terça-feira, setembro 15, 2009

BRASÍLIA - DF

Cabral baixa a bola


Correio Braziliense - 15/09/2009


O governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), resolveu “recuar os half para evitar catástrofe”, como diria o Neném Prancha, famoso personagem do futebol carioca. Ontem, em Paris, onde recebeu a Légion d’Honneur (Legião de Honra), a mais alta condecoração do governo francês, Cabral baixou a bola e elogiou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. “O presidente da República, mais uma vez respeitando a tradição democrática, ouviu as partes e retirou o regime de urgência. E (…) tem dado reiteradas provas de seu compromisso com a democracia brasileira”, disse, se referindo à tramitação dos projetos do pré-sal no Congresso.

Cabral se deu conta de que os adversários partiram para cima dele, aproveitando o contencioso com Lula. De olho no Palácio Guanabara, o ex-governador Anthony Garotinho (PR) classifica como um tiro no pé o apoio incondicional de Cabral à candidatura da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT). O prefeito de Nova Iguaçu, Lindberg Faria, aproveita o estresse de Cabral com Lula e desafia a cúpula do PT como candidato a governador. E o ministro do Trabalho, Carlos Lupi (PDT), aproveita para tirar uma casquinha e ameaça lançar a candidatura do apresentador Wagner Montes, o segundo colocado nas pesquisas de opinião sobre as eleições de 2010 no Rio de Janeiro.


Xadrez// Entre os manifestantes detidos durante protesto contra a primeira visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Roraima estava o fazendeiro Paulo César Quartiero, ex-prefeito de Pacaraima e líder dos arrozeiros desalojados da reserva indígena Raposa Serra do Sol. Filiado ao DEM, ele é um dos mais ferrenhos opositores ao governo Lula no estado.

Falência


Cabral defende a tese de que a Constituição garante participação especial aos estados produtores de petróleo e que o governo federal deve redistribuir a riqueza do petróleo utilizando os royalties que cabem à União. No Rio de Janeiro, os recursos dos royalties vão para a Previdência e para o meio ambiente, como o saneamento da Lagoa Rodrigo de Freitas, ícone da Cidade Maravilhosa. “Sem esses recursos, a Previdência quebra”, adverte.

Sumiço


Termina segunda-feira o prazo para que o Palácio do Planalto envie à Câmara dos Deputados as fitas do sistema de segurança que mostrariam as visitas da ex-secretária da Receita Federal Lina Vieira ao gabinete da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. O DEM faz a contagem regressiva.

Esquentou


A disputa pela seccional da Ordem dos Advogados do Brasil no Distrito Federal (OAB-DF) pega fogo. A chapa Ordem da Casa, encabeçada pelo advogado Esdras Dantas, contesta o resultado da pesquisa divulgada na coluna de sábado, de responsabilidade da chapa Questão de Ordem, de Francisco (Kiko) Caputo. Realizada pelo Instituto Global, a sondagem confirmou o alto índice de indecisos: 67,26% dos advogados. Kiko continuaria na liderança, com 13,27% das intenções de votos, havendo um empate técnico entre Esdras Dantas (8,85%) e Ulisses Borges (7,96%) na pesquisa espontânea. Ibaneis Rocha, da chapa Unidos pela Ordem, aparece com 2,65%.

Pindaíba



A decisão de reduzir o expediente dos quartéis de todo o país, que vão funcionar como o Congresso (da tarde de segunda-feira à manhã de sexta), por medida de economia, não foi uma manifestação de protesto do comandante da Força Terrestre, general Enzo Peri (foto). Falta mesmo o rancho para a tropa. Enquanto o presidente Lula negocia pessoalmente a compra dos caças franceses Rafale, completando o pacote bilionário da parceria militar com a França, o armamento convencional do Exército está sucateado. Não há sequer munição suficiente para os quase sexagenários fuzis FAL utilizados no adestramento.




Repeteco



A inauguração da ponte sobre o Rio Tacutu, na fronteira com a Guiana Francesa, pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi a terceira cerimônia do tipo promovida por autoridades brasileiras. Em abril, o governador Anchieta Júnior (PSDB) cortou a fita para, em seguida, a via ser interditada pelo governo do país vizinho. O líder do governo no Senado, Romero Jucá (foto), do PMDB-RR, também já fez as honras federais na obra.

Diploma/ O deputado federal Hugo Leal (PSC-RJ) proporá a formação de uma Comissão Especial na Câmara dos Deputados para a elaboração de uma proposta de emenda constitucional (PEC) ou de um projeto de lei (PL) que resgate a obrigatoriedade de diploma de jornalismo para o exercício da profissão. A ideia é unificar todas as iniciativas apresentadas sobre o assunto no Congresso Nacional.

Patrimônio/ A Comissão de Assuntos Especiais da Câmara dos Deputados vota, nesta terça-feira (15/09), às 14h, no plenário 11, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 150/01, que destina parte dos tributos federais, estaduais, municipais e do Distrito Federal para a preservação do patrimônio cultural brasileiro e para a produção cultural.

Azenbudsman/ O deputado Benedito Domingos (PP) retornou à Câmara Legislativa do Distrito Federal e não é mais o administrador de Taguatinga, como foi publicado sábado nesta coluna.


Créditos

Os parlamentares da Comissão Mista de Orçamento (CMO) estão em obstrução em protesto contra a retenção das compensações da Lei Kandir devidas aos estados exportadores. O governo pressiona a base governista na CMO a fim de garantir a aprovação de uma operação de crédito suplementar de R$ 4,9 bilhões para a capitalização do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

ALEXANDRE BARROS

Saudades de Itamar e Hargreaves


O Estado de S. Paulo - 15/09/2009

As acusações, tricas e futricas entre os poderosos dão-nos saudades do presidente Itamar Franco e de seu chefe da Casa Civil, Henrique Hargreaves.

Itamar chegou ao poder por acaso, com a queda de Fernando Collor de Mello. Era visto por muitos como insignificante e desastrado. Hargreaves era antigo funcionário da Câmara dos Deputados, famoso pelo conhecimento de leis fundamentais para o relacionamento do Executivo com o Congresso. Itamar levou-o para o Palácio.
Concentremo-nos em algumas atitudes da dupla, lembrando que o atual presidente do Senado se encastela para se defender de acusações que pipocam novas a cada semana e o atual presidente da República desafiou uma subordinada a provar alguma coisa contra a ministra-chefe da Casa Civil, como se a esta faltasse língua ou capacidade.
Ao assumir a Presidência, Itamar pediu a renúncia de todos os ministros, direito dele. A versão anedótica (que não é verdadeira, mas conto-a para ilustrar o fato) foi que, ao incluir os três ministros militares (Exército, Marinha e Aeronáutica - ainda não havia Ministério da Defesa) na troca, teria sido procurado por um alarmado Fernando Henrique Cardoso, perguntando-lhe se ia mesmo demitir os três ministros militares (o que Itamar fez). Itamar questionou: "Por que, Fernando, você está preocupado com eles?" Ao que este teria respondido: "Não, Itamar, estou preocupado com você!"
A cena não aconteceu. Conferi com as fontes. Mas a versão viveu na minha cabeça e ainda vive no imaginário de muitos observadores. Ela é significativa por expressar o susto dos observadores com a "audácia" de Itamar: pedir a renúncia dos ministros militares. Isso nunca tinha acontecido. Não foi audácia, foi apenas simplicidade e retidão. O presidente é dono de todos os cargos de ministro, e pediu-os. Os ministros militares em nada diferiam de seus colegas, exceto por usarem farda.
Foi o ato mais importante para restabelecer a primazia do poder civil no Brasil pós-regime militar.
O outro episódio tem mais que ver com a situação de hoje. Hargreaves, chefe da Casa Civil, foi acusado de algum ato ilícito e pediu para sair do cargo, a fim de não embaraçar seu chefe, o presidente.
Com a mesma singeleza com que pediu e recebeu os cargos dos ministros militares, Itamar anunciou publicamente as acusações contra Hargreaves e informou que ele seria afastado enquanto durassem as investigações. Concluídas estas, com a mesma singeleza Itamar anunciou que, como nada havia sido encontrado de ilegal ou desabonador no comportamento de Hargreaves, ele voltava à Chefia da Casa Civil.

As lições que ficam:

Negar repetidamente acusações que aparecem de todos os lados, numa democracia, não transforma mentiras em verdades de tanto repeti-las. Goebbels só conseguiu fazer isso porque o nazismo era uma ditadura.
Na democracia, mais importante do que defender-se ou a amigos, com retórica, é usar a luz do Sol como o melhor desinfetante. Richard Nixon e Bill Clinton foram punidos porque mentiram. John Dean, advogado da Casa Branca no período de Nixon, conta em seu livro Blind Ambition como a teia de trapalhadas e mentiras vai ficando cada vez mais espessa. Acabou na cadeia, com outros colegas de alto coturno. John Mitchell, ministro da Justiça de Nixon, foi condenado, preso e algemado e assim saiu de seu escritório rumo à prisão.
Precisamos de alguma regra, a ser estabelecida, não sei se por costume ou por lei, que defina a Presidência da República e o Supremo Tribunal Federal como cargos terminais. Depois deles, voltar à política partidária ou à banca privada não pode ser aceitável. Evita-se o espetáculo de um ex-presidente da República batendo boca no Senado, ainda que em sua defesa.
Presidentes não batem boca com subordinados, desafiando-os a provar isso ou aquilo, seja em defesa própria, seja em defesa dos aliados. Essa atitude não combina com a tal "liturgia do cargo", abusivamente citada. Quanto mais cresce a crise, menos "litúrgicas" ficam as atitudes de gregos e troianos.
Ex-presidentes e ex-ministros do STF precisam ter uma pensão decente para não terem desculpa para precisar voltar à política ou à banca - até hoje não sei se Itamar foi embaixador na Itália, na OEA e em Portugal porque precisava do salário ou porque Fernando Henrique o queria longe.
Ex-presidentes não ficam falando mal de seus sucessores. Eduardo VII, filho da rainha Vitória e rei da Inglaterra por pouco tempo, recebeu um pedido de clemência para um regicida, ao que respondeu: "Não posso perdoar as pessoas que matam os membros da minha profissão." De ex-presidentes se esperam bons exemplos e excelente comportamento.
Quando Hillary Clinton foi eleita senadora, um repórter perguntou ao ex-presidente Clinton se iria morar em Washington, ao que ele respondeu: "Depende de vocês (repórteres). Se ficarem me fazendo perguntas a toda hora sobre o atual governo, vou embora daqui" - não precisou esclarecer que não faz parte do comportamento de ex-presidentes ficar criticando os membros de sua profissão, nem dividindo as sociedades e politeias.
Finalmente, 5 e meia da manhã, inverno em Washington, um dia qualquer, muito frio, saída de passageiros internacionais do Aeroporto Dulles, na Virgínia, vi, acompanhado de uma ou duas de suas filhas, de roupa esporte, o ex-presidente Itamar Franco, em pé, perdido entre as pessoas comuns que esperavam amigos que chegavam. Hargreaves estava no voo. Tive o impulso de dizer a Itamar: "Bom dia, presidente, o dr. Hargreaves está na alfândega, mas deve sair já." Mas minha timidez me impediu.
Então, digo hoje: "Bom dia, presidente. O senhor, o dr. Hargreaves e seus exemplos deixaram saudades."

GOSTOSA


CONFIDENCIAL

A tecnologia é nossa

AZIZ AHMED

JORNAL DO COMMÉRCIO - 15/09/09



O petróleo é nosso. A tecnologia, também. Resultado de um acordo de cooperação tecnológica entre a Petrobras, a UFRJ e a multinacional Schlumberger, será construído um centro de pesquisa internacional para tecnologias do pré-sal, numa área de 8 mil metros quadrados, ao lado do Lab Oceano, da Coppe, no Rio. A instalação deste centro no Brasil é parte de uma estratégia da Petrobras de fomento à formação de um parque tecnológico de ponta que envolve a sinergia de três fatores: incremento da infraestrutura experimental da própria estatal, investimentos em universidades e institutos de pesquisa brasileiros para a construção de novos laboratórios de padrão internacional de excelência e atração de fornecedores estratégicos da estatal em atividades voltadas para o desenvolvimento de tecnologia. Com exceção de alguns poucos países desenvolvidos que souberam aproveitar a oportunidade, como a Noruega e a Inglaterra, quase todos os produtores de petróleo, como os países árabes, Venezuela e países da África, ficaram reféns de tecnologia importada e não dinamizaram suas economias: canalizaram suas ações exclusivamente na produção do petróleo.

A tecnologia é nossa - 2

A Noruega é exemplo típico de país que usou inteligentemente os recursos do petróleo. Investiu os recursos das exportações de óleo na formação de um parque tecnológico de alta qualidade e em indústrias fornecedoras de bens e serviços para a indústria do petróleo. Com isso, tornou-se o maior fornecedor mundial de bens e serviços para a área do petróleo e hoje ganha bilhões de dólares com a exportação de tecnologia, serviços e equipamentos para essa indústria. Não basta o Governo brasileiro exigir conteúdo nacional elevado na construção de plataformas para produzir petróleo. Para se tornar um país autossuficiente nessa indústria, tem que investir pesado em tecnologia. Se não o fizer, deixa a parte do leão para os grandes fornecedores internacionais e continua a ser fornecedor de chapas de aço e semimanufaturados. O pré-sal é oportunidade única para desenvolver uma indústria de base para a área do petróleo e qualificar o País como fornecedor internacional de tecnologia de ponta. Com esse desenvolvimento tecnológico e de uma indústria de fornecedores sólida, mesmo quando o petróleo acabar (e um dia vai acabar, ou será substituído por fontes de energia mais limpas) essas empresas e esse parque tecnológico estarão preparados para se tornar fornecedores para outros tipos de indústria que tenham alguma similaridade. A tecnologia de um setor quase invariavelmente pode ser ampliada, ou estendida para outros setores industriais. O importante é gerar inteligência. Esse parque, portanto, é o começo de uma opção inteligente do Brasil. Não seremos apenas um produtor e exportador de petróleo. Seremos produtores e exportadores de tecnologia de ponta.

Cartola feminina

Depois de atingirem a presidência em diversos países, e o governo em estados e prefeituras, as mulheres agora entram no campo esportivo. A nadadora olímpica e campeã sul-americana e pan-americana Patrícia Amorim, vereadora em terceiro mandato, lança-se hoje candidata à presidência do Flamengo, no Bar do Tom, no Leblon. Se eleita, será a primeira mulher cartola no futebol mundial.

O Galeão, outra vez, agradece

A partir de dezembro, a americana US Airways passará a operar no Galeão, com frequência diária para Filadélfia, fazendo escala em Charlotte. Engrossa, assim, a malha aérea internacional do aeroporto do Rio, em pleno voo de revitalização.

Os homens de preto

Aliás, a Base Aérea do Galeão reservou R$ 3,7 mil para a compra de oito ternos masculinos, oito calças, oito cintos de couro, oito gravatas e 16 camisas de manga longa. Tudo na cor preta (menos as camisas, brancas). O site Contas Abertas não descobriu quem vai usar as roupas.

Botando pilha na Presidência

A propósito, a Presidência da República mandou comprar 1,6 mil pilhas alcalinas tipo "AAA", tamanho palito de 1,5v. O lote custou R$ 1.408, segundo o Contas Abertas.

SEMEANDO. Com um balaio de projetos de parcerias nas mãos, o cônsul comercial e econômico da China, Gao Jin Bao, visita hoje a sede da Sociedade Nacional de Agricultura.

AGENDA. No próximo dia 22, a Assembléia Legislativa de Pernambuco realiza sessão solene para homenagear o ministro Marcos Vilaça "pelos 50 anos de relevantes serviços prestados" àquele estado.

BENJAMIN STEINBRUCH

Forte


Folha de S. Paulo - 15/09/2009



A atualização das Forças Armadas já vem tarde; o país precisa dela para assumir seu lugar de potência emergente



AS TENTATIVAS de equipar as Forças Armadas brasileiras já foram, no passado, motivo de pilhéria. A compra do porta-aviões Minas Gerais, por exemplo, no governo Juscelino Kubitscheck, inspirou até uma famosa música de Juca Chaves, nos anos 50. Esse assunto, porém, exige seriedade absoluta.
Um país continental como o Brasil, com enorme fronteira, grande parte na Amazônia, e com uma costa de 7.367 km de extensão, tem a obrigação de se armar, independentemente de projetos como o pré-sal. Na semana passada, em pleno Dia da Independência, o país ficou sabendo de um amplo acordo militar feito com a França. Os franceses fornecerão 50 helicópteros, 5 submarinos, inclusive um nuclear, e, possivelmente, 36 caças supersônicos.
Pelo que foi publicado, as compras brasileiras poderão atingir R$ 32 bilhões. Embora o negócio ainda não esteja fechado no caso dos caças, a informação da venda provocou um verdadeiro frenesi na imprensa francesa, porque a Dassault, fabricante dos aviões, depende muito desse negócio para manter sua operação.
Não tenho a pretensão de discutir escolhas de caças ou de qualquer outro equipamento militar. Essa decisão é técnica e cabe às Forças Armadas, que têm militares de alta patente muito bem qualificados. Por qualquer ângulo que se olhe, porém, fica claro que as aquisições anunciadas representam uma necessidade premente para o país.
É impossível manter a vigilância da enorme fronteira amazônica sem aviões que possam percorrer grandes distâncias rapidamente. Daí, a necessidade dos caças, cuja aquisição é uma novela que se arrasta há dez anos. Enquanto o assunto permanece sem solução, a FAB (Força Aérea Brasileira) tenta cumprir suas obrigações com uma frota obsoleta, com idade média de quase 40 anos -metade dos 700 aviões não pode levantar voo por falta de peças.
Também não há como proteger o mar territorial brasileiro, numa extensão de 4,5 milhões de km2, sem a incorporação de submarinos e a modernização geral da Marinha. As descobertas do pré-sal aumentaram as responsabilidades da Marinha na proteção de plataformas que custam bilhões de dólares.
Um país como o Brasil, historicamente pacífico, não se arma por razões bélicas. Deve fazê-lo, antes de tudo, para exercer sua natural posição hegemônica no continente latino-americano. O país está sendo diariamente chamado a assumir esse papel em casos que vão do manejo do complicado relacionamento entre Hugo Chávez e a Colômbia até o auxílio a outros países. O presidente Mauricio Funes, de El Salvador, por exemplo, esteve em Brasília para pedir um pacote de cooperação bilateral de US$ 800 milhões para a formulação do sistema de transporte urbano de seu país. Seria sinistro se um país em processo de ascensão a potência econômica não tomasse iniciativas para se tornar apto a defender seu próprio território. O Brasil deve apressar a modernização de seus equipamentos militares.
As Forças Armadas não são importantes apenas para a defesa. Elas auxiliam o país na formação de tecnologia e de pessoal especializado em áreas muito sensíveis. E exercem também um papel social, porque são grandes formadoras de jovens e bons cidadãos. A atualização das Forças Armadas, portanto, já vem tarde. O país precisa dessa modernização para assumir de fato a sua condição de potência emergente em todos os aspectos. Para ser grande é preciso pensar grande. E para ser forte lá fora é preciso ser forte aqui dentro.

MODERNIDADE


VINÍCIUS TORRES FREIRE

O sermão dos mercados


FOLHA DE S. PAULO - 15/09/09


Obama, nos EUA, e Sarkozy, na França, mordem e assopram mercados no aniversário da megalambança financeira


NO ANIVERSÁRIO simbólico da megalambança financeira, Barack Obama e Nicolas Sarkozy foram aos púlpitos presidenciais para fazer o sermão dos mercados. Obama pregou para os ouvidos de mercador de Wall Street. Queixou-se de que a banca faz lobby a fim de derrubar as conservadoras reformas das normas financeiras que seu governo propôs, logo essa banca que recebeu um monte de dinheiro para não ir à breca. Disse ainda que Wall Street tem a "obrigação" de contribuir para que a prosperidade econômica seja mais bem dividida.

Sarkozy queixou-se de que "a religião dos números" econômicos distorce a realidade do progresso social (ou da falta dele). Tal fetichismo, diz Sarkozy, seria no final das contas um "culto ao mercado". Sugeriu medir um "PIB da felicidade".

Em meio às salvas de canhão, ou melhor, de sermão, vinham as ressalvas. "Certamente não concorri à Presidência para salvar bancos ou para intervir nos mercados de capitais", disse Obama. "O mercado, no qual acredito, não é portador de sentido de responsabilidade, de projeto, de visão", assoprou Sarkozy. Enquanto isso, os mercados retornam, dia a dia, ao "business as usual".

A ira popular e populista contra banqueiros e cia. vai passando nos EUA. Não redundou em nenhum protesto político organizado contra o "modelo de negócios" americano. Pelo contrário. A conjunção da crítica popular ou populista ao pacote de saúde de Obama com o esfriamento da crise provocou na verdade uma onda de protestos contra o "socialismo" do presidente americano. Não que, obviamente, se esperasse uma revolta nos Estados Unidos.

Mas a contrarreforma da saúde ajudou a refrear impulsos críticos ao, vamos repetir, "modelo de negócios". Mesmo o desemprego alto não redundou em protesto público maior; duas décadas de alto nível de subemprego talvez crônico tenham acostumado os perdedores à precariedade. O alto nível de renda da maioria e a marginalização dos pobres, enfim uma minoria mesmo, ajudam a acalmar o ambiente. Cortes de impostos, subsídio ao consumo e outros gastos públicos, além da doação de dinheiro à banca, atenuaram a crise e algum impulso crítico residual.

Na Europa, os seguros oferecidos pelo Estado (sociais, ao mercado etc.), o também alto padrão de vida etc., amorteceram a crise em ambientes politicamente mais carregados, o caso exemplar sendo a França. Nem "maus exemplo de fora houve". Não há "clamor das ruas" por mudanças. Mais da metade dos parlamentares democratas é mais conservadora do que Obama.

O debate nas elites políticas, sociais e intelectuais, ou ao menos do que disso escorre para a mídia, é tão bitolado pelo pensamento dominante nas duas últimas décadas que economistas convencionais como Paul Krugman, são tidos quase como radicais perigosos. Mas tais elites viram que o caldo engrossou em setembro de 2008 e querem consertar os encanamentos, mas não mudar de casa. Haverá mudanças apenas se a casa voltar a pegar fogo; e caso falte água nos hidrantes.

Foi nesse ambiente que Obama e Sarkozy fizeram seus "sermões de saída" da crise, com o recado: "Ok, Wall Street, vocês vão vencer de novo. Mas não esculachem".

ARI CUNHA

Mudanças no Rio


CORREIO BRAZILIENSE - 15/09/09


Pior problema para o Rio tem sido o transporte público. Governador Sérgio Cabral entra de rijo no assunto. Licitou 462 vans que substituirão o transporte alternativo. Impor ordem nos transportes é decisão do governador. É de ver que o Rio vive estado de exceção com a luta entre tóxico e administração. Por fora, o povo luta por melhoras para chegar ao emprego e voltar para casa depois da cansativa fase de trabalho. Decisão do governador será mantida dentro do clima de ordem. Para tanto, esquema está formado e a disposição é manter luta contra os protestos que sempre aparecem nesses momentos. População aplaude decisão. Natural que mantenha reservas. É que a cidade é explosiva em qualquer decisão que seja tomada. Difícil não haver duas opiniões. Agora é administrar.


A frase que não foi pronunciada

“Só o tempo é capaz de proporcionar um final perfeito.”
» Alguém pensando no futuro.



No ralo

» Dinheiro da saúde está no ralo em 16 estados. Diz ministro José Gomes Temporão que buracos na lei fizeram com que essas verbas fossem usadas em outras chancelas. Estranha patriotismo dos governadores com o desvio de verbas quando o país enfrenta crise de saúde universal.

Novidade

» Depois dos restaurantes, locais de trabalho e shoppings, agora é a vez dos hotéis. Passa por discussão na Comissão de Assuntos Sociais a obrigatoriedade de hotéis reservarem 50% de quartos para não fumantes.

Echo

» Cada vez vale menos produzir no Brasil. A nova lei dos sacoleiros legaliza a situação da muamba. Os produtos nacionais perdem e os consumidores se preparam para pagar menos por produtos de qualidade duvidosa.

Economia

» Em movimento espontâneo, o brasileiro investiu R$ 500 bilhões em compras. Foi a libertação da crise econômica. A notícia agradou em cheio ao presidente Lula da Silva e sua equipe, que confiava no futuro do país. Para isso, o governo abriu mão de impostos para salvar empresas, como no setor automobilístico.

Conferência

» Conhecedor do povo do mundo, entendendo das épocas que transformaram a humanidade, William Carvalho, presidente da Associação Brasileira de Opinião Pública, é entrevistado pela TV Senado. Helival Rios e David Emerich levaram as questões durante longo tempo. Foi marco para a TV do Senado.

Dez cearenses

» Empresa PPE liderada por Roberto Farias selecionou os “Dez cearenses da época”. Os vencedores da década escolhidos pelos internautas e 5l formadores de opinião são: Yolanda Queiroz, Ivens Dias Branco, César Rocha, Ubiratan Aguiar, Beto Studart, Tom Cavalcante, Cid Gomes, Tasso Jereissati, Deusmar Queiroz e Ciro Gomes. Foram homenageados numa recepção no La Maison Buffet.

Educar

» Escola que Protege é um programa do Ministério da Educação que vai distribuir entre universidades de 13 estados R$ 2 milhões para qualificar profissionais da educação a identificar e reduzir a violência nas escolas. Esse é um problema atrapalhado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Se o estatuto punisse exemplarmente, a violência diminuiria.

Ainda ECA

» A situação do Estatuto da Criança e do Adolescente está tão séria que a Comissão de Seguridade e Família da Câmara dos Deputados vai discutir o assunto na comemoração de 19 anos do documento. Hoje, às 14h30, no plenário 7.

Barrichello

» Piloto brasileiro ganha a corrida de Fórmula Um. Usa tecnologia, de forma que fez apenas uma parada. Entusiasmou o Brasil, que está vencendo em vários esportes no exterior.


História de Brasília

O carrinho Volkswagen chapa-branca, cinza, 21-14, está usando indevidamente uma sirene semelhante às das ambulâncias do Hospital Distrital. É o abuso do privilégio, numa situação impossível. (Publicado em 9/2/1961)

GOSTOSA


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ELIANE CANTANHÊDE

Dia de festa

FOLHA DE SÃO PAULO - 15/09/09


BRASÍLIA - Hoje, a quebra do Lehman Brothers completa um ano. Ou seja, é o dia do aniversário da fase aguda da crise econômica global e, por tabela, brasileira.
Lula, que foi tão criticado e até ironizado por dizer que aqui não haveria tsunami, só "marolinha", vai comemorar em grande estilo e, de preferência, com grande audiência. Afinal, o Brasil não chegou ao fundo do poço e voltou à tona antes do previsto.
A perspectiva de retração de até 3% foi trocada por uma expectativa de crescimento de até 1%, empurrada pela boa surpresa do PIB do segundo trimestre, melhor do que tanto o governo quanto o mercado esperavam. O Brasil já saiu da recessão técnica. Lulinha Paz e Amor não deixaria isso barato, não é?
Ele, Guido Mantega (Fazenda) e Henrique Meirelles (BC) vão participar e falar na reunião do chamado "Conselhão", o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, no Itamaraty. Para bater bumbo, evidentemente. Na plateia, estarão grandes empresários e sindicalistas do país, sob flashes.
A festa que é de Lula será, naturalmente, também de sua candidata, Dilma Rousseff, que anda precisando mesmo de uma forcinha, depois de ter estacionado nas últimas pesquisas e aguardar ansiosamente pelas próximas para saber se é ou não uma tendência.
O governo acha que está saindo de um mau momento e quer puxar junto a sua candidata, que anda numa fase ruim, ou pelo menos desanimada, não só pelas pesquisas, mas pelo carimbo de "mentirosa" depois das histórias de Lina Vieira e do diploma inflado, e pela imagem de "gritalhona", depois que mais um episódio constrangedor foi à tona: o do secretário-geral do Ministério da Integração, humilhado numa reunião.
Lula e Dilma, portanto, vão ter hoje um grande dia, em meio à enxurrada de propaganda subliminar que já circula nas TVs.

DIRETO DA FONTE

Morte da crise anunciada?

SONIA RACY

O ESTADO DE SÃO PAULO - 15/09/09


Faz hoje um ano que a Lehman Brothers quebrou. Tudo parece ter melhorado, mas ainda estão no papel as propostas efetivas de regulação bancária do primeiro mundo. Desde o início deste ano, a contribuição do Conselho de Recuperação Econômica montado por Obama - captaneado pelo ex-Fed Paul Volcker e do qual faz parte ativa Armínio Fraga - dorme em berço esplêndido em Washington. Preocupante? Isto não tira o sono de Fabio Barbosa, dirigente da federação de bancos no Brasil, a Febraban. "As propostas já andaram, alguma coisa está sendo definida e com certeza não mais veremos os índices de alavancagem que algumas instituições do sistema financeiro praticavam, e que representavam um grande risco", disse ontem à coluna.

A crise acabou? Claramente, a situação mundial melhorou muito, especialmente nos últimos meses. Havia o receio de entrarmos em uma depressão, e para evitá-la, houve a mobilização de gigantescas quantias de dinheiro público que conseguiu reverter a tendência negativa da economia mundial. Ainda é cedo para dizermos que acabou a crise, mas o quadro já é melhor.

O problema internacional dos bancos foi amenizado, mas ainda não está sanado. Há perigo de um novo ciclo de inadimplência lá fora? Ela começaria desta vez pelas empresas afetando os bancos? A base de tudo será a recuperação da economia. Se ela prosseguir no ritmo atual, o próprio risco de inadimplência por parte das empresas ficará menor.

Se a crise se der mesmo em formato de W, como prevê Nouriel Roubini, como ela chegará no Brasil ? Risco de um W, sempre há. E não preciso dizer que seria ruim. Vejo porém, que muitos recursos pelo mundo afora estão sendo mobilizados para que isso não aconteça.



Pena branca

Quem quer peito, vai ter que levar pescoço.
É o caso do Fri-Boi, que para financiar a compra do Pilgrim"s, maior frigorífico de frangos do EUA, terá que levar o Bertin.


Martelo batido

Lula, filho do Brasil será lançado oficialmente no Festival de Cinema de Brasília, que será em novembro.

Obama Silva


Mas Lula não será o único presidente brasileiro nos cinemas em 2010.
Graças a parceria fechada com a Petrobras, sai da película para a tela o longa Segurança Nacional, história tipo James Bond sobre um presidente negro que tenta salvar a Amazônia.
Estrelado por Milton Gonçalves, a produção assinada por Jose Bonifácio Sobrinho, o Boni, conseguiu feito inédito: a autorização para gravar cenas dentro do Aero-Lula.


Esqueceram Nélida

Muito amiga de Clarice Lispector, Nélida Piñon queria participar da exposição Clarice Pintora, no Rio.
È que nos anos 70, Clarice deu de presente à escritora um de seus quadros - que ficou de fora da mostra.


Blue Eyes


A francesa Isabelle Hupert não é das mais simpáticas. O único "bem-amado" que conseguiu estabelecer conversa mais longa com a diva - depois da estreia de seu espetáculo, sexta-feira - foi Bruno Barreto.


Eterna


Dercy Gonçalves acaba de entrar para o Guinness Book por ter participado de um filme aos 101 anos, o Nossa Vida Não Cabe Num Opala.
Também foi reconhecida por ser a atriz que viva, mais trabalhou.


R$ 700 milhões, cada

A Cemig não conseguiu entrar em São Paulo por meio da Cesp. Mas tenta entrar no Rio pela Light.
Negocia com o Pactual/UBS e com a Andrade Gutierrez suas participações por R$ 700 milhões cada. Se comprar ambas, terá 50% da empresa. A ex-estatal pode virar estatal de novo? Pelas atuais regras do acordo de acionistas...não.

Luzes 2

Mas por que Andrade e Pactual gostariam de vender suas participações tão lucrativas? Pelo que se apurou, a Andrade quer $$$ para comprar a parte da AES na Cemig. E o Pactual pretende pagar sócios do banco que querem sair.
Elementar, Watson


Hermes aterrissa no Brasil


Após um namoro de dez anos, a Hermès inaugurou sua primeira filial no Brasil, anteontem, no Cidade Jardim. Com direito a circo armado no corredor do shopping, malabaristas, mímicos e trapezistas - todos devidamente vestidos de laranja, a cor oficial da marca, criada em 1837 - davam boas-vindas aos convidados.
Na comitiva de 8 pessoas, entre profissionais e membros da família, Pascale Mussard, diretora artísta do grupo, contava que sua aposta é grande no País. Tanto assim, que definiram trazer todas 14 famílias de produtos. "Incluindo as Birkins e Kellys", revelou à coluna, referindo-se às bolsas feitas artesanalmente por uma só pessoa do começo ao fim. Preço? Não saem por menos de 4 mil euros. Justificativa? " Elas duram para sempre", conta Pascale.
Antes da abertura da loja, um pequeno grupo foi recepcionado por Zeco Auriemo, responsável pela vinda da marca. E ouviu de Patrick Thomas, CEO da Hermès, que o Brasil é parte da empresa há tempo. "As sedas usadas nas nossas gravatas são produzidas no Mato Grosso e Paraná."
O curioso é que entre as tops do luxo, a Hermès é praticamente a única que não foi absorvida, até agora, por um conglomerado, como foi a Gucci, o Valentino, a Prada. Continua nas mãos da mesma família e não há intenção de transformar este "artesanato" em produção multiglobal.''Esta nunca foi a nossa filosofia'', justifica Pascale.
E para muitos que por lá passaram - a loja lotou completamente - a festa só não foi melhor porque... não puderam tirar seus cartões e comprar. As vendas e reservas estavam vetadas até ontem.
Um dos poucos percalços da tarde se deu por causa de um pônei. O animal, que por ali passeava, não conseguiu achar o toilette.


Na Frente


Paulo Skaf, candidatíssimo, foi fazer campanha fora do Brasil no fim de semana. Esteve na Casa Branca articulando a visita de uma missão empresarial brasileira a Obama.

Isay Weinfeld está impossível. Recebeu elogio gigante de Pascale Mussard, da Hermès. Autor do projeto do Hotel Fasano, ela lhe disse que o Hotel, a exemplo da marca Hermès, durará mais de 100 anos.

Amir Slama e Isabela Capeto são novos parceiros da C&A.

Será sexta a inauguração do Centro Ruth Cardoso em São Paulo. O espaço, na Pamplona, vai centralizar todas as organizações criada pela socióloga.

Ana Lucia Serra e Carlos Domingos comemoram os dez anos da Age, hoje. Na Livraria da Vila do Cidade Jardim.

A casa da galerista Luciana Brito é o palco do desfile, hoje, da Maria Bonita Extra.

Claudia Natividade e Marcos Jorge partem para Los Angeles, em outubro. Vão negocioar o remake do longa Estômago para o mercado americano

Em comemoração ao Dia do Médico, George Schahin, do Hospital Santa Paula, recebe seu corpo clínico no Leopoldina da Daslu. Em 16 de outubro.

Com vernissage na quinta, Raquel Kogan monta instalação interativa na Baró Cruz.

O escritor israelense David Grossman lança o seu novo livro, A Mulher Foge, amanhã, no Centro da Cultura Judaica.

A Jazz Sinfônica é a primeira atração do soft opening do Teatro Bradesco, na terça. No dia seguinte, é a vez de Maria Rita subir ao palco. No Boubon Shopping, com entrada franca.


O Botafogo convocou um reforço de peso para fugir da segunda divisão. Desde a semana passada, uma Nossa Senhora Aparecida olha fixo, para o campo. Sentada no vestiário.

GOSTOSA DO TEMPO ANTIGO


MAURO DE REZENDE LOPES

Produtores endividados e associações

O ESTADO DE SÃO PAULO - 15/09/09


O individualismo no meio rural tem sido um problema na agricultura brasileira. Impede a formação de associações, consórcios e condomínios agrários, cooperativas para obter a redução de preços de insumos e para a venda de produtos. Isso é tão óbvio que dispensa comentários. Endividados, os produtores não têm acesso a crédito. Mas, associados, é possível levantar recursos para comprar insumos com desconto. Melhor: podem vender em grupo, formando lotes maiores e ganhando um pouco mais.

Para entendermos bem o que passa na "cabeça" dos produtores nas comunidades do agronegócio, conduzimos uma pesquisa com cerca de 150 produtores e dirigentes dos elos das cadeias do agronegócio, por meio da aplicação de um questionário para identificar os fatores que facilitam e os que dificultam as associações e parcerias entre produtores.

No questionário, pedimos que os entrevistados dessem uma nota de 1 a 10 - 1, para a importância menor desses fatores, e 10, para a importância maior. Os entrevistados deram notas de acordo com a percepção que tinham desses fatores dentro das comunidades onde viviam. Participaram da pesquisa dirigentes do agronegócio de vários Estados do País.

Os resultados sobre os fatores que facilitam a associação de negócios nas comunidades do agro brasileiro (com as respectivas médias das notas entre parêntesis) indicam que os membros da comunidade de negócios: não têm dificuldade de encontrar parceiros (8,04); não têm comportamento individualista ou isolacionista e se associam frequentemente (7,89); têm a capacidade de antever um novo negócio que exigirá esforço, mas é possível alinhá-lo com as suas habilidades (7,93); têm poder de influência sobre a comunidade de negócios na região (7,52); não só percebem oportunidades, mas também agem para aproveitá-las (8,11); não estão na "área de conforto" ou "não ligam o piloto automático" (8,30); e ouvem outros empresários e parceiros com a mente aberta (8,07). Além de surpreenderem por aspectos tais como o que dizem aos potenciais parceiros - "se você iniciar um negócio, quero que me inclua" (7,67) - e por manterem sempre na memória as vezes em que foram bem-sucedidos nas parcerias (7,56).

Os fatores mais importantes que dificultam o associativismo, dentro das características dos membros das comunidades do agro brasileiro, foram: não têm condição de fazer uma análise de riscos competente no projeto (8,19); não acreditam que um bom projeto viabilize recursos, acham que o recurso é que faz o projeto, e não o projeto que faz o recurso (7,85); receiam o risco de falta de uniformidade de pontos de vista entre os parceiros (7,07); não buscam novas oportunidades de negócios; estão à vontade com o empreendimento atual (7,05); acreditam que não têm segurança financeira para um novo negócio; e não valorizam relações empresariais, mas sim relações com o governo, na ideia de que só o "governo salva" (7,56).

A conclusão a que se chega é de que é preciso trabalhar esses fatores. Identificá-los é importante para saber por onde começar o trabalho de preparação dos produtores para arranjos societários entre seus pares. O associativismo de resultado já está aparecendo no meio rural.

Há neste meio vários grupos de produtores endividados que se associaram para criar uma pequena cooperativa e obter redução de custos. Existem pelo menos três no Estado de Goiás e mais alguns nos Estados do Sul. Há um grupo muito bem-sucedido em Goiás, em que os produtores endividados se associaram. Os líderes levaram cerca de quatro anos para convencer os vizinhos de três cidades próximas a trabalharem construtivamente suas diferenças. O começo foi bastante difícil. Hoje, uma pequena cooperativa soma 14 núcleos de 2 a 3 produtores e seus sócios que compram em conjunto. O grupo logrou obter reduções da ordem de 5% a 12% nos preços dos fertilizantes e defensivos. Com o tempo, conseguiram reduções muito elevadas, depois de a cooperativa se associar a uma grande cooperativa. As reduções de preços atingiram 15% em defensivos e 20% em fertilizantes.

Em viagem ao interior, vimos que os produtores estão mudando sua maneira de pensar. Alguns depoimentos demonstram isso: "O que podemos fazer juntos que é melhor do que separados?"; "A minha prosperidade depende da prosperidade do meu vizinho"; e "O meu problema está da porteira da fazenda para fora: eu tenho que me associar." As coisas estão mudando.

*Mauro de Rezende Lopes
é pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia, da FGV
E-mail: mrlopes@fgv.br

O colunista Celso Ming está em férias.

TODA MÍDIA

Discurso afinado?

NELSON DE SÁ

FOLHA DE SÃO PAULO - 15/09/09



Na Folha Online, "Serra e Aécio demonstram união e desconversam sobre chapa pura". No site de "O Estado de S. Paulo", "afinam discurso e criticam Lula". Mais precisamente, atacam a "volúpia arrecadatória" ou a "volúpia centralizadora", em "referência ao apetite da União na arrecadação de impostos". FHC "fez coro aos dois".

Por outro lado, o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, que defende a "redução da carga tributária empresarial" e sempre questionou Lula, divulgou estudo com números diversos, desta vez. Com maior destaque nos dois sites, manchete inclusive, "Carga tributária cai e fica em 36% do PIB".
E diz o presidente do IBPT que "houve crescimento nominal da arrecadação porque só a União promoveu medidas de desoneração. Os Estados nada fizeram para auxiliar a sociedade no combate à crise".

EM ALTA
No alto das buscas de Brasil o dia todo, com Bloomberg, "PIB vai crescer este ano e saltar 5% em 2010, diz Credit Suisse". Antes, o banco previa contração. No segundo destaque das buscas, o mercado "aposta que crescimento não vai estimular inflação".

EM ALTA DE 100%
Nas manchetes de UOL, Valor Online etc. no fim do dia, "Bolsa fecha em alta e já sobe mais de 100% em menos de um ano". No site do "Wall Street Journal", o avanço da Bovespa e do real era creditado ao aumento no "fluxo de fundos estrangeiros".

DOS EMPREGOS À POUPANÇA
Lula falou às rádios de Roraima e foi parar nas manchetes da Folha Online ao Terra no final da tarde, "Brasil gerou 150 mil novos empregos em agosto".
Mas veio o "Jornal Nacional" e encerrou as boas notícias todas, com a manchete "Investidores aumentam os depósitos nas cadernetas de poupança e o governo propõe taxar as aplicações acima de R$ 50 mil".

DEU NA "FOLHA DE BOA VISTA"
Segundo o Blog do Planalto, Lula deu 187 entrevistas em 2009, até sexta, contra o total de 182 em 2008.
E ontem ele falou com exclusividade à "Folha de Boa Vista", que o questionou sobre a Venezuela no Mercosul. Ecoou mundo afora, por agências, a resposta de que o Senado vai aprovar a entrada de Hugo Chávez.

FORA DA ONU
Em destaque nos sites brasileiros e pelas agências, "Brasil pressiona e embaixador de Honduras é expulso de sessão da ONU". Na Reuters, "Enviado de Honduras diz ter sido expulso de órgão da ONU", sob acusação de representar um governo "ilegal".

E DA EUROPA
Na manchete global do "El País", "Espanha proíbe a entrada no país de representantes do governo "de facto" hondurenho". Acrescenta depois que "a União Europeia aprovará [hoje] uma declaração em defesa da ordem constitucional em Honduras".

"CLARÍN" DERRUBA TELES
No alto da home do argentino "Clarín", "Cristina volta atrás na permissão para telefônicas na TV a cabo", no projeto de Lei dos Meios de Comunicação. Era a principal medida de "desconcentração" do setor no país, que tem no "Clarín" seu "principal grupo de mídia".

GOOGLE DOMINA BRASIL
Ontem em enunciado do "New York Times", "Onde o Google é realmente grande: Índia e Brasil", apresentados como "dois dos mercados de maior crescimento" mundial. E no "press release" da empresa de medição ComScore, postado por Yahoo e Reuters, "Google domina a paisagem de internet na Índia e no Brasil".
Segundo o levantamento, nos dois países, para cada hora que os internautas gastam on-line, 18 minutos são voltados a sites do Google. Entre eles, o Orkut, a principal rede social em ambos -e apenas neles.
"Mas o Orkut é só parte da história", sublinha o "NYT". O Google responde, por exemplo, por 90% das buscas no Brasil, 88% na Índia. YouTube, Google Maps, Blogger e Gmail são dominantes, em suas faixas.

SEM CONFIANÇA
Ontem o "NYT" e o "Washington Post", entre outros jornais, noticiaram que nos EUA a "confiança na mídia noticiosa caiu para novo recorde de baixa". A pesquisa Pew mostrou que, para 74%, as organizações jornalísticas favorecem um lado ou outro na cobertura política.

DESNECESSÁRIA
Para o colunista de mídia do "WP", Howard Kurtz, o episódio em que um âncora da Fox News, o popularesco Glenn Beck, abriu campanha e derrubou um assessor de Obama mostra que a "mídia estabelecida" não é mais necessária como "intermediária" nas intervenções políticas.

GOSTOSA


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PAULO GUSTAVO GUEDES FONTES

Véu islâmico, laicidade e liberdade religiosa

FOLHA DE SÃO PAULO - 15/09/09


Laicismo é uma deturpação da laicidade. Ele perde de vista a liberdade religiosa e quer impor à população uma forma de secularização



DEPOIS DE provocar muita polêmica em 2004, quando seu uso foi proibido nas escolas públicas francesas, o véu islâmico voltou a agitar a política da França e da Europa neste ano.
No último dia 22 de junho, o presidente francês, Nicolas Sarkozy, manifestou aos deputados e senadores da França o seu repúdio ao uso da burca e do chador e seu apoio a eventual ato legislativo que pretenda proibi-los no território francês. (A burca e o chador nada mais são do que a versão mais fechada do véu islâmico.)
Sarkozy afirmou, na ocasião, que a questão não teria caráter religioso, mas diria respeito à igualdade entre homens e mulheres. Para o presidente francês, a burca é um signo de submissão das mulheres.
Nessa mesma linha, em 4 de dezembro de 2008, a Corte Europeia dos Direitos Humanos, sediada em Estrasburgo, considerou justificada a expulsão de duas alunas muçulmanas de uma escola pública francesa por terem se recusado a retirar o véu nas aulas de educação física. Aquela corte entendeu que não houve desrespeito à liberdade religiosa.
Contudo, tais medidas podem, sim, ferir gravemente a liberdade de crença e de religião. É compreensível que se proíba o uso de signos religiosos pelos representantes do Estado, como juízes, policiais ou mesmo professores de escolas públicas. Mas que tal proibição atinja o próprio cidadão na sua vida privada, isso constitui uma deturpação do princípio da laicidade.
Não se pode entender a laicidade do Estado sem referência à liberdade religiosa. É a outra face da moeda.
Por que razão o Estado deve ser laico? Porque, representando todos os cidadãos, não poderia abraçar uma opção religiosa sem alienar dessa representação os cidadãos de outra crença ou mesmo os que não professem religião alguma. Assim, a liberdade de religião, aliada a uma nova concepção do Estado e da igualdade, está na origem da laicidade.
De qualquer forma, é aos agentes e funcionários do Estado que o princípio da laicidade se dirige, vedando que expressem, no exercício da função pública, suas preferências religiosas. Os edifícios públicos, da mesma maneira, deveriam manifestar essa neutralidade diante da religião.
A laicidade é exigida sempre do Estado, nunca do cidadão, do particular, para o qual vale a liberdade de professar qualquer crença ou religião. A menina que vai à escola francesa não representa o Estado. É para que os cidadãos possam usar crucifixos, véus ou quaisquer signos religiosos que o Estado se laicizou, que se tornou neutro diante da opção religiosa.
Vedar à jovem o uso do véu islâmico, mesmo na escola pública, é violentar sua liberdade religiosa, mormente pela importância que essa questão tem para as mulheres muçulmanas.
Vedar o seu uso no território de um país é medida que remete às guerras de religião.
O que tem sido professado na França é uma deturpação da laicidade, o laicismo, versão militante daquela.
Ele perde de vista a liberdade religiosa e quer impor à população uma forma de secularização.
Norberto Bobbio estabelece essa distinção. Para ele, a laicidade, ou o espírito laico, não é em si uma nova cultura, mas uma condição de convivência de todas as possíveis culturas.
Por outro lado, assevera que o laicismo que "necessite armar-se e organizar-se corre o risco de converter-se numa igreja em oposição às demais".
Por fim, parece igualmente autoritário o argumento de Sarkozy de que a proibição visaria à igualdade entre homens e mulheres.
Ainda que se considere o véu islâmico incompatível, mormente na forma da burca, com a visão que temos da mulher no Ocidente, ele é certamente um signo religioso.
Se uma mulher oculta seu rosto e cabelos -ou o corpo inteiro- por respeito à religião ou se o faz por medo do marido ou do militante islâmico do bairro, só ela pode saber.
Na dúvida, para não ferir algo tão íntimo e inviolável quanto a liberdade de crença e de religião e para não retrocedermos alguns séculos, é melhor deixar que ela retire o seu véu espontaneamente, convencida que venha a ser disso pela cultura ocidental da igualdade, da liberdade e da fraternidade -que costumavam ser a divisa dos franceses.

PAULO GUSTAVO GUEDES FONTES , mestre direito público pela Universidade de Toulouse (França), é procurador da República em Sergipe.

ARNALDO JABOR

Barbinhas ralas e bigodinhos verticais

O GLOBO - 15/09/09

Quero ser feliz. Para isso, preciso de modelos. Há os livros de auto-ajuda, há a felicidade oficial da "mídia". Quero ser feliz e nas revistas vejo os ídolos modernos malhados, todos sedutores e comedores com a barbinha mal feita de propósito ("six o"clock shave") pegando as "modeletes" - todas rapadinhas com seus bigodinhos de Hitler no púbis (Brazilian Wax). Barbinhas ralas e bigodinhos verticais são a última moda importada de NY para os garanhõezinhos e namoradas chiques.

Não estou criticando isso; estou é com inveja desta ligeireza, tenho inveja da mediocridade dos objetivos. No Brasil de hoje, a burrice é uma benção. Os homens-celebridades estão cada vez mais seguros de seus haréns, as mulheres mais belas. No entanto, velho romântico, penso: e a conversa de depois? Como manter aquela energia narcisista? Meu avô uma vez me gozou: "Quer namorada inteligente? Vai namorar o San Tiago Dantas... (intelectual da época)".

Quero ser feliz modernamente, mas carrego comigo lentidões, traumas, conflitos. Sinto-me aquém dos felizes de hoje. Não consigo me enquadrar nos rituais de prazer das revistas. Posso ter uma crise de depressão em meio a uma orgia.

Fui educado por jesuítas e pai severo, para quem o riso era um pecado; ensinaram-me que a felicidade era uma missão a ser cumprida, a conquista de algo maior, que nos coroasse de louros. A felicidade demandava sacrifício, uma luta sobre obstáculos. Olhando os retratos antigos, vemos que a felicidade masculina estava ligada à ideia de "dignidade", de vitória de um projeto de poder. Vemos os barbudos do século 19 de nariz empinado, os perfis de medalha, donos de um poder qualquer nem que fosse no lar, sobre a mulher e filhos aterrorizados.

Mas eu queria ser mais livre, menos vergado ao peso de tanta responsabilidade severa.

Por isso, quando cheguei aos vinte anos, meu ídolo passou a ser o James Bond: bonito, corajoso, entendendo de vinhos e de aviões supersônicos, comendo todo mundo, de smoking. Ele era livre e mundano? Sim, mas mesmo o James Bond se esforçava, pois tinha a missão de "salvar o mundo". Era um trabalhador incansável que merecia as louras que papava. Hoje, não. Nossos heróis masculinos não trabalham ou ostentam uma "allure" ociosa e cínica.

A mídia nos ensina que os heróis da felicidade não têm ideal algum a conquistar, a não ser eles mesmos. A felicidade é uma construção de bom funcionamento, de desempenho. O ideal de felicidade é o brilho do prazer sem conflitos, sem afetos profundos - todos sorridentes e simpáticos, porque é mais "comercial" ser alegre do que os velhos heróis que carregavam a dor do mundo. O herói feliz passa a ideia de que não precisa de ninguém. Para o herói da mídia o mundo é um grande pudim a ser comido. Sem compromissos, ele quer sexo e amor, sem amar ninguém. Há um "donjuanismo" consentido, pois as mulheres não defendem mais virtudes castas ao contrario, cada vez mais imitam o comportamento deles. Desejam ser "coisas" se amando. Assim como a mulher deseja ser um "avião", uma máquina peituda, bunduda, sexy, o homem também quer ser uma metralhadora, uma Ferrari, um torpedo inteligente e, mais que tudo, um grande pênis voador, super-potente, frívolo, que pousa e voa de novo, sem flacidez e sem angustias. O encontro humano virou um modelo de armar, um "lego" de carne. O herói macho A se encaixa em heroína fêmea B e produzem uma engrenagem C, repleta de luxo e arrepios entre lanchas e caipirinhas, entre jet skis e BMWs, num esfuziante casamento que dura, no máximo, três capas de "Caras".

E de tudo isso emana uma estranha "profundidade superficial" (desculpem o oxímoro), porque este diletantismo raso tem o charme de ser uma sabedoria elegante e "contemporânea

Meu homem é antes de tudo um forte, mas um negador. Para ser feliz, precisa negar, renegar problemas, esquecer, não lembrar das tristezas do mundo. Sua receita de felicidade: não pensar em doenças, ignorar o inconsciente, lamentar a miséria sem nada fazer por ela. O macho brasileiro tem pavor de ser possuído ou tomado pela fraqueza da paixão. Não há entrega; basta-lhe o encaixe.

Meu homem moderno almeja orgasmos longos, ereções vítreas sem trêmulas meias-bombas, meu homem feliz quer ser malhado e esportivo, se bem que informado e cínico, meu homem conhece bem as tragédias modernas, mas se lixa para elas, não por maldade, mas por um alegre desencanto.

Meu homem vive em velocidade. O mundo da internet, do celular, do mercado financeiro imprimiu seu ritmo nele, dando-lhe o glamour de um funcionamento sem corrosão, sem desgaste de material, uma eterna juventude que afasta a idéia de morte ou velhice. Felicidade é um videoclipe; angustia é Antonioni.

Assim, meu homem feliz é casado consigo mesmo.

Mas, chega um dia em que o herói deprime, um dia em que a barriga cresce, o amargor torce-lhe os lábios, o "passaralho" cai e o homem feliz percebe que também precisa de um ideal de encontro, de algo semelhante à tal velha felicidade.

Ele começa a perceber, confusamente, que a verdadeira solidão é apavorante. Daí, ele faz tudo para evitar a ideia de morte, de fim, senão sua liberdade ficaria insuportável.

Com a idade, ele percebe que não há apoteose na vida. Nada se fechará numa plenitude, nada se resolverá inteiramente.

Daí, ele passa a viver um paradoxo: ligar-se sem ligar-se. Ele percebe que precisa do amor ou do casamento ou de mais poder como uma "esperança de sentido".

Aí, sua tentativa de felicidade fica "em rodízio", como em uma churrascaria: amor, poder, sexo. Em vez de se conformar com esta mutação sem finalidade, ele tenta satisfazer-se numa eterna insatisfação. Como um James Bond fracassado, como um Tom Cruise envelhecido que jamais perde a pose. Nem para si mesmo. E se gasta nesta "Missão Impossível".

NO ALVO

MERVAL PEREIRA

A indústria bélica

O GLOBO - 15/09/09


A questão do reaparelhamento das Forças Armadas, abordada nas colunas do fim de semana, com base nos acordos já firmados com o governo da França para adquirir helicópteros e submarinos, e a licitação dos novos caças, que parece estar definida a favor dos Rafale franceses — mas que continua teoricamente em aberto para que os governos de Estados Unidos e Suécia possam melhorar suas ofertas, especialmente no que se refere à transferência de tecnologia —, atraiu grande atenção dos leitores.

Utilizo a mensagem do engenheiro Eduardo Siqueira Brick, coordenador adjunto do Núcleo de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (Nest/UFF), especializado em Ciência, Tecnologia e Informação (CT&I) e Indústria de Defesa, para representar a massa de comentários recebida.

Hoje vou abordar aspectos da criação do complexo industrialmilitar prevista na reformulação da Estratégia Nacional de Defesa (END) que está sendo elaborada pelo Ministério da Defesa. A questão da transferência de tecnologia fica para outra coluna.

Segundo Eduardo Brick, quando se trata da Base Industrial de Defesa (BID), existem cinco componentes que apresentam aspectos distintos, mas que interagem com grande intensidade: a) A infraestrutura industrial da defesa: empresas e organizações envolvidas no desenvolvimento e fabricação de produtos de defesa.

Um ponto fundamental seria a definição do que é empresa brasileira para fins de defesa, pois, segundo Brick, se a lei não mudar rapidamente, todas as empresas brasileiras existentes serão adquiridas por grandes empresas estrangeiras.

Entretanto, para ele falta definir a parte mais importante: a existência de recursos no orçamento de forma continuada para dar sustentação a essa indústria. “Já tivemos essa experiência no passado. Desenvolvemos uma indústria de defesa, não muito sofisticada, que sobreviveu principalmente das vendas para o exterior. O Brasil nunca garantiu a existência dessas empresas. Sem isso, todo o esforço que agora está sendo feito será inútil”.

b) A infraestrutura científicotecnológica da defesa: universidades, centros de pesquisa e empresas envolvidos na criação de conhecimentos científicos e tecnologias com aplicação em produtos de defesa.

Ela deve englobar todo o complexo nacional, através de ações cooperativas, organização de redes temáticas, utilização compartilhada de laboratórios e outros mecanismos de interação.

“A participação da indústria nesses arranjos deve ser mandatória, objetivando-se a aceleração do processo de inovação”, ressalta. Segundo Brick, este componente da BID ainda está muito incipiente, “pois pouco ou quase nada tem sido feito, sendo citáveis apenas os editais Prodefesa que têm procurado incentivar essa participação de instituições civis na solução de problemas de defesa”.

c) A infraestrutura de inteligência da defesa: instituições e pessoas envolvidas na coleta e análise de informações existentes no exterior sobre conhecimentos científicos e inovações tecnológicas com aplicação no desenvolvimento de produtos de defesa e em prospecção tecnológica com impacto em defesa.

“Sua existência se justifica pela dinâmica da evolução tecnológica, a qual torna imprescindível ser capaz de conhecer e/ou absorver a tecnologia atual para uso próprio, ou para criar contramedidas apropriadas”, analisa o engenheiro Eduardo Brick.

Adicionalmente, há que se ter capacidade de vislumbrar possíveis evoluções da tecnologia, através da aplicação de métodos de prospecção e avaliação tecnológica.

“É importante existir um sistema de inteligência tecnológica para prospectar as tendências de evolução tecnológica mais relevantes para a defesa, contornar o cerceamento tecnológico e proteger nossos ativos tecnológicos”.

d) a infraestrutura de financiamento da defesa: instituições e recursos financeiros dedicados ao financiamento de pesquisa científica e tecnológica e ao desenvolvimento de produtos com aplicação em defesa e ao financiamento de vendas externas de produtos de defesa, “uma função vital para a saúde de todo o sistema, que possui características tão específicas”.

Sem financiamento governamental, diz Eduardo Brick, não há P&D para sustentar a inovação de produtos de defesa.

Sem inovação, “o sistema de defesa, rapidamente, fica obsoleto e incapaz de enfrentar as novas ameaças que não cessam de evoluir”.

A realidade, porém, é que o Brasil dedica pouquíssimos recursos para pesquisa de interesse para defesa. Em 2006, o Brasil investiu apenas 0,6% dos recursos de pesquisa e desenvolvimento na área de defesa. Em 2003, ano em que o Brasil investiu apenas 1,2%, os EUA investiram 56%, a Espanha 24%, a França 23% e a Coreia 13%.

O pouco investimento que existiu resultou em significativos avanços para aplicações civis, lembra Eduardo Brick, que cita o exemplo da Embraer com o projeto do AMX, que permitiu o desenvolvimento dos jatos regionais EMB 135, 145 e 190 que hoje dominam grande parte do mercado internacional, gerando postos de trabalho de alta qualidade no Brasil e receitas de exportação.

Também o investimento da Marinha no ciclo de combustível nuclear garantiu o fornecimento desse combustível para nossas usinas nucleares. “Os benefícios, estratégicos, financeiros e sociais desses sucessos foram, sem sombra de dúvida, muitas ordens de grandeza superiores aos investimentos feitos”, comenta Brick.

e) o arcabouço regulatório da BID. Temas tais como regras para licitação, financiamento de P&D, financiamento de exportações, tratamento fiscal diferenciado, entre outros, devem ser objeto de documentos normativos específicos para a BID.

Alguns desses assuntos estão sendo objeto de propostas de legislação.