido, cabeme apenas ponderar isso e reproduzir a sua queixa. Será sempre um prazer conversar, sobre ACM ou Regina Spektor. Abraço.” Trecho II: “Contudo, o texto (de Fernando Henrique) era tanto ataque ao governo quanto ao próprio PSDB, incapaz de fazer qualquer oposição, inclusive pelo rabo preso no ‘mensalão mineiro’ de seu ex-presidente Eduardo Azeredo.” E-mail II: “Prezado cronista Arthur Dapieve, não tenho nenhum ‘rabo preso’. Sou vítima, inclusive, de falsificadores. E não desejo a ninguém que também sofra com ilações, suposições e montagens. A questão está sub judice, e pessoas responsáveis não deveriam, neste momento, fazer afirmações precipitadas. Obrigado pela atenção. Senador Eduardo Azeredo.” Resposta II: “Prezado senador Eduardo Azeredo, agradeço sua mensagem, mas não afirmei que o senhor tem ‘rabo preso’ — e sim que o PSDB tem ‘rabo preso’ por sentir-se tolhido nas críticas, pelas acusações contra o senhor e/ou a sua campanha. Não tenho mesmo como julgar o mérito delas, mas para mim está claro que tais acusações constrangem o seu partido ao jogá-lo no mesmo saco do PT, inclusive no que tange ao andamento do processo no STF. Processo no qual desejo-lhe sucesso.
Cordialmente.” E fim de papo no Maraca. Até a próxima rodada do Brasileirão 2010.

JANIO DE FREITAS

Efeito cômico

FOLHA DE SÃO PAULO - 20/11/09

O Supremo consagra com um bafafá grotesco a conclusão de que sua conclusão sobre o caso Cesare Battisti nada vale

O BAFAFÁ ENGRENADO pelos ministros do Supremo Tribunal Federal, para definir-se sobre uma questão que o caso Cesare Battisti não incluía, resultou na quebra de um princípio básico: no Estado democrático, é essencial que as decisões judiciais sejam o mais precisas possível em seus fundamentos e o mais claras para a compreensão e a confiança do senso comum.
Foi um fecho à altura de um processo cuja lerdeza, com longos intervalos entre suas sessões de pronúncia de votos, tornou o Supremo Tribunal indiferente à permanência de um homem em prisão, à espera de que Suas Excelências decidissem se os crimes que o condenaram justificam, ou não, sua extradição a pedido da Itália. E processo que proporcionou outra provável manifestação da tendência do atual Supremo de exceder-se -seja em casos como o da Reserva Raposa/Serra do Sol, quando sua decisão passou do problema da propriedade fundiária para impor uma política das reservas indígenas, seja pelo excesso de manifestações extrajudiciais sobre assuntos dos outros dois Poderes.
O estreito resultado de cinco a quatro pela extradição de Battisti (dois ministros ausentes) requeria por si só, e ainda com divisões tão acirradas fora e dentro do tribunal, cuidados especiais. Deu-se o oposto. Presidente e derrotado quanto à obrigação (ou à liberdade) do presidente da República de praticar a decisão do STF, Gilmar Mendes fez uma proclamação apressada e confusa do resultado final, limitando-o à extradição e excluindo o que caberia ao presidente ante a decisão do tribunal. Marco Aurélio reagiu, com cobranças irônicas à proclamação do resultado daquela segunda parte, e começou o espetáculo: nove Excelências falando ao mesmo tempo, em respostas ou provocações de uns aos outros -digamos, confronto de torcidas jurídico-políticas. Confronto sublinhado por dois traços.
O primeiro: a maioria dos ministros deixou a impressão de falta de coragem, esta coragem mínima de dizer com objetividade e clareza, e simplesmente, que em razão disso e daquilo "considero que a Presidência da República deve seguir a decisão do Supremo Tribunal Federal", ou, da mesma maneira, "não está compelida a seguir a decisão do STF". O palavrório juridiquês e fugidio enrolou-se em si mesmo, revestiu a maioria dos ministros, e produziu este efeito cômico: nem eles entendiam mais o que os outros diziam, supondo-se que houvesse o propósito de ser entendido, e não só o oposto. Já ninguém sabia mais como a maioria votara.
O segundo traço foi oferecido por Carlos Ayres Britto. Desde sua primeira intervenção no caso, lá atrás, esse ministro considerou, como outros quatro, que Cesare Battisti não foi condenado na Itália por crimes políticos, mas por crimes comuns, de morte. Na sessão de anteontem, ressaltou que os atos de Battisti passaram por todas as instâncias da Justiça italiana e pela Corte Europeia, sempre qualificados como crimes comuns, e sem revisão das sentenças condenatórias. Ainda coube farto elogio à Justiça italiana.
Depois disso, porém, Ayres Britto entrou em repentino parafuso de juridiquês para juntar-se aos quatro votos, tornados vitoriosos com o seu, que transferiram para o presidente da República a decisão de extraditar ou não. Para e por que tanto tempo com seus votos, se considerava que nada valeriam para o presidente da República, para Cesare Battisti, para a Itália e para a própria condição de magistrado do próprio Ayres Britto, cuja decisão não produz efeito?
Por cinco a quatro, o tribunal definiu-se pela extradição e, pelos quatro aí vencidos mais o de Ayres Britto que deu um para cada lado, o tribunal decidiu que sua decisão pode ser seguida ou não pelo presidente da República, a critério do próprio.
Logo, o caso Battisti desnudou um sistema muito original. O Comitê Nacional de Refugiados, que existe para decidir de refúgios e extradições, decidiu pela extradição de Cesare Battisti, mas o ministro da Justiça, Tarso Genro, pôde desconsiderar a decisão e, por critério pessoal, conceder-lhe a condição de refugiado. Então, Comitê Nacional de Refugiados para quê? É só entregar o processo à decisão ministerial e chega de burocracia e lenga-lenga. O Supremo Tribunal Federal, por sua vez, passa o ano com o recurso italiano contra a decisão pessoal de Tarso Genro e, depois de tantos meses de tramitação, tantos votos enciclopédicos e horas inextinguíveis, consagra com um bafafá grotesco a conclusão de que sua conclusão nada vale. Então, para quê tudo aquilo?
Bem, uma decisão do Supremo vale, sim. Não a que lhe foi pedida, a respeito do cabimento, ou não, da entrega de Cesare Battisti à Justiça italiana. Mas aquela que outra Excelência praticou sem precisar de processo, votos e juridiquês, apenas com lavar as mãos.